INSS, o mito do déficit

As manchetes são alarmantes: “Previdência tem o pior resultado do ano”, “Déficit da Previdência sobe 57% no primeiro semestre”. No primeiro semestre de 2002, foram arrecadados R$ 31,6 bilhões e houve um desembolso com benefícios da ordem de R$ 38,4 bilhões, gerando, segundo o Ministério da Previdência e Assistência Social, um déficit de R$ 6,80 bilhões, 57,5% superior ao verificado no primeiro semestre de 2001. Estes são os números inequívocos do fluxo de caixa do Instituto Nacional do Seguro Social, cujas causas são atribuídas, principalmente, ao aumento do salário mínimo e ao represamento de benefícios decorrentes da greve dos servidores.

O outro lado da notícia, que é tangenciado pelas autoridades e pouco divulgado pela mídia, é o que representa e o que origina tal desequilíbrio financeiro. Primeiro deve ser mudado o enfoque das dificuldades de caixa do INSS. O governo paga um salário mínimo de aposentadoria e pensão a 14 milhões de pessoas, a maior parte delas oriunda do setor rural, e estes benefícios foram reajustados em 10,4 %, enquanto que as demais 6,5 milhões de aposentadorias e pensões receberam aumento de 9,2%.

Como a área rural gera uma arrecadação insignificante, na correlação com o dispêndio com benefícios, há uma clara e evidente redistribuição de renda dos contribuintes urbanos para o setor primário. Só no ano de 2001, foram pagos R$ 14,3 bilhões aos aposentados rurais, tendo entrado nos cofres do INSS, uma receita sobre produtos e empregos agropecuários de somente R$ 809 milhões. Só aí já justificaríamos a mudança do enfoque: “Não há um déficit, mas um investimento social deste governo na subsistência dos trabalhadores do campo”.

Se isto não bastasse, continuam os incentivos à simplificação do pagamento de tributos e contribuições, através do chamado Simples. Esta medida, de extrema valia para o empresariado de pequeno porte, ocasionará uma renúncia estimada de R$ 2,7 bilhões neste ano. Com as demais atividades empresariais beneficiadas por lei, chegamos a uma renúncia prevista na LDO de 2002 de R$ 9,2 bilhões. Isto que não mencionamos o passivo da União com a Previdência, que remonta à segunda metade do século passado, e já faz parte do folclore nacional: o governo retirou ou deixou de repassar aos órgãos previdenciários valores que podem variar entre R$ 50 a 400 bilhões, dependendo do instituto ou organismo que fizer esta contabilidade. É muito dinheiro retirado dos aposentados, quando havia superávit nas contas dos antigos IAPs, do INPS e depois do ex-Iapas.

Com o processo de redução de atividade econômica quase crônico, tende a minguar a fonte de financiamento oriunda da massa salarial. Com isto, o que se arrecada da folha de salários revela-se cada dia mais insuficiente para pagar os mais de 21 milhões de beneficiários do INSS. Mas, não podemos, como se verifica na análise, qualificar este desequilíbrio como uma mera conta de receita e despesa previdenciária e sim a um investimento social da maior monta, que privilegia – com recursos do Tesouro e dos contribuintes urbanos – primordialmente o setor rural, as entidades filantrópicas e as empresas de pequeno porte.

Portanto, não há que se falar em déficit da Previdência.

Vilson Antonio Romero

é jornalista, auditor fiscal do INSS, diretor da Associação Riograndense de Imprensa e da Associação Gaúcha dos Fiscais de Previdência (e-mail: romero@anfip.org.br).

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