Em busca da efetiva proteção do crédito trabalhista

Temos todos no Brasil a impressão de que, por ser privilegiado segundo o Código Tributário Nacional, o crédito trabalhista é sempre pensado em primeiro plano, ou seja, é sempre priorizado pelos diversos sistemas de controle que integram a complexa burocracia pública.

A realidade, porém, é bem diferente.

Para que uma empresa, por exemplo, possa participar de licitações públicas de qualquer valor, receber financiamentos públicos, alterar bases sociais e onerar seu patrimônio, é necessário, basicamente, apresentar as certidões negativas de débitos previdenciários e fiscais, exigência legal em vigor há mais de uma década. No entanto, pode ser tal empresa uma contumaz devedora na Justiça do Trabalho, porquanto ainda não há qualquer norma que obrigue a comprovação de regularidade trabalhista para praticar importantes atos da vida empresarial, especialmente aqueles vinculados com o Poder Público.

Noutras palavras, é mais cômodo ser devedor trabalhista do que devedor junto ao Fisco Municipal, Estadual ou Federal (e, quanto a este último, consideremos também aquele que tem dívidas com o INSS), já que as restrições legais para o inadimplente trabalhista são infinitamente menores, sem falar nos juros trabalhistas que estão em patamares bem distantes da taxa Selic cobrada pela Fazenda Pública Federal, por exemplo.

Cuida-se de uma gritante distorção, despida de qualquer fundamento conceitual, na medida em que o crédito trabalhista, por seu caráter alimentar e sua posição privilegiada até mesmo diante do crédito previdenciário, deveria receber maior controle das autoridades públicas, num movimento integrado de proteção social ao cumprimento da legislação trabalhista e às decisões emanadas dos diversos órgãos da Justiça do Trabalho.

Por isso, deve merecer apoio de toda a sociedade o Projeto de Lei n.º 7.077/2002, que institui a chamada Certidão Negativa de Débitos Trabalhistas – CNDT. Já aprovado pelo Senado Federal e ora em tramitação na Câmara dos Deputados, o projeto tem um importante mérito de dotar o crédito trabalhista de um rigoroso, embora desburocratizado, sistema de controle indireto do cumprimento da legislação social brasileira, uma vez que passa a ser exigível de empresas e pessoas físicas a apresentação da CNDT para a prática de oneração de bens imóveis, contratação com o Poder Público e recebimento de incentivos fiscais ou créditos concedidos por entidades financeiras públicas.

Assim dispondo, o projeto visa proibir que o devedor trabalhista, já reconhecido por sentença transitada em julgado, contra a qual, portanto, já não caiba mais recursos, possa se desfazer facilmente de seu patrimônio, dificultando a cobrança do crédito. Também passaria a ser vedada aos devedores trabalhista a obtenção de recursos públicos, mediante fornecimento de bens ou serviços, ou mediante a pactuação de contratos de fomento ou usufruto de incentivos fiscais, tudo no intuito de compelir o devedor trabalhista a solver suas pendências.

Nos dias de hoje, é indiscutível a eficiência do mecanismo de exigência de exibição de certidão negativa como uma ferramenta de controle indireto de cumprimento de obrigações legais e judiciais. Além de eficiente, é um sistema que se revela muito prático e com reduzido custo operacional para emissão de certidões. Neste sentido, é importante destacar que o projeto em debate autoriza a emissão da CNDT até mesmo através da internet ou outro meio eletrônico qualquer, tudo no intuito de facilitar o acesso do cidadão ou da empresa ao documento que lhe confere mais que uma certidão negativa, mas um atestado de respeito à legislação social brasileira.

Afora isso, a CNDT apresenta um caráter complementar à certidão negativa de débitos previdenciários. Isso porque, após a Emenda Constitucional n.º 20/98, a Justiça do Trabalho também passou a cobrar, de ofício, as contribuições sociais devidas pelos empregadores em razão de suas condenações, passivo previdenciário esse que hoje se encontra totalmente fora do alcance da certidão previdenciária, obstando, assim, a plena efetivação de restrições legais àqueles que estão em débito com o Instituto Nacional do Seguro Social.

Oxalá que a nova composição no Congresso Nacional seja sensível ao tema, imprimindo uma rápida tramitação ao PL 7.077/2002, a fim de que se dê ao crédito trabalhista um efetivo mecanismo de controle, consentâneo com a dinâmica da vida moderna e harmônico com as mais elevadas aspirações do povo brasileiro.

Luciano Athayde Chaves

é juiz do Trabalho e presidente da Associação dos Magistrados do Trabalho da 21.ª Região – Rio Grande do Norte.

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