Ao estudar as diversas teorias do Direito sejam as relacionadas ao direito penal, ao direito civil ou a qualquer outro ramo do saber jurídico não são raras as ocasiões em que o estudante se indaga: para que estudar tantas teorias? De que me serve a análise de tantos institutos e postulados? E a verdade é que, em uma primeira e fria análise, de nada servem se elas não forem aplicáveis na prática. Afinal de contas, se nem mesmo o Direito pode ser considerado um fim em si mesmo – como algo que existe per si -, quanto mais seria o estudo e o ensino deste ramo do saber humano.

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Por tal razão, se faz necessário propiciar uma aplicabilidade prática aos conhecimentos oriundos dos mais diversos segmentos do saber jurídico; e mais, deve-se demonstrar ao estudante de Direito onde e como empregar aquele saber. E é exatamente nesta perspectiva que se estrutura o relevante e indispensável papel das diversas cadeiras de prática jurídica nas faculdades de Direito.

Relevante, exatamente por propiciar ao aluno um determinado norte, no sentido de como deve se servir e direcionar aquele conhecimento alcançado através dos livros e das aulas dogmático-expositivas. Indispensável, porque é nas matérias de prática forense que o acadêmico poderá se aproximar da realidade com a qual ele certamente se deparará ao abandonar os bancos da faculdade e ingressar no competitivo mercado de trabalho.

Ou seja, muito mais do que simplesmente preparar o acadêmico para os concursos públicos e exames de ordem, as cadeiras de prática devem servir ao propósito de capacitar o futuro profissional do direito para trabalhar com as mais inusitadas situações que possa enfrentar em sua vida profissional. O que, frise-se, é extremamente importante hodiernamente, em que a triste realidade nos demonstra o vexatório despreparo dos aplicadores do direito – o que espantosamente ocorre, data máxima vênia, nas mais diversas profissões jurídicas.

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Não só isso, muito mais do que simplesmente ensinar como fazer petições, contestações e recursos, as matérias de prática jurídica devem despertar e propugnar pela construção do raciocínio jurídico nos estudantes, sempre lhes cobrando soluções efetivas para os problemas expostos em sala de aula; problemas estes que, repita-se, serão sempre espelhados no dia a dia forense.

E tudo isso deve ser abordado pelo professor de prática através da análise e resolução de situações reais ou mesmo fictícias expostas aos alunos. E é exatamente o fato de não se abster ao simples analisar propugnado sempre pelo resolver as situações-problema, é que o estudo das diversas cadeiras de prática forense se torna especial, diferenciando-as não apenas das tradicionais disciplinas da dogmática jurídica (direito civil, direito trabalhista, direito penal, etc…), como também das modernas cadeiras de estudos de caso; pois muito mais do que vislumbrar apenas uma solução para o âmbito material da questão exposta; muito mais do que simplesmente delinear o mérito de uma determinada causa, as disciplinas de prática exigem dos alunos uma demonstração de um saber processual, de técnica jurídica a ser empregada para tornar efetivo, concreto, aquele suposto direito alegado.

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Não por outra razão tais disciplinas devem ser engajadas na grade curricular dos últimos semestres no curso de direito, pois pressupõem uma certa bagagem de direito e processo civil, de direito e processo penal, de direito e processo do trabalho; e assim por diante.

Neste diapasão, a missão dos alunos ao trabalhar com um problema prático envolverá, necessariamente, uma ampla gama de conhecimentos jurídicos – o que, por certo, será igualmente exigido dele enquanto profissional do direito. Assim é que o seu sucesso na resolução do problema dependerá da leitura atenta do tema exposto, especialmente no que diz respeito aos prazos e datas assinaladas. Igualmente, a seleção das informações deve ser bem pontuada pelo acadêmico, devendo sempre julgar aquelas que são efetivamente pertinentes ao caso, separando-as das inúteis e supérfluas que eventualmente estarão engajadas no problema. Ademais, o estudante deverá qualificar juridicamente as informações tidas como essenciais, sem promover a simples reprodução dos dados; por exemplo, ao analisar uma denúncia criminal, muito mais que simplesmente elaborar uma peça de defesa contra eventual capitulação típica ofertada pelo acusador, o aluno deverá refletir sobre o fato narrado em si, e optar, dentre uma diversidade de possíveis caminhos a serem seguidos, por aquele que melhor atenderá aos fins almejados. Finalmente, e aí sim como ponto culminante deste procedimento, deverá o acadêmico formalizar, processualmente falando, a solução encontrada para o problema ou seja, deverá aplicar a técnica na elaboração da peça cabível para atingir seus objetivos.

Ao seu turno, a missão do professor da disciplina de prática consiste em elaborar ou escolher o caso prático a ser trabalhado em sala, levando em conta o quanto a situação escolhida conseguirá abordar aquelas características anteriormente pontuadas, selecionando preferencialmente as situações que sirvam para desenvolver no aluno a capacidade de perceber o que há de jurídico em cada fato, de forma livre, sem encarar a norma jurídica como algo definitivo e inalterável. Nada obstante, deve ainda o professor de prática resgatar questões de âmbito material e processual que eventualmente foram olvidadas no decorrer do aprendizado acadêmico; e mais, deve também realizar uma pormenorizada avaliação das atividades desempenhadas, sempre anotando eventuais equívocos cometidos pelo acadêmico no decorrer deste processo.

Por conseguinte, conclui-se que as diversas disciplinas de prática são fundamentais para a consolidação de uma boa formação jurídica, exatamente por traçar um liame entre a teoria (a dogmática do direito) e a realidade fática da atividade forense, o que será diariamente exigido do bacharel em direito ao longo de sua carreira.

Marcelo Lebre Cruz é professor de Direito Penal e Prática Penal, coordenador do Núcleo de Prática Jurídica da Unibrasil.