Desenterrando Daniel

Falando em nome da família do prefeito assassinado de Santo André, Celso Daniel, do PT, seu irmão, o médico João Francisco Daniel, pediu a reabertura do inquérito. O caso era dado como encerrado com a prisão de criminosos comuns, habitantes de uma favela da Grande São Paulo, que teriam se equivocado sobre o alvo de seu crime, imaginando que se tratava de um grande empresário. E, ao descobrirem o erro, o mataram. O crime, que se sucedeu ao assassinato ainda não esclarecido do prefeito petista de Campinas e o fato de surgirem diversas ameaças contra correligionários de Lula, fez com que a cúpula do Partido dos Trabalhadores suspeitasse que se tratavam de crimes políticos. Essa suspeita foi reforçada com o surgimento de uma suposta organização, ao estilo das Farc da Colômbia, agindo contra os membros da facção “light” do PT.

O PT chegou a indicar um deputado e advogado de seus quadros, Luiz Eduardo Greenhalgh, para acompanhar as investigações e a pedir ao presidente Fernando Henrique Cardoso rigor absoluto nas gestões para esclarecimento dos casos. Quando tudo parecia esclarecido, um crime comum e não um crime político, a história volta à tona em nova e escabrosa versão.

O irmão do prefeito assassinado, João Francisco Daniel, denunciou extorsão por parte de elementos da Prefeitura de Santo André e a ela ligados, inclusive no tempo de Celso Daniel, contra empresas de transporte coletivo. O dinheiro arrecadado iria para as campanhas do PT, inclusive a nacional, envolvendo até a presidência do partido.

Oito promotores investigam o caso e o consideram com fortes indícios de que crimes foram perpetrados. Os depoimentos, no Ministério Público e numa CPI instaurada a nível municipal, se contradizem. Empresários dizem que foram alvo de extorsão. Outros negam e as investigações se alastram, revelando outros negócios suspeitos com aquela e outras prefeituras. Ninguém diz claramente, mas por detrás do pedido de João Francisco Daniel parece haver a suspeita de que o assassinato do prefeito petista liga-se aos casos de extorsão. Uma situação muito constrangedora para o PT, que muitos de seus líderes e envolvidos não têm sido capazes de administrar. Alguns reclamam sigilo nas investigações; outros vêem armação e poucos admitem que há algo de podre naquela região da Grande São Paulo. Age corretamente Lula. O candidato petista a presidente da República aceita que tudo seja investigado até o fim e que os responsáveis sejam punidos, mesmo sendo seus correligionários.

Do episódio surgiu ainda mais uma denúncia. A de que a Polícia Federal, com autorização judicial para fazer escutas telefônicas a fim de elucidar casos de tráfico de entorpecentes, teria grampeado aparelhos de petistas. E que, desde tempos pretéritos, grampeava o telefone do próprio Lula. O grampo (exceto o contra Lula) é confesso e judicialmente autorizado. O motivo alegado, investigação de tráfego de entorpecentes, é que seria enganação. Ficou provado, inclusive, que o próprio PT, em sua ânsia de ver esclarecidos os assassinatos de dois de seus prefeitos, pediu ao governo a instalação de grampos telefônicos.

Essa confusão toda recomenda a reabertura do caso Celso Daniel, como pedem seus familiares. Existem muitas versões sobre cada episódio da novela e é hora da busca definitiva da verdade, doa a quem doer. Estamos com um cadáver, muitas versões e inúmeros suspeitos. Inclusive a vítima.

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