Negociador teme que Alca não saia do papel

Brasília e São Paulo – O negociador brasileiro da Alca, Adhemar Bahadian, em discurso na Câmara, ontem de manhã, lembrou que há desequilíbrios dentro do Hemisfério, porque cada país tem interesses, prioridares e expectativas distintas. Em recado direto aos americanos, representados por Peter Allgeir, que estava na platéia, Bahadian afirmou: “Existe atitude inadequada de algumas partes envolvidas que combinam falta de realismo com excessivo maximalismo na busca de resultados que se mostram inalcançáveis”.

Ele disse que nos Estados Unidos também há interesses, assim como nos países do Mercosul, que acabam restringindo as negociações, mas atacou: “É contraditório que um país aponte sensibilidades em algumas áreas e impeça que outros países façam o mesmo. O processo da Alca corre sério risco de não sair da condição de projeto”, afirmou.

Segundo ele, as negociações estão paralisadas nos últimos seis anos em função da agenda ambiciosa que alguns países, como Estados Unidos e Canadá, defendem. “Não se pode dizer que as propostas que foram feitas há menos de três meses pelo novo governo tenham sido responsáveis pela paralisação da Alca. Esse argumento é falacioso, tendo em vista que em seis anos nada aconteceu”, disse Bahadian, que foi aplaudido por representantes de países de todo o Hemisfério que participam do seminário.

Bahadian afirmou que o governo não está fazendo campanha antiamericana e assegurou que o Itamaraty está cumprindo seu papel sem adotar uma postura ideológica. “As insinuações de que as posições do Itamaraty são ideológicas são uma página triste da imprensa brasileira.”

Segundo ele, esse linchamento atinge especificamente o secretário-geral do Itamaraty, Samuel Pinheiro Guimarães, que, antes de assumir o governo, tornou pública sua posição contrária à Alca.

O negociador brasileiro lembrou, ainda, que desde 1994, quando foram lançadas as negociações da Alca, a política dos Estados Unidos vem dificultando avanços, acrescentando que na reunião técnica da Alca, em Trinidad e Tobago, os americanos disseram com franqueza, pela primeira vez, que apoio doméstico e antidumping só serão discutidos na Organização Mundial do Comércio. “Em Trinidad e Tobago não houve fracasso, ao contrário, o que se viu foi uma avaliação franca do estado de negociação da Alca.”

Sobre a rejeição da proposta do Mercosul, que permite acordos diferenciados, Bahadian disse que a sugestão foi feita devido à necessidade de um redesenho das negociações. “Mas os Estados Unidos quebraram o precário balanço de perdas e ganhos para outros países.”

“Freio”

O ministro da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Roberto Rodrigues, disse que a Área de Livre Comércio das Américas (Alca) poderá ter um “freio”, se os temas agrícolas não forem discutidos na reunião ministerial de Miami, no dia 14 de novembro, como exigem os Estados Unidos. Ele defende que o Brasil mantenha firme sua posição de incluir as questões agrícolas nas negociações para implantação da Alca. Caso contrário, não terá acesso aos mercados em igualdade de condições com outros países.

EUA insistem em cumprir prazo

Brasília e São Paulo

– O negociador americano da Alca, Peter Allgeier, veio ao Brasil como convidado do seminário que trata do papel dos legislativos na Área de Livre Comércio das Américas mostrar que seu país continua jogando duro nas negociações. Antes de participar do seminário, na Câmara, mais uma vez ele criticou a proposta do Mercosul, deixando claro que os Estados Unidos rechaçam a possibilidade de acordos bilaterais e trouxe o seguinte recado às autoridades brasileiras: “Será melhor que todos os 34 países assinem o acordo em janeiro de 2005. Será melhor para todos, mas se alguém quiser ficar de fora é um direito que lhes cabe”, disse Allgeir.

Segundo ele, o governo Lula mudou a orientação em relação à Alca. “O governo anterior atuava mais à vontade com o modelo que queremos para a Alca”.Allgeir reafirmou a posição dos Estados Unidos de negociar a redução de apoio doméstico aos produtores locais e revisão das regras antidumping na Organização Mundial de Comércio. Quanto aos subsídio às exportações agrícolas, disse que seu país até admite conversar no âmbito da Alca, desde que haja algum tipo de defesa em relação aos produtos subsidiados de terceiros mercados, como a União Européia.

Allgeir argumentou que a proposta americana é flexível e que, embora haja alguns benefícios diferenciados por blocos de países no início (os países caribenhos, por exemplo, terão uma abertura maior), no fim do processo haverá abertura para todos, sem discriminação. Quanto às regras antidumping, ele afirmou que atualmente esse mecanismo vem sendo usado cada vez mais por países em desenvolvimento, como Brasil, Argentina, África do Sul e Índia. “Toda negociação fica mais difícil quando está chegando ao fim”, disse Allgeir.

Agricultura na pauta

O embaixador norte-americano Luis Lauredo afirmou nesta terça-feira ser incorreto dizer que os Estados Unidos não negociam a Agricultura no âmbito da Área de Livre Comércio das Américas (Alca). Segundo ele, a Agricultura é uma das nove áreas de negociações do acordo e os EUA estão comprometidos em negociar “temas da Agricultura”. Lauredo afirmou que a questão dos subsídios domésticos “é um problema que reflete realidades políticas internas”. Ele ressaltou que “os gigantes do abuso do subsídio” são a Europa e o Japão, buscando justificar que a eliminação gradual dos subsídios deve ocorrer no âmbito da OMC. “Os EUA não exclui nada da agenda de negociações.”

Lauredo disse ainda que as duas negociações referentes à agricultura, no âmbito da OMC e na Alca, “são complementares”. Segundo ele, a grande frustração dos Estados Unidos foi de não ter discutido os subsídios na reunião de Cancun. “Do ponto de vista prático, se perdeu uma grande oportunidade”. Lauredo afirmou que os Estados Unidos estão comprometidos com o processo de negociação da Alca e disse que o acordo de livre comércio das Américas não é uma iniciativa dos EUA.

“A Alca é uma iniciativa do Brasil, do EUA, do México, do Chile, da Nicarágua, dos 34 países que se reuniram em Miami”, disse. “Parem de dizer que a Alca é um projeto dos EUA porque, certamente, é uma mentira. É um projeto comum”, ressaltou. Segundo ele, “quem não quer entrar na Alca, não tem de entrar na Alca. Aqui não há nenhuma conspiração.”

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