Em outro mundo

O presidente Lula inicia mais uma viagem internacional. Seguiu para a Europa, onde percorrerá vários países, numa hora em que a maioria dos brasileiros responsáveis entende que deveria permanecer no Brasil, cuidando da crise e dos problemas que lhe são afetos.

Esta viagem dá razão às más línguas que dizem que ele só se sente bem viajando ou fazendo discursos de improviso, preferentemente para massas de trabalhadores, sempre recheados de intenções eleitorais. Sonha com a reeleição e não perde oportunidade de fazer campanha, mesmo que a lei proíba essas manifestações extemporâneas e a situação não recomende que se cuide do futuro. O presente já é problema suficiente para ocupar todo o tempo de um presidente.

Há uma dissociação entre o presidente e o seu partido. Também entre Lula e a crise. Para ele, não importa se deputados de suas bases renunciaram e outros estão ameaçados de perder os mandatos. Acredita que, mesmo os que renunciarem, confessando culpa e habilitando-se a um novo mandato, numa próxima eleição estarão com ele. E com ele também estarão os trabalhadores e o Campo Majoritário do PT, que com pouco mais da metade dos votos partidários elegeu sua nova direção. A do grupo do presidente. Ajuda essa despreocupação o fato de ter conseguido eleger Aldo Rebelo para a presidência da Câmara. Tudo leva a crer que se cassações houverem, serão poucas e ficarão para as calendas. Os processos no Conselho de Ética chegarão ao seu final quando de ética nada terá sobrado na política brasileira.

Para que se preocupar, se todos acreditam que das maracutaias que compuseram o cerne da crise Lula nada sabia e ainda nada sabe? Nem quer saber! Se há culpados ao seu redor, o companheirismo recomenda uma posição de indulgência e alimenta a esperança de que, num processo eleitoral, todos estarão novamente juntos, apoiando o atual presidente. E o povo terá esquecido do mal que lhe fizeram e à democracia brasileira. E do bem que nem começaram.

Espanta que nem mesmo o bater de cabeças nas hostes do governo impressione o presidente. O vice José Alencar, que acaba de se filiar a um tal PMR – Partido Municipalista Renovador, agremiação fundada sob as bênçãos da Igreja Universal do Reino de Deus, em sabatina feita pela Folha de S. Paulo, disse que a política econômica é coisa do demônio, que a taxa real de juros do País é dez vezes a taxa de juros real da média de 40 países. Considerou o tamanho dos gastos e da dívida, devido ao gigantismo da taxa Selic, causas de um orçamento perdulário. Não obstante discordar da política econômica tocada por Palocci e apoiada incondicionalmente por Lula, diz-se fiel ao governo e, em especial, ao presidente. Ora, por que não? Chegou à vice-presidência sem precisar de votos. Bastaram os sufrágios dos devotos de Lula.

Este não é o primeiro bater de cabeças no governo e o fato de Alencar ser vice-presidente não descaracteriza o desentendimento. Ele também é ministro.

A aceitação do desentendimento dentro do próprio governo, do PT e dos partidos aliados e a despreocupação com a crise política e com a econômica, que já anunciam os empresários, o Fundo Monetário Intenacional e o próprio vice, pintam de azul o céu de brigadeiro em que voa Lula, rumo ao mundo dito desenvolvido. Dá medo, pois cada dia temos menos governo. Ou mais desgoverno.

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