Briga com o Rio põe em risco o ajuste fiscal

A briga aberta pelo Rio de Janeiro com o governo federal em torno da sua dívida poderá custar caro aos cofres do estado ou pôr em risco o ajuste fiscal do país. Caso o Rio seja derrotado, basta que o Tesouro Nacional cumpra à risca os termos do contrato de renegociação da dívida firmado em 1999, para o estado ter de desembolsar um adicional de R$ 16 milhões para honrar seus compromissos ainda este mês.

Se a Justiça, no entanto, mantiver a decisão favorável ao Rio, desbloqueando os R$ 86 milhões da arrecadação com o ICMS, abrirá precedente para que outros estados façam a mesma reivindicação, o que poderá levar a uma perda estimada em R$ 10 bilhões por ano no superávit primário do país.

Segunda-feira termina o prazo para que o estado apresente ao Supremo Tribunal Federal (STF) sua justificativa para o não-pagamento da parcela da dívida. Com base nessa documentação, o tribunal julgará o recurso da Advocacia Geral da União (AGU) pedindo a cassação da liminar que desbloqueou os recursos do estado retidos pela União para o pagamento da dívida. Caso a liminar seja confirmada, outros 22 estados e 182 municípios que refinanciaram seus débitos poderão pedir na Justiça a suspensão de seus pagamentos.

? A partir dessa decisão, se confirmada, será praticamente impossível obrigar os estados a honrarem seus compromissos com a União ? diz o ex-presidente do Banco Central Gustavo Loyola.

Os R$ 16 milhões a mais que podem ser cobrados do Rio correspondem à multa de 2% aplicada aos R$ 86 milhões que o estado não pagou em dezembro mais a sucumbência (honorários advocatícios fixados pelo juiz). A punição está prevista no contrato e poderá ser cobrada ou não pela União, conforme decisão política.

A equipe econômica está correndo contra o tempo para evitar que outros estados, como, por exemplo, Espírito Santo, Rio Grande do Sul, Minas Gerais, Paraná e Mato Grosso, sigam o caminho do Rio.

Sem esse dinheiro que pinga todos os meses nos cofres da União ficará ainda mais difícil cumprir a meta com o Fundo Monetário Internacional (FMI) de superávit primário de 3,75% do PIB este ano. Desta meta, 2,8% são de responsabilidade da União e das empresas estatais. Outros 0,95% precisam vir de estados e municípios.

O ministro da Fazenda, Antonio Palocci, diz que não vai virar as costas para os estados, mas garante que não pretende mudar os contratos já firmados. Se a União perder esses recursos terá de fazer um esforço fiscal ainda maior, sendo inevitável cortar ainda mais o orçamento ou aumentar impostos.

? Mudar os contratos é inimaginável ? disse Palocci.

Ele afirma que a solução tem de ser a mesma para todos os estados. E disse que aqueles em situação mais delicada devem fazer um esforço fiscal maior para resolver o problema:

? Nos estados em maior dificuldade é preciso um esforço fiscal suplementar. A União tem disposição de ajudar integrando os estados nas reformas da Previdência e tributária, necessárias para o ajuste das contas da União e dos estados.

As regras do acordo firmado com o Rio, assinado pelo então governador Anthony Garotinho e aprovado pela Assembléia Legislativa em 1999, são claras. Em caso de não-pagamento das parcelas da dívida, as garantias (recursos arrecadados com o ICMS) devem ser transferidas em caráter irrevogável para o Tesouro.

Se não tiver recursos suficientes na conta, o estado terá de pagar o que deve no mês seguinte, quando também será punido com o recolhimento de uma parcela de 17% de suas receitas líquidas correntes, em lugar dos 13% previstos inicialmente. Além disso, o índice de correção da dívida pode mudar do IGP-DI para a Selic.

Uma das alternativas discutidas pelo governo do Rio para fazer caixa, que deve ser levada ao Tesouro nos próximos dias, é a emissão de títulos com a garantia dos “royalties” do petróleo a serem arrecadados. Só que, pelo contrato de renegociação da dívida, os governos estaduais estão proibidos de emitir qualquer tipo de títulos ao mercado.

? Mais lamentável ainda é que a liminar tenha sido dada no caso do Rio, que se notabilizou, nos últimos anos, pela sofrível gestão fiscal, mesmo com as polpudas receitas de “royalties” da exploração petrolífera ? comentou o ex-ministro da Fazenda Mailson da Nóbrega.

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