Depois de pedir a falência da Lojas Leader, do BTG Pactual, a família Furlan, fundadora da rede Seller, planeja cobrar cerca de R$ 140 milhões na Justiça diretamente do banco, em crise de confiança desde a prisão de seu ex-controlador André Esteves, apurou o ‘Broadcast’, serviço em tempo real da ‘Agência Estado’. Essa cobrança refere-se ao pagamento ainda devido pela venda da Seller para a Leader em 2013.

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A família Furlan, que fez o pedido de falência da varejista após o atraso do pagamento de uma parcela em dezembro do ano passado, agora quer cobrar do BTG, que controla a rede, o restante do pagamento, já que o referido atraso teria provocado vencimento antecipado do saldo do contrato. Segundo fontes, o valor seria de R$ 150 milhões, ou cerca de R$ 140 milhões se considerado o valor já depositado em juízo pela Leader após o pedido de falência, de pouco mais de R$ 7 milhões, ainda de acordo com fonte.

O entendimento dos fundadores da Seller é de que o endividamento da Leader acabou provocando a deterioração das garantias previstas em contrato. Isso porque, explicam fontes, o BTG, em vez de injetar dinheiro na companhia por meio, por exemplo, de um aumento de capital, ampliou a dívida da empresa. Segundo fontes, dessa forma, a empresa foi subcapitalizada, ou seja, ela não possui capital social suficiente que sirva de garantia aos credores, já que passou a existir um descompasso entre o patrimônio e sua dívida. Isso, no caso da Leader, teria ocorrido porque os sócios emprestaram dinheiro à empresa, tornando-se, dessa forma, também credores.

Logo após os fundadores da Seller realizarem o pedido de falência da Leader, o BTG informou ao mercado que a Leader já discutia os valores pleiteados pelos antigos donos da Seller, “em virtude, dentre outros motivos, de inconformidades patrimoniais e contábeis da Seller que foram verificadas na conclusão do negócio”. Em contestação na Justiça, a Seller afirmou que tal alegação foi feita apenas depois da cobrança do crédito, de forma a justificar a inadimplência.

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Uma fonte próxima do BTG afirmou, no entanto, que o contrato de venda da Seller para a Leader previa o mecanismo de arbitragem e que, diante da falta de consenso em relação ao valor devido, por conta de tais “inconformidades”, esse deve ser o caminho a ser seguido. A mesma fonte disse que está sendo formada a arbitragem.

Do valor total de R$ 520 milhões do contrato de venda da Seller, restava no início de 2014 um montante de R$ 170 milhões que deveria ser pago em cinco parcelas anuais a partir de novembro daquele ano, conforme previsto em contrato. Só uma dessas cinco parcelas, porém, foi paga em dia e, segundo as fontes, depois disso começaram os atrasos.

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Os prazos chegaram a ser adiados por cinco vezes, dizem as fontes. O vencimento de novembro de 2015 foi postergado até ser definido um aditivo de contrato. Nele ficou estabelecido que essa fatia seria dividida entre os meses de novembro de 2015 a maio de 2016 – os demais prazos nos anos seguintes foram mantidos. A primeira parte, de novembro, foi paga, mas a de dezembro, assim como a de janeiro, não teve pagamento.

Essa foi a razão, inclusive, de os fundadores da Seller pedirem a falência da Leader no final do ano passado. Com essa inadimplência, a família Furlan pede antecipação das demais parcelas, sendo que originalmente a última delas teria vencimento apenas em novembro de 2018. No total, assim, cobra-se cerca de R$ 150 milhões.

Plano frustrado

O BTG queria transformar a Leader numa plataforma de consolidação do setor varejista. A incorporação da Seller marcava esse objetivo, mas, assim como ocorreu com outra aposta do banco no setor de varejo, a Brasil Pharma, dificuldades na integração das redes levaram à deterioração de resultados operacionais, agravados em meio à retração do consumo no Brasil. Na contramão, a dívida foi crescendo para financiar esse objetivo de expansão. Aliado ao alto endividamento, o cenário de venda fraca pressionou o caixa da empresa.

A crise da Leader se evidenciou em meio ao processo de venda de ativos pelo BTG iniciado após a prisão de Esteves, em novembro. Mas a venda da varejista é dificultada justamente pela sua crítica situação financeira. Reportagem do Estado apurou que o Ebitda projetado pelo banco para o negócio em 2015 seria de R$ 37 milhões, enquanto o endividamento superara a marca de R$ 1 bilhão.

O BTG chegou a contratar a consultoria do executivo Enéas Pestana, ex-Grupo Pão de Açúcar (GPA), para reestruturar a empresa. O trabalho, porém, se encerrou no final de 2015.

Além da Leader, outras empresas do portfólio do BTG têm o próprio banco entre os principais credores. Um exemplo é a Brasil Pharma, que recentemente realizou uma emissão de ações com esforços restritos, com o BTG investindo o correspondente a R$ 400 milhões, sem nenhum outro investidor interessado. Com isso, a instituição financeira viu sua fatia na rede de farmácia aumentar de cerca de 40% para 96%.

Com o dinheiro que foi para o caixa da Brasil Pharma, a empresa pagou antecipadamente debêntures que estavam nas mãos do próprio BTG. Agora, a empresa renegocia, conforme admite em seu formulário de referência, R$ 355 milhões relativos a empréstimos de capital de giro e financiamento com os principais credores.

BTG Pactual e Leader não comentaram. As informações são do jornal O Estado de S.Paulo.