Subsídios dividem governos do Brasil e EUA

Não é à toa que os EUA estão tão reticentes em discutir a redução dos subsídios agrícolas na Alca. Mais do que oferecer proteção aos agricultores norte-americanos, os políticos estadunidenses têm interesse em manter os subsídios por causa do apoio eleitoral dos produtores. As autoridades em Washington repetiram exaustivamente, em entrevistas a um grupo de jornalistas brasileiros, que os EUA tem interesse em eliminar os apoios agrícolas, porém condicionam a retirada dos subsídios à adoção da mesma medida pela União Européia e Japão. Diferentemente do que pensa o governo brasileiro, que deseja incluir a agricultura na Alca, os EUA trabalham pela discussão do tema na OMC.

Washington – Estudo do IFPRI (Instituto Internacional de Pesquisas sobre Políticas Alimentares ) mostra que a eliminação das políticas de subsídios à agricultura primária e produção agroindustrial de todos os países industrializados representaria um ganho anual de US$ 23,4 bilhões para todos os países em desenvolvimento. Só o Brasil teria um incremento de US$ 2,258 bilhões, o que significa que o saldo do comércio agrícola internacional do Brasil (exportações menos importações) somaria US$ 4,262 bilhões, um avanço de 49,5%.

Hoje, a balança comercial dos produtos agrícolas entre Brasil e EUA é superavitária para o Brasil, fruto de exportações brasileiras de US$ 1,193 bilhão (40,65% maior que no mesmo período de 2002), enquanto as importações da agricultura americana totalizaram US$ 292,2 milhões no mesmo período (crescimento de 28,13% sobre 2002).

Dados divulgados pelo governo americano mostram que os recursos de apoio para a agricultura e programas de conservação têm se mantido estáveis. Em 2000, o montante chegou a US$ 32,3 bilhões, caindo para US$ 22,1 bilhões em 2001 e US$ 15,7 bilhões em 2002. Neste ano, a estimativa é que esse tipo de verba totalize US$ 17,8 bilhões, com projeção de se manter na casa dos US$ 18 bilhões até 2007, recuando até US$ 15,6 bilhões em 2013.

Dos US$ 200 bilhões da produção agrícola dos EUA, os subsídios que distorcem mercados estão limitados a US$ 19,1 bilhões nesta safra, de acordo com o sub-secretário de Assuntos e Serviços Agrícolas Estrangeiros, J.B. Penn. Na União Européia o valor chega a US$ 67 bilhões e no Japão a US$ 32 bilhões. “Lamentamos os níveis diferentes de subsídios. Nossa proposta é harmonizar os subsídios para deixar todos os países no mesmo nível, o que não viola as regras da OMC”, frisa. “Estamos ansiosos pelo encontro ministerial (da Alca) de Miami, em novembro, com grande esperança de podermos deixar para trás as diferenças entre Brasil e EUA que se tornaram evidentes em Cancún”.

Para Penn, a agricultura é uma peça-chave para o crescimento econômico brasileiro. “O Brasil é um grande exportador de suco de laranja, soja, carne e açúcar, tem tecnologia de ponta, produtos muito competitivos no mercado mundial e tem expandido a produção de soja num ritmo impressionante. Para mim, é compreensível a posição que o Brasil adotou em Cancún, mas também acho que é interesse da economia brasileira o acesso a mercados. A Alca é um veículo perfeito para ampliar o comércio agrícola”, ressalta, destacando que a produção econômica do continente americano soma US$ 13 trilhões.

Histórico

Os subsídios à agricultura americana remontam à 1862, com a Lei da Propriedade Agrícola, que concedeu terra grátis para exploração a famílias interessadas em fixar residência no campo. Em 1932, o presidente Rosevelt estabeleceu a Previdência Social e programas agrícolas baseados no princípio da oferta e procura na agricultura dos EUA – que valem até hoje.

A Lei Agrícola aprovada em 96 previa o fim do envolvimento do governo na agricultura em 2003, tornando o mercado livre. “Na época, os preços estavam altos, mas depois caíram nos dois anos seguintes. Os banqueiros temiam a desvalorização das terras e os políticos temiam que os agricultores votassem contra, por isso aprovaram o dinheiro de emergência para a agricultura em 2002”, observa uma fonte ligada ao setor agrícola nos EUA.

Basicamente, existem duas formas de subsídios nos EUA: pagamentos diretos proporcionais à média de produção (cuja legislação será reconsiderada em 2007) e um auxílio financeiro quando as cotações atingem um patamar muito baixo. Apesar da expectativa brasileira de elevar as exportações com a abertura do comércio continental, o mesmo pensamento está na mente dos produtores americanos. “Para a maioria dos agricultores americanos, o Brasil constitui uma grande ameaça, por ter grande extensão de terra, mão-de-obra barata e aumento da competitividade”, diz a fonte.

“Brasil e EUA são concorrentes em mercados mundiais, mas ao mesmo tempo compartilham uma necessidade mútua de acesso a mercados agrícolas. Por isso, deveriam trabalhar juntos para ter acesso e depois concorrer”, aponta David Orden, pesquisador sênior do IFPRI.

O reporter viajou a convite da Embaixada dos EUA.

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