FHC perante a História (1)

Considerando o enorme aumento da dívida pública do Brasil, o presidente Fernando Henrique Cardoso realizou o pior governo de nossa história republicana. Assumiu o poder com o Tesouro Nacional onerado em R$ 64 bilhões e oito anos depois devia cerca de R$ 870 bilhões. Comparativamente ao Produto Interno Bruto (PIB), segundo dados oficiais, o comprometimento simplesmente dobrou: em janeiro/1995, o débito líquido do setor público federal correspondia a 30,4% do PIB e em setembro/2002 passou a 63,9% do Produto Interno Bruto.

De janeiro a novembro/2002, o erário arrecadou R$ 57 bilhões, representando superávit primário de 4,82% do PIB, todavia insuficiente porque o desembolso de juros alcançou R$ 96,9 bilhões, ou seja, o valor de parte dos juros incorporou-se ao principal. Digno de menção que para chegar a esse ainda não bastante superávit nas rubricas do Tesouro nunca se pagou tanto imposto, pois a carga tributária nesses dois quatriênios de FHC subiu de 28% para 34% do PIB.

Espanto e perplexidade ao lembrar que, a União embolsou com as privatizações, de 1995 a 2002, US$ 93,4 bilhões, acrescido de em torno de US$ 2 bilhões com a venda de ações da “Vale” e da Petrobras, na Bolsa de Valores de Nova Iorque.

Poder-se-ia argumentar que FHC elevou impostos, amealhou próximo a US$ 100 bilhões com a venda das estatais, duplicou responsabilidades em relação ao PIB, porém executou projetos monumentais de caráter economicamente reprodutivo e transformou nosso território em um canteiro de obras.

Infelizmente não se deu assim. Ele não levantou uma só usina hidrelétrica do porte de Itaipu e por falta absoluta de planejamento o povo amargou o “apagão”, que lhe trouxe sérios transtornos e reduziu a atividade industrial com a privação de energia. Nada perderam a Light e outras distribuidoras que, alegando prejuízo pela impossibilidade de venderem seu produto devido ao racionamento, receberam mais de RS$ 5 bilhões do BNDES como adiantamento e serão integralmente ressarcidas financeiramente pela União, com os consumidores pagando durante 7 anos parcela adicional por força de Lei proposta pelo Executivo. Ressalte-se os vultosos empréstimos do BNDES às multinacionais que participaram dos leilões de privatização.

Tampouco o governo FHC construiu ferrovia alguma e não deixou sua marca em uma rodovia de vulto sequer. Refinaria de petróleo também não fez e nos transformamos em importadores de derivados, com dispêndio previsto de US$ 5 bilhões em 2005.

Em 2002, a inflação subiu para perto de dois dígitos e o IGP-M chegou a 25,31% (contra 10,38% em 2001), o maior desde a implantação do Plano Real. O que pesou fortemente nos índices de inflação, além dos efeitos da valorização do dólar, foram as tarifas administradas pelo governo, que se comprometeu com as telefônicas e energéticas a corrigir as tarifas de acordo com a variação do IGP-M e do dólar, resultando em índices muito superiores à inflação: 509% na telefonia fixa e 254% na conta de luz nos dois fatídicos exercícios de FHC.

O reajuste da gasolina de 1995 a 2002 foi de 225% e do gás de fogão ganhou medalha de prata no campeonato somando 452%, isso porque o presidente determinou que os preços dos derivados de petróleo acompanhassem as cotações internacionais, a fim de viabilizar as importações por ele liberadas.

Houve destaque negativo de FHC no acréscimo do endividamento externo e nos sucessivos déficits na balança comercial desde 1995, por consequência do populismo da moeda sobrevalorizada e da redução de tarifas incidentes sobre produtos importados, ocasionando a falência de muitas fábricas nacionais dos ramos têxteis, de calçados, brinquedos, bijuterias e outros.

Não se contesta que ocorreu expressivo ingresso de capitais estrangeiros no Brasil, entretanto direcionados em grande parte ao atendimento do mercado interno, exemplo das telefônicas adquiridas nos leilões de privatização, que abocanharam escassos recursos locais, realçando-se o fato de que de 1995 a abril/2002, o BNDES emprestou R$ 17,224 bilhões (13,49% do total) à companhias alienígenas.

Nossa política em relação ao capital estrangeiro seguiu rota completamente oposta à adotada pela China, primeiro lugar na atração de empresas de fora, submetidas lá a controle e disciplina, que seleciona e incentiva cometimentos voltados à exportação. Da receita cambial de US$ 272 bilhões obtida pela China em 2002, as firmas estrangeiras contribuíram com quase a metade (48%) do valor exportado. (continua)

Léo de Almeida Neves

é ex-diretor da CREAI do Banco do Brasil, ex-deputado federal e autor de Vivência de Fatos Históricos (Ed. Paz e Terra, SP, 2002, 534 páginas).

Voltar ao topo