Palocci afirma que BC resiste à pressão política

Brasília –  O ministro da Fazenda, Antônio Palocci, reafirmou ontem que o Banco Central (BC) tem independência para conduzir a política monetária, ao comentar a decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) de manter os juros em 26,5% ao ano na semana passada, apesar das pressões políticas. “O BC responde à pressão da inflação e não à pressão política”, disse o ministro em entrevista ao programa Bom Dia Brasil, da TV Globo. “Se a inflação pressiona a política monetária, o BC age, não vacila.”

Segundo Palocci, o BC não autônomo é aquele que não pode ouvir uma crítica, porque é fraco, vacila. “O que vimos nesses últimos dias é que o BC no Brasil já tem autonomia. Agora, evidentemente, queremos fazer disso uma legislação que faça com que essa autonomia se transporte para uma característica institucional do banco, para que o Brasil não tenha dúvida de que o seu Banco Central vai agir sempre contra a inflação e não aceitar pressões políticas. A única pressão que funciona no banco é a pressão da inflação. Quando ela é grande, o banco age, quando ela não existe, o Banco Central pode fazer uma política mais leve. É assim que nós queremos que funcione.”

Palocci disse ainda que não foi “preciosismo” do BC a decisão de não baixar os juros. “Pelo contrário. O que tínhamos era uma ameaça de inflação explosiva, e até no ano passado chegamos a ter dúvidas sobre o pagamento da dívida brasileira. Essas ameaças mais graves foram eliminadas. Hoje você não tem ameaça de inflação explosiva, nem de possibilidade de o Brasil não cumprir seus compromissos. Agora, a inflação permanece alta. Ela está em queda, nós estamos vencendo a luta contra a inflação, mas ela ainda está alta. Se você anualizar a inflação nos últimos quatro meses, ela chega perto de 20%. Então, ainda não é o desejável.”

Segundo o ministro, a luta contra a inflação ainda não está vencida. “Ainda há muita remarcação de preço, ainda existem negociações considerando inflação passada e não presente. Se não houver uma ação dura neste momento, vamos reproduzir a inflação e permitir que ela cresça desordenadamente. Isso não vamos permitir”, garantiu.

Palocci disse não estar preocupado com a impopularidade da manutenção dos juros altos. Segundo ele, a equipe econômica do governo não está em busca de popularidade. “Nós estamos na equipe econômica para acertar as contas do País, porque essa é uma necessidade essencial de início do governo. Se o governo não faz isso agora, fará durante quatro anos. Não tem alternativa”, disse Palocci, ainda em referência às críticas que vem recebendo em relação à manutenção dos juros.

O ministro admitiu que não tem sido fácil adotar um “medicamento forte” para o controle da inflação. “Ninguém do governo gosta de juros altos, nem o País gosta. Mas ele é necessário. É como naqueles momentos que você deve dar uma medicação dura para o paciente, que tem efeitos colaterais, mas que é uma necessidade e você sabe que não pode deixar de fazê-lo. Essa é a política monetária e é assim que ela funciona.”

Paralelamente às medidas para assegurar o equilíbrio econômico, o governo já está tomando providências para garantir o crescimento, sem surpresas, como aconteceu no passado, quando o País teve a chance de crescer, mas foi impedido pela falta de energia elétrica, disse o ministro. “Nós tivemos o apagão, não acertamos a situação e agora a ministra Dilma Roussef (de Minas e Energia) está com sua equipe ordenando o setor, junto com os investidores privados, e acredito que está caminhando muito bem.”

Outra preocupação, segundo ele, é garantir infra-estrutura em portos e rodovias para a exportação de grãos, que no próximo ano deverá superar a safra recorde atual, prevista em 115 milhões de toneladas.

A terceira providência, segundo o ministro, é garantir o financiamento público e privado. “Isso precisa ser feito agora. Por isso tenho insistido no debate político em que, para crescer mais para frente, temos que preparar as condições de crescimento agora. Não haverá uma fase, uma nova etapa para preparar as condições de crescimento”, observou o ministro.

“O Brasil poderá ter uma ciência aplicada em termos de inovação industrial mais eficiente. Se nós utilizarmos financiamento público para entrar nas cadeias produtivas, buscando o que o Brasil pode fazer melhor, vamos qualificar a produção, vamos ter uma presença no mercado mundial com produtos de maior valor agregado e com isso o Brasil só tem a ganhar. São políticas difíceis e complexas que têm que ser preparadas desde já.”

Dólar dispara e sobe quase 4%

A mudança na política de rolagem da dívida atrelada ao dólar caiu como uma bomba sobre o mercado financeiro nesta segunda-feira. A moeda norte-americana disparou e fechou na cotação máxima do dia, vendida a R$ 3,025, com alta de 3,87%. E a previsão é de novas altas nos próximos dias.

A medida, que consiste apenas na informação de que o Banco Central pode deixar de renovar integralmente sua dívida cambial, foi entendida como uma “intervenção indireta” no câmbio, porque pode diminuir a oferta de dólares no mercado.

Isso porque até a sexta-feira passada o BC sinalizava que deixaria o mercado com muito hedge (proteção) cambial. Na sexta, por exemplo, o BC iniciou, com uma semana de antecedência, a rolagem de 58,5% de uma dívida que só vence no dia 2 de junho. O recado foi entendido então como um sinal de que deixaria o dólar abaixo de R$ 3 e a moeda norte-americana desabou 2,2%.

Por conta da possibilidade de menor oferta de dólares, bancos e investidores se desesperaram para refazer as posições compradas nos contratos futuros, o que também pressiona as cotações no mercado à vista.

“A reação foi exagerada porque foi anunciada em um dia com poucos negócios”, afirma Emílio Garofalo Filho, ex-diretor da Área Externa do BC. Muitos analistas já defendiam anteriormente uma intervenção no câmbio para proteger o setor exportador, que vê seus ganhos diminuírem quando o real se valoriza.

??O anúncio foi traumático??, afirma um operador. Ele explica que, pego de surpresa, o mercado não teve tempo de refazer suas estratégias e por isso a valorização do dólar foi tão expressiva. ??Esse tipo de notícia tem que ser dada no final do dia para evitar grandes volatilidades??, reclama. ??Estão todos mais cautelosos porque a incerteza sobre se o BC vai rolar a totalidade da dívida ou não da próxima vez é mais uma variável a ser considerada na avaliação de cenário.??

Como ontem o mercado norte-americano não funcionou, devido a feriado nacional, não foi possível medir a reação dos investidores estrangeiros ao anúncio por meio da variação do C-Bond – principal título da dívida externa brasileira – e do risco-Brasil.

O título é cotado a 89,938% do valor de face e o risco está em 783 pontos.

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