A aprovação de projetos que aumentam as penas de prisão e dificultam o acesso do preso à liberdade provisória, combinada com mais um adiamento da votação das propostas para dar agilidade ao Código de Processo Penal, pode levar o país ao agravamento do problema já existente da superpopulação carcerária. O alerta foi feito ontem por deputados envolvidos na discussão do pacote de segurança montado depois da morte bárbara do menino João Hélio Fernandes.

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"É preciso investimento no sistema prisional, do contrário não adianta nada endurecer a pena", afirmou o deputado Pepe Vargas (PT-RS) em discurso no plenário. O parlamentar chamou atenção para o risco se agravar mais ainda na hipótese de aprovação da redução da maioridade penal de 18 para 16 anos, o que levaria para as cadeias os jovens infratores que nesta quinta-feira (15) cumprem pena de internação em locais específicos para crianças e adolescentes. "Só vai aumentar o número de presos. Vai colocar na cadeia o jovem que cometeu crime contra o patrimônio e aumentar a população prisional. É preciso prudência neste momento", disse Vargas. O País tem hoje 300 mil presos.

Em dois dias, os deputados aprovaram no pacote de segurança dois projetos que tendem manter os presos por mais tempo em regime fechado. O primeiro é o que aumenta o período de prisão em regime fechado antes de o preso condenado por crime hediondo pedir o benefício do regime semi-aberto. O projeto passa o tempo mínimo de 1/6 (16,6%) para 2/5 (40%) da pena, no caso de réus primários, e 3/5 (60%) para reincidentes. O segundo projeto, aprovado ontem, dobra a pena de formação de quadrilha, quando houver menores envolvidos, e prevê agravamento da punição, a ser definida pelo juiz, para os adultos que praticarem qualquer tipo de ação delituosa usando crianças ou adolescentes como comparsas.

Agravamento

Autor da emenda que ampliou o agravamento das penas, o deputado Flávio Dino, ex-presidente da Associação de Juízes Federais do Brasil, concorda que haverá menos presos com direito a ir para a rua, se os projetos forem aprovados no Senado e sancionados pelo presidente da República. Mas lembra que os punidos são os que cometem crimes graves e que, portanto, devem estar na cadeia.

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"Haverá um efeito a médio prazo, se não houver mudança de cultura das penas alternativas", diz o deputado. Para Dino, é preciso estimular a aplicação de penas que não implicam na reclusão do condenado, no caso de até quatro anos de condenação. "As cadeias têm muitos presos condenados a dois ou três anos que não deviam estar lá. Mas as penas alternativas ainda são muito pouco utilizadas", diz o deputado.

Ontem, quando decidiram os projetos prioritários para votação no pacote de segurança, os líderes partidários deixaram de lado as sete propostas que tramitam na Câmara desde 2001 e promovem uma revolução no Código de Processo Penal. O objetivo é dar agilidade aos processos. É verdade que processos mais ágeis implicam em condenações mais rápidas, e portanto mais presos nas cadeias, mas também podem apressar a liberdade de presos provisórios que, ao fim do processo, são inocentados ou recebem penas mais brandas.

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Enviado pelo Poder Executivo em 2001, o pacote de reforma do Código de Processo Penal é polêmico, mas tem pontos que, sem dúvida, diminuiriam o tempo de tramitação do processo. Entre os pontos de avanço, estão a limitação das possibilidades de adiamento de julgamentos, que passam a poder ser feitos até mesmo sem a presença do réu.

Outra mudança é a que permite a realização de uma única audiência para interrogatório do acusado e para ouvir testemunhas de acusação e defesa. Hoje, é necessária uma audiência específica para ouvir o réu. Outra sugestão contra a morosidade, mas muito controversa, é a de extinção do instrumento "protesto por novo júri" que dá direito ao réu condenado a mais de 20 anos de prisão a pedir um novo julgamento. Pela proposta, o recurso só poderá ser pedido se houver algum equívoco comprovado no processo ou na sentença.