Indulto (Decreto 4495, de 04.12.2002 [DO de 05.12.02]). Considerações. (1.ª parte).

Publicado o Decreto de Indulto relacionado ao ano próximo passado (2001), tecemos algumas sucintas considerações, parte das quais ora se transcreve, e que foram publicadas nesta mesma página. Objetiva-se, agora, analisar o Decreto recém-editado.

O Ministério Público do Estado do Paraná, quando da edição do Decreto 1.860/96, encaminhou valioso material aos Promotores de Justiça, orientando-os acerca das providências que deveriam ser tomadas, a fim de viabilizar fossem os réus condenados contemplados, conforme preconizado no Decreto em referência. Do referido material extraímos aspectos que interessam sobremaneira às considerações que tencionamos efetivar. Vejamos.

l. O que é indulto ?

O indulto é um ato de clemência do Poder Público, previsto no artigo 84, inciso XII, da Constituição Federal, tradicionalmente concedido quando da comemoração do Natal, que consiste em perdoar condenados, extinguindo as suas penas ou as diminuindo (comutação).

A justificativa dos decretos que o concedem tem sido a de “proporcionar novas oportunidades aos que se mostram recuperados para o convívio social, como estímulo ao esforço de proceder com dignidade e ser útil ao próximo”.

Por ocasião do Natal de 1995, foi editado o Decreto n.º l.645, de 26 de setembro de 1995, que beneficiou expressivo número de condenados. No Paraná o Conselho Penitenciário emitiu parecer em mais de mil pedidos de indulto e de comutação.

Convém mencionar que nos últimos anos (mais precisamente a partir de 1995), as concessões efetivadas não foram expressivas, o que poderá ser constatado pelas estatísticas junto aos Conselhos Penitenciários (Órgão da Execução Penal, cuja ouvida é obrigatória, sob pena de nulidade, conforme vem reconhecendo os Tribunais) e Juízos de Execução Penal. Houve, por assim dizer, severas restrições, ocasionando desesperança aos condenados recolhidos aos cárceres. A perspectiva, contudo, é alvissareira, através da confiança externada pelo Poder Executivo, ou mais precisamente: o Estado estende a mão em gesto de conciliação àqueles que estão segregados por terem infringido as normas de convivência social, e que, após análise de seu caso concreto, revelam não constituir perigo evidente à segurança pública…

Quanto ao recém-editado Decreto, a Exposição de Motivos apresentada pelo Exmo. Sr. Ministro da Justiça, destaca as modificações as quais foram acolhidas pelo Excelentíssimo Senhor Presidente da República, sendo de bom alvitre consignar:

Saliente-se que o indulto é modalidade de extinção da punibilidade, tendo origem no perdão concedido pelo soberano ao súdito condenado. No Brasil, é tradicional a concessão de indulto por ocasião dos festejos de Natal, o que se vem observando desde o Império. A proposta ora encaminhada a Vossa Excelência é fruto – conforme já se disse – de idéias apresentadas em Audiência Pública, representando a quase totalidade dos que ali se manifestaram. Ao contrário do que procuram sustentar alguns adeptos do discurso do terror, não tem a proposta de indulto o objetivo de esvaziar presídios, até mesmo porque os requisitos estabelecidos para a concessão do perdão hão de ser analisados em cada caso concreto pelo juiz, depois de ouvir o representante do Ministério Público e o Conselho Penitenciário.

A proposta que se encaminha a Vossa Excelência, portanto, seguindo a tradição, pretende compensar, com o indulto, aqueles que são submetidos aos evidentes excessos que caracterizam a execução penal no Brasil – a despeito de todos os esforços promovidos por Vossa Excelência para modificar esse triste quadro -, e que se mostram merecedores do perdão, por meio do qual o Estado estende a mão em gesto de conciliação àqueles que estão segregados por terem infringido as normas de convivência social, e que, após análise de seu caso concreto, revelam não constituir perigo evidente à segurança pública; impende acrescentar que o Decreto de Indulto não pode pretender prever todas as hipóteses concretas de concessão, e eventual deferimento que não se tenha mostrado adequado – por isso mesmo, tratando-se de caso isolado – não pode justificar maior severidade nos critérios definidores dos requisitos para o perdão. Além disso, não há a menor possibilidade de que sejam libertados presos de evidente periculosidade, porque a proposta ora encaminhada a Vossa Excelência observou também a necessidade de manter segregados aqueles que possam constituir perigo ao convívio social.

(Da Exposição de Motivos encaminhada pelo Excelentíssimo Senhor Ministro da Justiça, à Presidência da República).

2. A QUEM SE CONCEDE?

Adaptando-se a pergunta ao recém-editado Decreto, vejamos:

Concede indulto, comutação e dá outras providências.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe confere o art. 84, inciso XII, da Constituição, tendo em vista a manifestação do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, acolhida pelo Ministro de Estado da Justiça, e considerando a tradição de conceder, por ocasião das festividades comemorativas do Natal, perdão ao condenado em condições de merecê-lo, proporcionando-lhe a oportunidade de retorno útil ao convívio da sociedade, objetivo maior da sanção penal,

DECRETA:

Art. 1.º É concedido indulto ao:

I – condenado à pena privativa de liberdade não superior a seis anos que, até 25 de dezembro de 2002, tenha cumprido um terço da pena, se não reincidente, ou metade, se reincidente;

II – condenado à pena privativa de liberdade superior a seis anos que, até 25 de dezembro de 2002, tenha completado sessenta anos de idade e cumprido um terço da pena, se não reincidente, ou metade, se reincidente;

III – condenado à pena privativa de liberdade superior a seis anos que, ao tempo do crime, contava menos de vinte e um anos de idade e, até 25 de dezembro de 2002, tenha cumprido um terço da pena, se não reincidente, ou metade, se reincidente;

IV – condenado à pena privativa de liberdade que, até 25 de dezembro de 2002, tenha cumprido ininterruptamente quinze anos da pena, se não reincidente, ou vinte anos, se reincidente;

V – condenado à pena privativa de liberdade que seja:

a) cego, paraplégico ou tetraplégico, desde que tais condições hajam ocorrido supervenientemente à condenação; ou

b) acometido, cumulativamente, de doença grave, irreversível, em estado de incapacidade e que exija contínuos cuidados, comprovado por laudo médico oficial ou, na falta deste, de médico designado, nele devendo constar o histórico da doença, desde que não haja oposição do beneficiado, mantido o direito de assistência nos termos do art. 196 da Constituição;

VI – condenado beneficiado com suspensão condicional da execução da pena até 31 de dezembro de 2001, ou que teve a pena privativa de liberdade substituída por pena restritiva de direitos, desde que tenha cumprido metade do período de prova ou da pena;

VII – condenado à pena privativa de liberdade não superior a oito anos, beneficiado com livramento condicional até 31 de dezembro de 2001, desde que tenha cumprido metade do período de prova e que não tenha ocorrido sua revogação;

VIII – condenado que tenha obtido progressão a regime aberto até 31 de dezembro de 2001, sem que tenha havido posterior regressão;

IX – condenado à pena privativa de liberdade a ser cumprida inicialmente em regime aberto, desde que, em 31 de dezembro de 2001, já tenha cumprido metade da pena e não tenha havido posterior regressão; e

X – condenado que se encontre cumprindo pena no regime semi-aberto e já tenha usufruído, no mínimo, de cinco saídas temporárias previstas no art. 122, incisos I e III, combinado com o art. 124, caput, da Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984.

§ 1.º Para o condenado por crime doloso, cometido com violência ou grave ameaça à pessoa, a concessão do indulto ficará subordinada:

I – à constatação de inexistência da prática de falta grave nos últimos dois anos, contados retroativamente da publicação deste Decreto; e

II – à avaliação pelo Juiz, por decisão motivada, de condições pessoais que façam presumir que não voltará a delinqüir.

§ 2.º O indulto de que cuida este Decreto não se estende às penas acessórias previstas no Código Penal Militar e aos efeitos da condenação.

Nota: Na seqüência serão analisados os aspectos mais importantes relacionados ao Decreto, contudo, desde já, colocamo-nos à disposição para dirimir eventuais dúvidas, o que poderá ser feito pelo e-mail: luciano.kuehne@mais.sul.com.br

Maurício Kuehne

é membro dos Conselhos: Penitenciário do Estado do Paraná e Nacional de Política Criminal e Penitenciária (sendo 2º Vice-Presidente deste último Órgão). Professor Titular de Direito penal da Faculdade de Direito de Curitiba.

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