Gyorgy primeiro recebeu do chefe a notícia de que seu salário seria cortado. Meses depois, foi demitido. Apostava que suas economias o permitiriam aguentar até encontrar um novo emprego. Dois anos depois, passou a usar o dinheiro que tinha guardado num colchão e que, no início da crise em 2009, ele manteve num lugar secreto e destinado apenas a emergências. Agora, o dinheiro do colchão também acabou. Sete anos depois da eclosão de sua pior crise financeira, a Grécia volta a ser alvo de um debate na Europa, com novos cortes de gastos e negociações de resgates. Mas o que era uma recessão se transformou em uma depressão e, hoje, se traduz em pobreza para parte da população.

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Os mais de 300 bilhões de euros injetados na economia local foram destinados a salvar bancos e permitir que a administração pública pudesse continuar a operar. Mas esse empréstimo envolveu condicionalidades, entre elas cortes profundos, o que acabou afetando a vida de milhares de famílias.

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Dentro do governo grego, economistas não disfarçam: o país pode ter de esperar até 2050 para voltar aos mesmos níveis de desenvolvimento social que estava em 2008. “Fala-se muito em outras regiões do mundo em década perdida. Na Grécia, o que temos são gerações perdidas”, disse ao Estado o economista Daniel Munevar, que trabalhou ao lado do ex-ministro de Finanças do país, Yanis Varufakis. “Estamos na parte mais complicada de toda a crise e o pior é que não existe uma resposta coerente”.

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Na avaliação do economista que foi chamado para desenhar um plano para o país, as reuniões com o FMI mostraram que a própria entidade acabou reconhecendo que havia “passado do ponto” nas exigências de austeridade. “A Grécia vive hoje a pior crise dos tempos modernos para um país desenvolvido. O FMI já entendeu isso. Mas a UE não”, afirmou.

Dados de diversos institutos de pesquisa de Atenas e do restante da Europa revelam que as taxas de pobreza na sociedade grega avançam no ritmo mais elevado em toda a UE. Gyorgy, num refeitório de uma Igreja no centro de Atenas, é apenas mais um que vivia uma vida relativamente confortável e que, hoje, precisam pedir ajuda. “É uma grande humilhação”, disse, pedindo para que sua foto não fosse feita. “É muito humilhante”, insistia.

Oportunidades. O desemprego, que chegou a 28%, hoje está em 23%. Mas a queda não ocorreu por conta da criação de postos de trabalho. Muitos simplesmente deixaram de buscar empregos e saíram dos indicadores de desempregados. No total, o PIB grego já perdeu 25% de seu tamanho desde 2009 e 75% das famílias viram uma redução em sua renda. Mas é pelas ruas de Atenas que a crise é visível. À noite, são centenas de pessoas dormindo nas ruas, enquanto voluntários percorrem a cidade com cobertores e até máquinas de lavar roupa para ajudar “a manter a dignidade”.

Um desses serviços é o Ithaca, um grupo de voluntários que se uniram para ajudar a população mais necessitada. Num furgão, ele leva duas máquinas de lavar roupa e, duas vezes por semana, visita os locais mais pobres da capital grega. Ao Estado, o fundador do grupo, Fanis Tsonas, contou que decidiu agir por não suportar pensar que a crise havia transformado a vida de muitos de sua cidade. “Eu era estudante quando começamos isso”, disse. “Uma roupa limpa é uma questão de autoestima, de ajudar a que possam ter autoconfiança para reagir”, disse. Sua entidade estima que 17,7 mil pessoas em Atenas estão desabrigadas. Dessas, 1,5 mil vivem pelas ruas. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.