Você conhece alguém que não tenha celular? Difícil. Mas, há cinco anos, ter um telefone móvel era coisa para poucos, um luxo. Apenas no Rio, a fila de espera para conseguir uma linha era de 1,4 milhão de pessoas, que também estavam dispostas a pagar cerca de mil reais para ter acesso ao serviço e ao aparelho. Hoje, o país tem 38 milhões de usuários, contra 7,4 milhões em 1998. A estimativa da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) é de que, no próximo mês, esse número ultrapasse o de terminais fixos, atualmente em 39 milhões. A demanda reprimida no país, na época da privatização em sete milhões de linhas, aliada a uma competição de mercado bem-sucedida, ajudou no crescimento de 427% do setor. Mas o grande responsável pela explosão dos celulares foi o sistema pré-pago, que hoje representa 77% da base.

“O que facilitou a explosão dos celulares foi a demanda reprimida. Fora isso, a concorrência se estabeleceu, o que representa maior ganho para o consumidor em termos de preços. Já os pré-pagos foram uma solução para atrair e manter clientes, mesmo com a queda da renda, já que nessa modalidade não há necessidade de um gasto fixo mensal com assinatura”, – explica o diretor da WeDo Consulting, Akira Taguti.

A ATL, empresa da banda B do Rio, lançou o pré-pago no país. O presidente da Telecom Americas, controladora da ATL, Carlos Henrique Moreira, admite que a modalidade garantiu o crescimento da operadora no mercado.

“Foi uma estratégia de sobrevivência. Quando entramos a Telefônica (hoje, Vivo) comprou todos os pontos de vendas. Tínhamos que ter um diferencial e acabamos vendendo 190 mil celulares apenas no Natal de 98”, diz Moreira. Três milhões em apenas seis meses

O mercado de telefonia celular, que saltou de 7,4 milhões em 98, para 15 milhões em 99, apenas com a entrada da banda B, viveu uma nova onda de demanda no ano passado, com a entrada no mercado da Oi e da TIM, ambas com tecnologia GSM. Do fim de 2002 até junho deste ano, surgiram cerca de três milhões de novos usuários de celular. A Anatel atribui o aumento recente à entrada das novas empresas.

“Todas as nossas expectativas foram superadas. Hoje, apenas com tecnologia GSM, já temos 550 mil clientes”, – disse o presidente da TIM Brasil, Mario Cesar Pereira de Araujo.

A Oi, que pertence à Telemar, também comemora os 2,25 milhões de linhas em apenas um ano. Parte da estratégia da operadora foi o investimento na segmentação de produtos, como Oi Xuxa e Oi MTV, para crianças e adolescentes, respectivamente.

O mercado de celular também passou por uma consolidação recente. A Vivo surgiu de uma joint-venture entre a Telesp Celular e a Telefônica, o que transformou o grupo no maior do país, com 18 milhões. O exemplo foi seguido pela Telecom Americas, que reúne ATL, Americel, BCP Nordeste, Claro Digital e Tess, com 6,6 milhões de assinantes.

Um bom exemplo da democratização do celular é a família Cabral. O patriarca, seu Rubens, é dono de uma das primeiras linhas liberadas pela então Telerj Celular:

“Era caríssimo. Hoje todo mundo tem, até as crianças. Na minha família são nove aparelhos”, diz Andrea Cabral, filha de seu Rubens.

A competição também chegou às ligações de longa distância nacional e internacional. Com a entrada da Intelig no mercado, empresa-espelho da Embratel, o setor viveu uma guerra de tarifas.

Guerra de tarifas na longa distância

O auge da concorrência aconteceu em julho de 2001, quando o preço do minuto para os Estados Unidos despencou para R$ 0,07. Hoje, a disputa conta ainda com o poder de fogo da Telemar e da Telefônica, além de outras operadoras que têm licença, mas interesse menor nesse mercado.

“É uma briga grande, mas o consumidor saiu ganhando em preço e em serviços novos, como débito em conta e cobrança conjunta, por exemplo”, diz o diretor de marketing da Intelig, Kleber Meira.

Ministro diz que governo vive ” pressão brutal”

O ministro das Comunicações, Miro Teixeira, afirma que a privatização alcançou sucessos como na telefonia celular, com a chamada inclusão telefônica proporcionada pelos pré-pagos. No entanto, ele destaca que a competição prevista na exposição de motivos da Lei Geral de Telecomunicações (LGT) não foi atingida na telefonia fixa. “Existe um abismo entre o que se pretendia e o que foi realmente conquistado”, diz o ministro. A pior situação é a de São Paulo: a Telefônica presta serviço para 98,7% dos assinantes e a Vésper SP atende a 1,3%.

Depois de cinco anos de privatização de telecomunicações, qual a sua avaliação sobre o setor?

Miro Teixeira: Há êxitos inquestionáveis, como na telefonia celular. Criou-se um regime de competição e o serviço tem melhorado para o cidadão. Ainda há precariedade, porque você tem uma certa propaganda enganosa em que o cliente é comunicado que pode viajar o Brasil inteiro ligado e, na primeira curva que ele faz, fica fora do ar.

E quanto ao acesso ao serviço de telefonia celular?

Miro: O celular pré-pago acabou sendo o veículo da inclusão telefônica e melhorou o conjunto de atividades de trabalhadores autônomos, como carpinteiros, encanadores e eletricistas. Mas o serviço é caro. Como é que o pessoal contorna? Recebe a ligação no pré-pago e responde no orelhão.

Há competição na telefonia fixa?

Miro: Quando você lê a exposição da Lei Geral de Telecomunicações (LGT), percebe que as intenções eram as melhores. Só que há uma grande diferença entre intenções e realidade. Chegou-se a dizer que a discussão de tarifas seria absolutamente desnecessária quando fosse criado o ambiente de competição, o que não aconteceu na telefonia fixa, mas acontece na telefonia celular.

O senhor diria que a telefonia fixa é oligopolizada?

Miro: É pior do que isso. É um monopólio mesmo. Na telefonia celular ainda há preços altos, mas existe competição. Quando foi anunciado o teto de reajuste de cerca de 22% em fevereiro, as empresas aplicaram só 5%, 4% ou 6%, porque há competição. A telefonia fixa não é só uma atividade oligopolizada. No Brasil, na modelagem da privatização, houve um erro, porque há monopólios regionais.

São grandes as pressões das telefônicas sobre o governo?

Miro: É uma coisa dramática o que nós vivemos, um jogo de pressão brutal. O tamanho deles é enorme, os interesses contrariados não podem ser medidos em calculadoras de poucos dígitos.

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