Fundo preventivo

Recomendação ao Fundo Monetário Internacional – FMI, outrora símbolo do bem e do mal: não é mais necessário ficar exigindo que os países façam ajuste fiscal. É hora de exigir que os países assumam o compromisso da retomada do crescimento e do desenvolvimento econômico. Até porque a tese do ajuste fiscal fracassou na maioria dos países. Assim dito e repetido, abra-se o caminho para o primeiro acordo do governo do presidente Lula com o Fundo, o bicho-papão de todas as campanhas eleitorais e plebiscitos informais. Mas diga-se, apenas para não ser igual, que este é um acordo preventivo.

Isso mesmo. Não precisamos de acordo. Aliás, não precisamos de dinheiro emprestado, muito menos do FMI, e somos capazes já de caminhar com as próprias pernas. “Todos os indicadores apontam para uma retomada do crescimento da economia brasileira” – o espetáculo do crescimento prometido pelo presidente e desejado por todos, subservientes ou não. Só não gritaremos “Fora FMI” porque do dogmatismo passamos ao pragmatismo. E também porque o próprio Fundo mudou. Mas, se houver acordo (e como pode haver acordo agora se o presidente está fora, na África?), isso será só em dezembro. Repetindo. O Brasil não precisa do FMI, vai estudar primeiro e, se concluir pelo acordo, esse será um problema nosso. E ponto final.

Foi mais uma trapalhada. O ministro da Fazenda, Antônio Palocci, dizendo uma coisa; Lula, na África, afirmando outra. Bombeiros de plantão, como o ex-ministro Maílson da Nóbrega, hoje um próspero consultor de mercados, correram para apagar o fogo, prenúncio de grandes incêndios numa área sensível demais: não há contradição no que dizem o ministro e o presidente. Precisa saber ler o que dizem. E sabendo ler, descobre-se que falam a mesma coisa. Isto é, quando Palocci fala em novembro, é porque este mês será consumido na análise e formatação do acordo que, de qualquer forma, será assinado somente em dezembro, a data referida por Lula. Então, quando Lula bate na mesa e diz que “acordo só em dezembro”, não são, como parecem, bravatas. Ele está falando a verdade, a mesma de Palocci. Como assim, não deu para entender?

Ora, se não deu para entender, tente imaginar que isso tudo pode, também, fazer parte do jogo da negociação. Um morde, outro assopra. Mas acima de tudo fique sabendo que o presidente Lula nada gostou da falha no anúncio sobre o novo acordo. Faltou dizer o principal: que o Brasil já pode caminhar com as próprias pernas, sem novo acerto com o FMI. O País sequer precisa do dinheiro referente à última parcela do atual acordo. E que qualquer novo acerto será apenas preventivo. “Pre-ven-ti-vo”, entendeu? Só usaremos essa nova montanha de dinheiro – 14 bilhões de dólares – se for necessário. Nesse negócio da China (qual seria o juro, mesmo?), além de um certo reescalonamento nos pagamentos, haveremos de incluir alguns parâmetros sociais. Essas são nossas condições. Não é de grana que precisamos, mas de “um colchão de liquidez”…

O último acordo com o FMI foi celebrado em agosto do ano passado. Trouxe-nos 30 bilhões de dólares que serviram para acalmar o pânico dos mercados ante as incertezas do novo governo e da recessão econômica. Foi, portanto, um acordo também preventivo, parcialmente acompanhado pela equipe de Lula, já próximo da vitória da esperança sobre o medo. De prevenção em prevenção, aumentamos nossa dívida, conseqüentemente aumentamos os juros a pagar e tudo o mais. Uma sangria que não tem fim, causa importante de nossas mazelas e estagnação econômica, em cujo socorro é tomado o dinheiro emprestado. Sempre foi assim.

Dizer que agora o tomamos sob a condição do estímulo ao crescimento é, portanto, chover no molhado. Mas o argumento parece novo e bom. E pode servir para justificar a mudança no discurso. O PT do B já inventou o FMI do B, segundo se diz por aí. Pena que dívidas são pagas sempre do mesmo jeito…

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