Lição de Scolari

Por dinheiro ninguém discute na seleção brasileira. Lição do técnico Luiz Felipe Scolari, já em Ulsan, na Coréia do Sul – outro lado do globo. Em fase de aquecimento para a estréia da seleção canarinho na Copa do Mundo, ele colocou o dedo na ferida e, bem a seu jeito, disse que se depender dele, dinheiro não vai ser problema para o Brasil conquistar o pentacampeonato. “Posso até abrir mão de minha parte para que eles – isto é, os jogadores – dividam”, assegurou o até aqui simpático Felipão.

Ele se referia aos cem mil dólares norte-americanos que a Confederação Brasileira de Futebol estipulou (dizem que foi de forma unilateral, sem consultar os interessados) para cada jogador e integrante da comissão técnica, no caso de sucesso de nossa esquadra nos gramados. Segundo consta, alguns atletas estariam planejando uma mobilização para obter reajuste do prêmio prometido na hipótese de a equipe ultrapassar a fase semifinal. “Por dinheiro não haverá discussão aqui. Deixo para lá cem, duzentos hoje e fecho um contrato de um milhão, dois milhões amanhã se formos campeões”, acrescentou Scolari, aduzindo que ele é gringo mas não é burro. Entretanto deixou claro que “o que importa nesse momento é a competição”.

Vira e mexe o tema do “bicho” acaba sendo a explicação para muito fracasso ou o incentivo para o almejado sucesso. Patriotismo ou amor à camisa parecem coisas do passado, mesmo num momento em que o mundo inteiro se deixa levar pelas razões do coração. É por isso que assume importância ainda maior o chega-prá-lá do técnico que, embora dizendo que os jogadores têm o direito de não aceitar o valor proposto, é hora de colocar acima do vil argento outros valores mais importantes. Ademais, “dentro da realidade brasileira, posso dizer que nossa premiação é muito boa” – ensinou.

Ora, nem precisava a garantia prévia da premiação. Ela deveria ser conseqüência de um resultado. A bem da verdade, o cumprimento do dever é obrigação de bons brasileiros. Mas está tudo dito: a premiação oferecida de cem mil dólares é boa. Representa cerca de 1.250 salários mínimos. Ou o equivalente a mais de 104 anos de trabalho de um assalariado à base do mínimo (coisa de milhões de brasileiros outros). Também é importante o recado para que os atletas deixem de lado o puro mercantilismo e pensem um pouco na defesa das cores da camisa que usam. São as cores brasileiras.

Digamo-nos tudo: com essa mentalidade, seria oportuno que, mutatis mutandis, o Scolari viesse a fazer um pequeno estágio em algumas áreas do poder, em Brasília. No Congresso Nacional, por exemplo. Ali, como é público e notório, existe um balcão de negócios onde nada se faz sem o toma-lá-dá-cá. Principalmente em períodos eleitorais, os que pensam no Brasil são cada vez mais raros. Fora desses períodos, também. Deputados e jogadores têm em comum esse senso de oportunismo que pretende tirar vantagem de situações em que o natural seria o trabalho pelo resultado, não o benefício negociado antes mesmo de entrar em campo.

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