Ibsen e o inimigo não aparente

Há um axioma em Cientologia que afirma que quando duas pessoas ou entidades estão em conflito – beligerância – há sempre uma terceira, não aparente, que é o mentor do desentendimento. Sempre é assim, cientificamente se pode demonstrar que é assim que sucede e sempre – invariavelmente – é a mais insuspeita das pessoas que, deliberadamente, mas de forma absolutamente dissimulada, provoca o desentendimento para dar vazão a um seu sentimento menor.

O axioma funciona, em vinte anos estudando os textos de L. Ron Hubbard e aplicando tais reflexões, a constatação é inexorável do acerto da proposição. De fato, até no seio familiar, por vezes, aquela pessoa que parece tão bondosa, tão interessada nos problemas que afligem um contenda qualquer, é ela, ela mesma, que está de forma velada alimentando o dissenso para ter controle a respeito das emoções ou do infortúnio do seu familiar.

A derrocada política do deputado federal Ibsen Pinheiro, cujo nome chegou a ser cogitado para a corrida presidencial de 1994, pelo PMDB, pode ser debitada em parte a um erro jornalístico, conforme asseveram os veículos de imprensa. Entretanto, trata-se de um sofisma, pois, na verdade, a nosso ver, foi, isto sim, utilizado o momento político singular e o caráter daqueles que militam na imprensa para induzir em erro – deliberadamente – toda a nação. Queriam, isto sim, é retirá-lo do processo eleitoral presidencial, como líder natural, pela sua atuação no processo de Fernando Collor.

O tema da reportagem de capa da revista IstoÉ que começou a circular na sexta-feira (13), a matéria afirma que a revista Veja, ao publicar uma informação errônea sobre a movimentação de dinheiro na conta bancária do deputado, em 1993, deu munição para seus inimigos políticos e desembocou na cassação de seu mandato. O mais grave, segundo a IstoÉ, é que os editores souberam do erro antes do final da impressão da revista e o mantiveram.

O texto tem como fundamento uma carta que o autor da reportagem, jornalista Luís Costa Pinto, enviou a Ibsen há três meses, na qual confessa o erro, numa tentativa de “reparar as injustiças que ajudei a perpetrar”. Posteriormente, Costa Pinto, que trabalha como consultor e presta serviços ao presidente da Câmara, João Paulo Cunha (PT), contou que a Veja soube ainda na madrugada que a denúncia da movimentação de US$ 1 milhão de dólares na conta do deputado, beneficiado por um esquema de corrupção, não tinha pé na realidade, confirmou em viva voz, em programa de televisão, toda a versão anteriormente sustentada. Um checador da própria Veja refizera as contas, verificando que o movimento era de US$ 1 mil. Na ocasião, porém, com 1 milhão e 200 mil exemplares rodados, segundo Costa Pinto, os editores não quiseram voltar atrás. Pediram que buscasse a declaração de alguém da CPI do Orçamento para calçar a informação. O próprio presidente da comissão, o então deputado pefelista Benito Gama, inimigo político de Ibsen, aceitou o papel e garantiu, por telefone: “É US$ 1 milhão e Ibsen terá de responder por isso”.

Cinge-se a discussão a um dos detalhes mais curiosos da polêmica, que ocorre em meio a um debate mais amplo sobre a necessidade de fiscalização da imprensa: a principal fonte de Costa Pinto foi um personagem conhecido do PT – o assessor parlamentar Waldomiro Diniz. Na CPI do Orçamento ele era o braço-direito dos deputados José Dirceu, hoje ministro-chefe da Casa Civil, e Aloizio Mercadante, atualmente no Senado. Foi Waldomiro quem ligou para Costa Pinto na noite do fechamento da revista, dizendo que tinha as provas que faltavam para incriminar Ibsen: sete boletos de depósitos bancários.

A quem interessava retirar Ibsen Pinheiro do processo eleitoral, quais eram os grupos políticos dos candidatos concorrentes e que tinham interesse em destruir o seu principal oponente são perguntas deixadas a margem.

Na sexta-feira (13), Benito Gama, que concorre à Prefeitura de Salvador pelo PTB, negou a conversa com o repórter da Veja. “Isso é uma mentira, um delírio, um sonho. Nunca tratei de valores. Esse sujeito é irresponsável. Vou processá-lo.” Se verdadeira a afirmativa, apenas em reflexão, resta um único grupo interessado na destruição da imagem de Ibsen Pinheiro.

O então editor-executivo da revista, Paulo Moreira Leite, a quem Costa Pinto se reportava, chamou de fantasiosa a versão de seu subordinado. “Lula Costa Pinto fala de um crime sem cadáver”, disse ao Grupo Estado. “Diz que tentei pressioná-lo a publicar uma notícia falsa porque a capa da revista não poderia ser mudada naquele momento por motivos econômicos. Só que a capa foi mudada. Não só a capa, mas o texto interno, as ilustrações e os quadros explicativos. “Se tivesse se dado ao menos ao trabalho de conferir a capa da Veja daquela semana, Lula Costa Pinto veria que sua tese é puro jornalismo do absurdo”. Moreira Leite, hoje diretor de redação do Diário de S. Paulo, qualificou de mentirosa a declaração de que teria insistido para o repórter calçar a matéria: “Graças a nossos checadores, corrigimos o que havia de errado na reportagem enviada de Brasília. Infelizmente dessa vez ele não contou com auxílio de checadores antes de publicar essa nova versão dos fatos.”

O ex-presidente da Câmara, Ibsen Pinheiro, candidato a vereador pelo PMDB nas próximas eleições, em Porto Alegre, disse que a denúncia nos meios de comunicação foi decisiva para a sua cassação, em 1993. “Nenhuma acusação formal me foi feita. Me atribuíram uma movimentação bancária superior às minhas posses. Passados dez anos, lanço um olhar que não disfarça a amargura que senti, mas um olhar que também soube vencer aquele quadro e atravessá-lo sem ódio”, disse para uma revista do centro do País.

Ibsen Pinheiro declarou que teria havido uma “manipulação da verdade” por parte da revista Veja no episódio que resultou na cassação de seu mandato na Câmara Federal. O ex-parlamentar descreve que a matéria conta que ele teria movimentado US$ 1 milhão na sua conta corrente, “quando na verdade era preciso suprimir três zeros”, frisou.

Ibsen também defendeu uma revisão no processo de investigação parlamentar. Ele contou que saiu do episódio “muito mais militante da liberdade de imprensa”. “Onde não há liberdade de imprensa, o erro é eterno e imutável. No regime de liberdade, a verdade sempre pode ser reposta”, declarou. Ibsen não pensa em pedido de reparação. Disse que sua imagem ficou abalada nesse episódio, acrescentando tratar-se de uma questão emocional e não financeira.

Um erro jornalístico teria motivado a cassação do deputado federal e então presidente da Câmara. A falsa denúncia havia sido repassada por Waldomiro Diniz, na época assessor do deputado José Dirceu. Em 1993, a revista Veja publicou reportagem, onde revela a descoberta de uma movimentação de US$ 1 milhão na conta do parlamentar gaúcho. O valor estava errado. Uma revisão nos cálculos mostra que se tratava apenas de US$ 1 mil.

Na época, Diniz trabalhava nos bastidores da CPI do Orçamento. Acusações contra adversários políticos do PT foram o estopim que resultou na saída do ex-presidente da Câmara, que comandou o impeachment de Collor, o que mais será que pode existir a ser apurado é um indagação que devemos estabelecer.

O que ocorreu com Ibsen Pinheiro é do quotidiano de nossas vidas, não poucos são aqueles que detratam os que conseguem emergir da média, da mediocridade e aqueles que não conseguem alcançá-lo utilizam de semelhantes expediente para tentar, e por vezes conseguir.

Paulo Francis sempre citava que no Brasil aquele que está acima da média é logo tachado de ladrão ou corrupto, e o disse reiteradas vezes, inclusive em seus livros.

Feliz, ainda, Ibsen que pode em vida trazer a lume a verdade, pobres daqueles que passam suas vidas sem poder demonstrar a verdade, pois a força e a pouca ética de seus detratores impede que se possa, sequer, erguer a voz para enfrentá-los.

J. S. Fagundes Cunha é juiz de Direito, professor universitário e doutor em Direito pela UFPR.

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