Temor de desabastecimento.

O preço do petróleo ultrapassou ontem a barreira dos US$ 40 nos Estados Unidos. Os investidores preocupam-se com riscos de atentados terroristas no Oriente Médio, com a proximidade da temporada de maior consumo de combustível nos Estados Unidos e a forte demanda por parte da China. Na Bolsa New York Mercantile Exchange, onde são negociados óleo e gasolina, o barril para junho do cru leve subiu US$ 0,68 e chegou à cotação de US$ 40,05 pouco depois da abertura do mercado. Em seguida, caiu para US$ 39,95.

Esta foi a maior cotação do cru leve desde outubro de 1990, depois que o Iraque invadiu o Kuwait na crise que levou à Guerra do Golfo. Em Londres, o barril do brent subia US$ 0,52, para US$ 37,05. A persistente alta do óleo levou um diretor executivo da Agência Internacional de Energia, anteontem, a citar a possibilidade de um “novo choque de petróleo” no mundo.

Os analistas já previam que o barril em US$ 40 fosse iminente. Os compradores temem que o tiroteio ocorrido no final de semana em uma instalação petroquímica na Arábia Saudita e a recente tentativa de atentado em um terminal exportador de petróleo em Basra, no Iraque, possam ser os percursores de um ataque maior em instalações vitais no Oriente Médio. A região é responsável por um terço da produção diária de cru.

Gasolina

Durante a jornada de ontem, a gasolina para junho nos EUA bateu outro recorde ao ser cotada a US$ 1,3290 por galão (3,78 litros). O motivo é a proximidade da época do ano em que os norte-americanos mais viajam de carro, ou seja, entre os feriados do final de maio e começo de setembro.

Os EUA, com menos de 5% da população mundial, respondem por 45% do consumo global de gasolina, ou um pouco mais de 20 milhões de barris por dia. Contudo, embora os motoristas americanos estejam pagando o valor recorde de US$ 1,84 por galão, os preços no varejo são apenas um terço da média cobrada na Europa Ocidental e ainda não estão causando impacto na demanda.

“Novo choque”

Analistas têm pedido calma ao mercado, dizendo que a economia norte-americana e os preços das ações podem dar conta da alta do petróleo – embora, mais do que nunca, a inflação possa se tornar uma dor de cabeça.

O petróleo caro, entretanto, já tem influenciado negativamente as bolsas americanas, com os investidores lembrando as turbulências causadas pelos choques do petróleo em décadas anteriores. Entre 1973 e 1974, os preços do óleo quadruplicaram, causando falta de crescimento e desemprego generalizados. Em 1979 e 1980, um novo aumento levou a uma recessão global que durou até 1982. Teme-se, portanto, que o impacto negativo dos altos preços ponha nuvens negras sobre o crescimento global.

O diretor executivo da Agência Internacional de Energia, Claude Mandil, estimou ser possível “um novo choque do petróleo”, ou seja, preços elevados a ponto de atrapalhar a recuperação da economia mundial.

De acordo com instituições internacionais de energia, os efeitos da alta do preço do cru serão diferentes para cada país, relacionando-se ao nível de dependência das importações do óleo.

Acabou a era do petróleo barato

O presidente da PDVSA (estatal petrolífera venezuelana), Alí Rodríguez, disse que “acabou a era do petróleo barato”, em entrevista publicada ontem pelo jornal argentino Clarín.

“Acabaram os tempos do petróleo barato. Temos que descartar uma queda significativa, para que volte aos US$ 20 que valia em 2001, mesmo que termine o conflito entre EUA e Iraque.” As declarações foram feitas por Rodríguez antes que o barril do petróleo ultrapassasse, ontem, a barreira dos US$ 40, nível mais alto desde outubro de 1990.

Segundo Rodríguez, há diversos fatores que são “muito mais decisivos” que a guerra contra o Iraque para a alta dos preços do produto. “A importante demanda da China e da Índia, duas economias que crescem a um ritmo muito intenso, mantém os preços elevados.” Rodríguez também afirmou que só nos EUA existe um déficit de 2,7 milhões de barris por dia.

A Venezuela é o oitavo maior produtor mundial e o quinto maior exportador de petróleo cru, além de ser o único país latino-americano da Opep (Organização de Países Exportadores de Petróleo), com uma cota de produção de 2,43 milhões de barris por dia.

Bovespa fecha 5.ª semana com perdas

A Bovespa fechou ontem a quinta semana consecutiva de perdas, com os investidores preocupados com uma alta do juro nos EUA, a disparada do preço do barril de petróleo para US$ 40 e do dólar para R$ 3, além das derrotas políticas do governo Lula nos casos da proibição aos bingos e do reajuste do salário mínimo. O principal índice da bolsa voltou à casa dos 18 mil pontos com uma queda de 2,97%, somando 18.620 pontos, menor nível desde novembro do ano passado. Em janeiro, o Ibovespa estava no patamar recorde de 24 mil pontos. Na semana, o indicador desvalorizou 5%, acumulando baixa de 16,2% no ano.

Desde a Semana Santa, período de quatro pregões (5 a 8 de abril), a Bovespa só acumula baixas. O estopim dessa seqüência negativa foi a divulgação de indicadores mostrando a recuperação da economia americana, uma senha para alta do juro.

Ontem, o dado sobre criação de vagas (288 mil) no mercado de trabalho dos EUA em abril, acima do previsto, reforçou a aposta de juro maior no próximo mês – um cenário desfavorável ao fluxo de capital para países emergentes, como o Brasil.

“O mercado de trabalho sugere alta de juros já em junho, e não mais em agosto”, afirmou o economista do banco Fibra, Guilherme da Nóbrega.

Em abril, o aumento das vendas no varejo e da inflação em março surpreendeu analistas. Desde junho de 2003, o juro está em 1%, o menor desde 1958. A política de juro historicamente baixo foi adotada pelo Fed (Federal Reserve, o banco central americano) para reanimar a economia, após um ambiente recessivo em 2001, ano dos ataques terroristas, os escândalos corporativos em 2002 e a guerra no Iraque no primeiro semestre do ano passado.

Festa dos emergentes acabou

Agora, a perspectiva de juro maior na principal economia do mundo motiva uma onda de venda de títulos de emergentes como o Brasil em abril, quando o mercado começou a reduzir a exposição das carteiras a ativos considerados de “maior risco”.

Para turvar ainda mais o cenário para os investidores, a economia brasileira ainda apresenta sinais de estagnação, como o desemprego recorde. As pressões sociais e políticas por mudança na política econômica do governo Lula também preocupam os analistas, bem como o impasse na definição do novo salário mínimo e a derrota do Planalto na votação da medida provisória que proibia os bingos. Nesta semana, foi instalada uma comissão mista no Congresso comandada pela oposição visando elevar o percentual de reajuste do salário mínimo.

Também contribuiu para a performance negativa da bolsa a previsão de um menor ritmo de crescimento da economia chinesa, terceiro maior parceiro comercial do Brasil. As ações do setor de siderurgia foram as mais prejudicadas com a divulgação de dados sobre a menor importação de aço pelos chineses. Ontem as ações da Usiminas desabaram 7%.

Moeda acumula alta de 4,43%

O movimento de investidores retirando investimentos de países emergentes e comprando dólares continuou tendo um forte reflexo no mercado de câmbio. No último dia de negócios da semana, o dólar chegou a ameaçar a barreira psicológica dos R$ 3,10, registrando a mais alta cotação desde 16 de abril do ano passado.

No fechamento do dia, a divisa era cotada a R$ 3,062, com uma valorização de 4,43% na semana e no mês. As últimas altas diárias fortes da moeda americana foram seguidas por dias de realização de ganhos pelos exportadores, que aproveitavam as altas cotações para trocar dólares. Diferente do que aconteceu esta semana, com uma alta já de 1,48% anteontem e de mais 2,13% ontem.

Segundo analistas, mesmo esses agentes podem estar à espera de cotações ainda maiores para vender seus dólares. Para o gerente de câmbio do banco Rendimento, Hélio Ozaki, a insegurança não é apenas internacional, mas também doméstica. Ou seja, investidores locais estão trocando suas aplicações por dólar.

Segundo muitos entrevistados na semana, a fragilidade e a dependência externas têm ficado mais evidentes com a fuga dos investidores dos mercados em desenvolvimento.

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