Essa classe de gente emergente

Fome Zero? Que nada. Andar pelos shoppings (seja de Curitiba, seja de qualquer cidade) é um exercício de fuga da realidade ideal para os consumistas e perdulários de plantão. Quem pode, acaba comprando coisas tão inúteis quanto um sofá para cachorros, por exemplo. Quem não pode, apenas observa, e se espanta.

O mais interessante é descobrir que os produtos chamados “supérfluos”, ou seja, os que não têm necessidades prementes para suprir, são os que mais são vendidos. São os que mais lucram, porque têm público de renda altíssima, aquele que não se preocupa com o preço, e sim com a marca. Marca não, que é coisa de “pobre”: há que se falar “griffe”, ao melhor estilo emergente.

Estes, por sinal, são os donos dos shoppings. Podem perceber: os casais com roupas caras de etiquetas (ou logomarcas) enormes; as jovens que andam com bolsas imensas; os rapazes que cortam seus cabelos milimetricamente desajustados. E, claro, os cachorros, todos emplumados, com correntes de ouro, usando perfume francês e dormindo em camas aquecidas.

Pensa que é mentira? Então faça uma “incerta” em um desses “pet-shops” dedicadas às classes mais altas. Lá você encontra todas as coisas citadas acima, privilégios que muitos de nós jamais teve, e jamais terá. As jóias são caras, são cheias de detalhes, e servem também como identificador (apesar de alguns lugares já estarem fazendo carteira de identidade para os bichanos).

O cúmulo é o tal perfume. Com propaganda e tudo, um cachorro e uma linda mulher em um daqueles ambientes anódinos, o tal tem na sua embalagem a inscrição “Paris”, fundamental para qualquer perfume de qualidade, mesmo que ele tenha sido feito em Ciudad del Este. Segundo as informações que se obtém, custa o mesmo que um de qualidade para gente (como eu, como você): mais de cem reais.

Claro que há coisas boas em shoppings. É lá que se pode comprar a biografia do Chet Baker, o ótimo CD de Norah Jones (que ganhou o Grammy). Pena que eles fiquem longe das vitrines, onde estão os grandes trunfos culturais do momento: o indefectível MC Serginho, seu (sua?) escudeiro Lacraia e a gloriosa Égüinha Pocotó.

A vida é assim. E para quem compra um perfume para cachorros por cem reais, não há Fome Zero. Não há Guaribas (no distante Piauí), sequer há Vila das Torres, que para eles é apenas um borrão na paisagem a caminho do aeroporto. Por sinal, para eles, a melhor saída para o Brasil é justamente o aeroporto. Para muitos, infelizmente, a saída é apenas uma fraca luz no fim do túnel.

Cristian Toledo

(esportes1@parana-online.com.br) é repórter de Esportes em O Estado.

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