No programa Roda Viva da TV Cultura, o candidato oposicionista à Presidência da República, Geraldo Alckmin, disse que ?o governo não deve ter 100% de ações das estatais?. O tema é interessante e deve ser discutido. Mesmo porque as privatizações foram um dos principais assuntos desta campanha e Lula as condenou com veemência, embora alguns governadores petistas tenham privatizado em seus governos, e Alckmin, por motivos eleitorais mais do que por convicção, tenha se postado contra a entrega de estatais à iniciativa privada. Defendia-se das insinuações eleitoreiras de que iria privatizar o Banco do Brasil, a Caixa Econômica e a Petrobras, o que no subconsciente do eleitorado, mais do que em suas convicções, seria um crime de lesa-pátria.
A grande maioria das empresas brasileiras ditas estatais, e que foram privatizadas durante o governo Fernando Henrique Cardoso, eram empresas de capital misto. Seus donos eram o governo e particulares, pessoas físicas e jurídicas, porque empresas de capital aberto, com ações cotadas em bolsa. É o caso de duas das três referidas como em risco em caso de vitória da oposição, do Banco do Brasil e da Petrobras. Tanto o chamado banco oficial como a empresa que detém, ou melhor, detinha o monopólio do petróleo, são mistas, de propriedade do governo e de particulares, aqueles que adquiriram lotes de suas ações no mercado primário ou no secundário, o bursátil.
Tal fato não é irrelevante, porque obriga tais empresas a não poder agir como públicas, para as quais as benefícios sociais seriam prioridade e o lucro algo abominável.
Quem compra ações do Banco do Brasil ou da Petrobras quer que tais empresas dêem lucro. Enquanto isso, os governantes reclamam que elas ajam como repartições, não raro exigindo atos de benemerência, como aplicações a fundo perdido ou subsidiadas. Isso agrada aos que se posicionam em favor de estatais 100% e, obviamente, desagrada os acionistas minoritários, que compraram ações para ganhar dinheiro. O médico e o monstro. Uma empresa com capital misto e duplas e opostas finalidades e formas de atuação são, no campo dos negócios, uns monstrengos que precisam passar por profundas reformas. Ou serão estatais ou serão empresas mistas. E, melhor ainda, que sejam abertas.
Por empresa aberta, devemos entender aquelas cotadas na Bolsa de Valores. A Petrobras e o Banco do Brasil são empresas abertas, mas o governo mantém a maioria das ações. Qualquer do povo e qualquer empresa pode ser sócia de uma ou de outra. Ou das duas. E, muito embora não se tenha conhecimento de reação desta natureza, bem pode o acionista de uma empresa aberta, embora de capital misto e apelidada de estatal, ir à Justiça reclamar seus direitos sempre que realizasse um negócio abrindo mão de lucros, receitas, ganhos. Isso, mesmo se em razão de políticas públicas de inegável necessidade. Mas aí, que as pratique o governo, como proprietário 100% do capital, como é o caso da Caixa Econômica Federal. Ou pratique tais atos através da administração direta.
O caminho ideal é a estatal como propriedade 100% do governo, o que Alckmin condena. E empresas de capital aberto, capital democratizado, sem a manutenção da maioria das ações em poder do governo, o que hoje acontece com a Petrobras e o BB, e atuando no mercado competitivamente. Aí, melhor que o governo ser acionista majoritário é a diluição das ações entre milhares, milhões de acionistas. Seria a democratização das empresas que se protegem sob o apelido de estatais. Esta última fórmula é a praticada em praticamente todos os países desenvolvidos do mundo.


