Fome zero à esquerda

O ministro José Graziano, com suas feições clericais, à primeira vista parecia o funcionário apropriado para tocar o ambicioso programa Fome Zero. Para que o fizesse, até inventou-se um ministério no governo Lula: o da Segurança Alimentar. Nas prioridades do novo governo, o programa Fome Zero antecede até as reformas da Previdência e tributária. Era um sonho do presidente nordestino, oriundo das camadas mais pobres da população, que testemunhara e até sofrera o terrível flagelo da fome que atinge milhões de brasileiros. Isto justifica o interesse prioritário do governo, mas não dispensa um comando estrategicamente bem montado, capaz de fazer com que o projeto se estruture e se desenvolva com a eficiência e rapidez que o problema da fome exige.

Aí o erro. José Graziano mostrou-se apenas um homem de sensibilidade, boa vontade, porém faltaram-lhe elementos para organizar tão gigantesca tarefa. E o governo Lula não colocou à sua disposição, desde o início, um projeto bem montado, capaz de deslanchar desde os primeiros dias de governo.

Por isto, o Fome Zero conseguiu, até agora, praticamente zero. Nada que signifique um número expressivo, capaz de demonstrar que a administração Lula, com o nunca negado apoio da sociedade, está efetivamente cumprindo sua promessa primeira. A de extirpar a fome de milhões de brasileiros.

Extemporaneamente, algumas providências estão sendo tomadas, uma delas tão simples que sua não implantação só agora, até ridiculariza o programa. Referimo-nos a um telefone 0800 de informações e algumas contas bancárias e indicações de locais para doações em dinheiro ou em espécie. Rezemos para que o programa recupere o tempo perdido, já que não recuperará a fome sofrida nestes dois primeiros meses de governo.

Mas o mais importante, entretanto, é a discussão do programa Fome Zero como instrumento de justiça ou de socorro social. O líder sindical de esquerda Jair Menegheli, que já presidiu a CUT, braço sindical do PT, criticou severamente o Fome Zero dizendo que o programa não passa de um projeto paliativo, um remendo, pois fome se combate com desenvolvimento econômico, com criação de riquezas, de empregos. Assistencialismo nada resolve. Tem razão Menegheli, como a têm outros críticos do programa do governo Lula, postados mais à direita, pois sempre se soube que não é dando peixes que se mata a fome do povo e sim, ensinando a pescar.

Recente pesquisa revelou que a maioria dos brasileiros consultados não colocavam, como prioridade, nem o Fome Zero, nem a reforma da Previdência, a tributária ou a política. Queriam, antes de mais nada, uma reforma trabalhista, significando com isto o cumprimento da promessa de geração de empregos. Não se referiam à reforma da legislação trabalhista, mas da estrutura produtiva do país, para que gere fontes de trabalho. Que cada cidadão trabalhe, produza, receba o seu salário e zere a fome em sua família com o fruto de seu próprio labor, ou, para repetir surrada frase, com o suor do próprio rosto. A fome de milhões de brasileiros envergonha a nação. Mas também a envergonhará um programa assistencialista que se eternize, uma esmola oficial que não passa de um oneroso paliativo.

O Fome Zero também perdeu a oportunidade de sacudir o orgulho nacional, fazendo com que cada brasileiro se indigne com a fome de seus concidadãos. O café da manhã, o almoço e o jantar dos pobres está chegando requentado.

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