O assunto também está em voga nas conversas de corredor e de salão. É atual e de vanguarda aderir à guarda compartilhada, vista, agora e num primeiro exame, como solução de lei para resolver com os intermináveis e dolorosos conflitos dos pais com relação à guarda e educação dos filhos.
Nessa linha de pensamento, muitos pais estão pleiteando a guarda compartilhada como alternativa para o impasse de não conseguirem chegar a um consenso com relação a quem vai ficar com a guarda do filho e dirigir-lhe a pessoa. O raciocínio é mais ou menos esse: como não chegamos a um acordo a respeito de quem ficará com os filhos; como nós dois queremos ficar com os filhos (ou, no fundo, um de nós não quer dar o braço a torcer e admitir que eles ficarão melhor com o outro); como não acho ?justo? que os filhos fiquem com ela (ou com ele) e eu somente possa vê-los em dias e horários pré-determinados; como os princípios e valores de cada um de nós a respeito da criação e educação dos filhos são diferentes (quando não incompatíveis) – vamos optar pela guarda compartilhada. Pronto. Problema resolvido. Descoberto o ovo de Colombo.
Ocorre que a guarda compartilhada não é solução para os casos de incompatibilidade e dissenso intransponível entre os pais. Ela pressupõe, necessariamente, como condição de viabilidade, a existência de pais que preservem algum nível de relacionamento e de entendimento, mesmo não vivendo sob o mesmo teto. Os pais devem, de alguma maneira, comungar valores e princípios e conseguir, independentemente da falência da relação pessoal, administrar juntos, com amor, responsabilidade e inteligência, a tarefa de criar e educar os filhos comuns. São aqueles pais que guardam confiança mútua no que tange aos respectivos papéis de pai e de mãe, que sabem tanto admirar as virtudes do outro como administrar os defeitos e fraquezas, também prezar e valorizar a convivência do filho com ele (outro). Somente assim poderão compartilhar, efetivamente, os deveres e responsabilidades com relação à criação e educação do filho (funções precípuas da guarda).
Não há como conceber a guarda compartilhada em ambiente de hostilidade e de intolerância, como sói acontecer nos casos de dissenso intransponível entre os pais no que tange às questões afetas ao filho. Mesmo porque, neste caso, a guarda compartilhada não seria solução fundada no melhor e superior interesse do filho, senão que seria determinada no melhor interesse e conveniência dos próprios pais. Proposta egoísta, sem a menor consideração às necessidades e bem-estar do filho. Verdadeira solução salomônica: dividir o filho entre si, um pouco para cada um, para que ninguém perca, ninguém ganhe.
O vocábulo compartilhar, é certo, dá a idéia de dividir, partilhar, tomar parte, mas não deve ser compreendido como divisão em partes estanques e isoladas. Mesmo porque, o todo a ser partilhado é uma pessoa humana, que não é suscetível de tal cisão. Na implementação da guarda compartilhada, é de rigor que os pais mantenham a unidade, a visão do todo, num ambiente de efetiva comunhão de esforços e interesses, também de compreensão e amor (pelo filho). Permite-se, é certo, a participação diferenciada de cada um dos pais, mas sem perder de vista que tudo deve convergir para o melhor interesse do filho, como pessoa humana que é, única e singular, objetivando, em primeiro e último plano, assegurar sua devida proteção e bem estar. Não sendo assim, não se vê como possam os pais partilhar de algo tão caro e delicado como a tarefa de educar e criar filhos, preparando-os para a vida e a cidadania.
Denise Damo Comel é doutora em Direito, juíza de Direito da 1.ª Vara da Família e Anexos da Comarca de Ponta Grossa, professora na Escola da Magistratura do Paraná – Núcleo de Ponta Grossa.