Elegia ao professor

O professor está hoje entre as categorias profissionais desse País que mais sofreram com o processo de desclassificação social, em todos os graus do ensino público. Antigamente ser professor era título de sabedoria e dignidade social, sobretudo se pertencesse ao ensino oficial. Disse Capistrano de Abreu que no seu tempo o povo saudava o professor e o padre descobrindo-se, em pública reverência. Ele era o educador, o responsável pela formação e o futuro do seu filho. E a consideração maior era sempre atribuída ao ensino público.

Mas, embora vencesse modesto salário, o ganho do professor era então suficiente para que se apresentasse com decência e dignidade na escola e na sociedade. Entre nossos homens mais ilustres, a maior parte deles se iniciou na vida pública como professor. Há inúmeros exemplos, e nesse particular o antigo “Gymnásio Paranaense”, de Curitiba, foi um viveiro dos nossos talentos mais promissores. Mas há, entre todos, os que se distinguiram no ensino por sua permanente devoção e qualidade. Assim, foi o prof. João Brandão que em 1835 inaugurou o ensino público no Paraná, e passou 48 anos de sua vida dedicado à instrução. Mas ele não era só professor de primeiras letras; versava todas as disciplinas do currículo fundamental e era ainda mestre de latim, grego e francês, línguas que dominava com desembaraço, afiança Romário Martins. Nestor Victor evoca dois dos mestres memoráveis de Paranaguá: os professores José Cleto e Francisco Machado.

O primeiro porque soube introduzir com extrema doçura uma verdadeira reforma do ensino da época; e o segundo porque, apesar de doente infectuoso, nem por isso deixou de pôr a serviço do magistério de sua cidade todo o vigor de sua inteligência e a extensão da sua cultura, que incluía o latim, o italiano, o alemão e outras línguas de que era tradutor oficial do porto. E a história do ensino paranaense inclui educadores de alta escola, vultos eminentes da vida cultural e social do Estado como Dario Veloso, Sebastião Paraná, Azevedo Macedo, Cônego Braga, Emiliano Perneta, Lisímaco Ferreira da Costa, Júlia Wanderley, personagens de escol, não só a serviço do ensino público como co-participantes da construção do próprio Estado: de suas lideranças, aspirações e realizações. Foi um tempo de grandeza para o magistério paranaense. Mas o quadro hoje é cinzento, apesar do discurso oficial. Por primeiro, como resultado dos baixos salários, o magistério deixou de ser atividade principal e passou a constituir renda supletiva, confiada à mulher. O homem desertou do ensino, onde mais de 80% do magistério é composto de mulheres. A parca remuneração explica por quê nossos professores são hoje normalmente jovens, provém de famílias de condições sociais muito modestas e de baixa instrução. 60% deles nunca usou computador e um número ainda menor não lê jornal diariamente nem compra livros.

Faz dias, um amigo comum se surpreendeu com a deficiência da instrução e dos maus hábitos revelados por professoras do ensino público. E também se diz que há professor que dá aula de chinelo de dedo e tem falha de dente. Tudo isso, tem que ser levado em conta como indicativo do desprestígio atual da escola pública e do baixo rendimento escolar.

E, para sacrifício maior, o governo agora faz uso desse magistério empobrecido, para ensaios de política de redistribuição de renda, partindo do raciocínio igualitário-indígena de que o professor de ensino superior não pode pleitear nenhum aumento de vencimentos, porque se diferenciou dos demais, procurando se qualificar e ascender aos quadros do ensino superior para obter ganho maior que seus colegas. Falta sócio-política grave, para um tempo em que o refrão é exaltar a igualdade na pobreza e impingir à consciência social a idéia de que nascemos todos com a culpa original de existir quem seja mais pobre do que nós. E então fica a pergunta aflitiva: para aonde nos leva o destino da educação? Que diga quem puder adivinhar o futuro deste País…

Rui Cavallin Pinto

é membro da Academia Paranaense de Letras e do Instituto Histórico do Paraná

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