Fiscalização define se PR é 100% livre de transgênico

Apesar da insistência do governo do Paraná em obter a declaração de área livre de transgênicos, o Estado terá dificuldade em conseguir esse status no Ministério da Agricultura, disse ontem o secretário de Defesa Agropecuária do ministério, Maçao Tadano. A avaliação foi feita com base no número de produtores paranaenses que já encaminharam o Termo de Compromisso, Responsabilidade e Ajustamento de Conduta, previsto na Medida Provisória 131, de 25 de setembro. Segundo Tadano, só a superintendência da Caixa Econômica Federal no Paraná já repassou ao ministério cerca de 100 termos. Ao assinar o termo, os agricultores admitem que têm sementes de soja geneticamente modificada e legalizam uma produção que sem a assinatura é considerada ilegal.

A MP 131 determina, em seu artigo 4.º, que o Ministério da Agricultura poderá excluir das regras da medida provisória áreas ou regiões nos quais comprovadamente não se verificou a presença de organismos geneticamente modificados. O governo do Paraná defende que a exclusão – reconhecimento de que não há transgenia – poderia aumentar as vendas externas de soja para mercados que preferem o produto convencional.

No entanto, acrescentou Tadano, o governo estadual não apresentou solicitação formal de exclusão de acordo com as regras da instrução normativa 14, de 16 de outubro. O parágrafo único do artigo 1.º da instrução normativa determina que a solicitação de exclusão “deverá ser instruída com dados e informações quanto ao mapeamento das áreas produtoras de soja nas quais não se verificou a presença de organismos geneticamente modificados, incluindo suas respectivas delimitações e especificação da metodologia empregada”.

100% livre?

O governo paranaense busca a declaração de todo o Estado como área livre de transgênicos, argumentando que os mecanismos de fiscalização adotados são suficientes para identificar e apreender toda a soja geneticamente identificada encontrada. A Secretaria Estadual da Agricultura e Abastecimento (Seab) já encaminhou a solicitação ao Ministério da Agricultura, que pediu informações adicionais.

“O termo de ajustamento de conduta não significa necessariamente que o produtor vai plantar transgênico, quer dizer apenas que ele está usando grãos da safra passada”, diz o diretor do Departamento de Fiscalização e Defesa Agropecuária da Seab, Felisberto Batista.

Embora algumas entidades aleguem conflito entre a legislação do Paraná e a do governo federal em relação aos transgênicos, o diretor do Defis afirma que a Constituição dá aos Estados a prerrogativa de legislar de forma concorrente ou supletiva. “A lei estadual é diferente, mas não contraria a lei federal. Apenas é mais rigorosa. Seria conflitante se a lei federal dissesse que todos os agricultores são obrigados a plantar transgênicos”, exemplifica.

A posição do delegado federal do Ministério da Agricultura no Paraná, Valmir Kowalewski de Souza, é de cautela. “É possível todo o Estado ser livre de transgênicos, mas depende do resultado do mapeamento que estamos fazendo, que deve sair dentro de 15 dias”, comentou.

Fiscalização

Cerca de 40 agrônomos do Departamento de Fiscalização (Defis) de todos os núcleos regionais da Secretaria de Estado de Abastecimento estão recebendo informações sobre como fiscalizar a soja armazenada que foi colhida na safra passada. Os técnicos estão em Curitiba recebendo também orientações da Procuradoria Geral do Estado (PGE) e da Divisão de Sanidade Vegetal (DVS) sobre a legislação vigente no Paraná a respeito dos transgênicos.

A estimativa é que existam ainda 10 milhões de quilos soja da última colheita guardadas, como forma de manter o preço em aquecimento. Os fiscais devem começar o trabalho no campo já a partir de amanhã.

Parte aguarda transferência

No Porto de Paranaguá, 1,5 mil toneladas de soja transgênica da retaguarda (fora da área primária) já foram transferidas para o silo público. A previsão é que até sexta-feira, mais 3,5 mil toneladas de terminais pequenos sejam deslocadas. Nos terminais privados onde a fiscalização detectou soja geneticamente modificada na semana passada, a carga ainda não foi retirada. O silo paraguaio administrado pela ADM aguarda autorização da Receita Federal para retirar as 1.032 toneladas de soja paraguaia, já que o local é considerado território paraguaio. As 20 mil toneladas de soja brasileira encontradas no terminal da ADM dependem de documentação fiscal. Já a Cargill, que tem 11 mil toneladas estocadas, reivindicou o transporte da carga pelas correias da empresa direto para o navio que chega no dia 23, sem necessidade de passar a mercadoria para o silão.

A coordenação da Jornada de Agroecologia, que reúne mais de 30 organizações sindicais, ONGs e MST, protocolou ontem representações na Procuradoria da República do Paraná e na delegacia regional do Ministério da Agricultura, pedindo punição aos produtores que plantaram transgênicos no Paraná. “Queremos o Paraná e o Brasil livre de transgênicos e sem agrotóxicos”, explicou o advogado Darci Frigo, que integra a Jornada de Agroecologia. O objetivo do movimento é a desapropriação para reforma agrária das áreas onde a soja transgênica foi plantada irregularmente. (OP)

Não há estudos comprovando malefícios

Não existem estudos científicos comprovando que alimentos com organismos geneticamente modificados fazem mal à saúde. A informação é dos professores da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR), que convocaram ontem a imprensa para esclarecer dúvidas sobre os transgênicos. Segundo eles, existe um pânico generalizado entre a população, que tem poucas informações sobre o assunto.

“Algumas pesquisas indicam que o consumo de produtos transgênicos pode causar alergias. Mas ainda não se sabe se o motivo é de fato a proteína que existe no transgênico”, explica a engenheira de alimentos e professora da PUC-PR, Elaine Berges da Silva, acrescentando que é difícil descobrir as causas das alergias. “Foi feita, por exemplo, uma experiência com castanha geneticamente modificada pela Embrapa, e o resultado foi que as pessoas que tiveram alergia à castanha transgênica tiveram também em relação à convencional.”

“Hoje os transgênicos levam cerca de seis anos até chegar ao mercado. Depois de tanto tempo de pesquisa, o risco de um produto geneticamente modificado causar alergia é muito menor do que o convencional”, aponta o engenheiro agrônomo e professor do curso de Zootecnia, Humberto Maciel Madeira, acrescentando que o primeiro chega a ser mais seguro do que o segundo. Para ele, o medo que tomou conta da população européia, por exemplo, tem muito mais a ver com a questão econômica do que com a saúde ou o meio ambiente. “É uma forma de proteger o mercado”, acredita.

Rotulagem

Sobre a necessidade de rotular produtos transgênicos, cada qual tem uma posição diferente. “O melhor caminho é a rotulagem. O consumidor tem o direito de escolher se quer consumir um produto transgênico ou não”, aponta a professora Elaine Berges. “A legislação exige, mas a indústria não vai querer”, suspeita a engenheira de alimentos Cínthia Spricigo. Para ela, as vendas de trangênicos deverão despencar caso haja identificação no rótulo. Para Humberto Madeira, não há necessidade de rotulagem, desde que se comprove que o alimento é seguro.

Quanto aos benefícios (ou malefícios) dos transgênicos, Cínthia é taxativa: “Para a indústria de alimentos ainda não apareceram pontos positivos. Não houve redução de custos nem aumento do valor nutritivo”. (Lyrian Saiki)

Voltar ao topo