Da distinção dos institutos da prescrição e da decadência no novo código civil brasileiro

Questão polêmica é a referente à diversificação dos institutos da decadência e da prescrição. As controvérsias continuam abertas e não são raras as dúvidas sobre se um determinado prazo é deste ou daquele meio jurídico (1). Em vista disso, o legislador do novo código civil, Lei 10.406 de 2002, escolheu uma forma prática para diferenciação de ambos.

Na doutrina, a maneira mais usual de distinguir os dois institutos é a que diz respeito à origem da ação. Na prescrição, a ação surge no momento no qual o direito subjetivo de alguém foi violado. Na decadência, juntamente com o direito. Por isso, a maioria dos doutrinadores proferem que, com a prescrição, se perde a ação e não o direito e, com a decadência, o próprio direito. Por exemplo, prescreve em um ano a ação do segurado contra o segurador, ou deste contra aquele (CC, art. 206, parágrafo primeiro, inciso I), ou seja, a ação de um contra o outro, após a violação do direito, se consuma em um ano. Já, no art. 178, discorre que decai, em quatro anos, o direito de pleitear a anulação do negócio ilícito anulável, quer dizer, o direito de pedir anulação de um ato jurídico eivado de vício de consentimento (observe que a ação de anulação surgiu junto com o direito) caduca em 48 meses.

A respeito de tal operacionalidade, Carlos Roberto Gonçalves profere: Para distinguir prescrição de decadência, o novo código civil optou por uma fórmula que espanca qualquer dúvida. Prazos de prescrição são, apenas e exclusivamente, os taxativamente discriminados na Parte Geral, nos arts. 205 (regra geral) e 206 (regras especiais), sendo de decadência todos os demais, estabelecidos como complemento de cada artigo que rege a matéria, tanto na Parte Geral como na Especial (2). Com isso, o legislador preferiu uma forma segura de diversificação desses institutos.

Além disso, adotou-se a tese da pretensão, por ser considerada a mais condizente com o direito processual moderno (3). Preceitua o art. 189 que violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual se extingue pela prescrição nos prazos a que aludem os arts. 205 e 206, ou seja, infringido o direito pessoal ou real surge a pretensão (ação material) contra o sujeito passivo, com a recusa deste em atender a pretensão, nasce a ação processual, com a qual se provoca a intervenção estatal, a qual prescreverá se o interessado não a mover (4). Na decadência, não há a pretensão, a qual é uma característica da prescrição, pois nela (na decadência) inexiste uma ofensa a um direito que requer uma prestação, mas sim a um direito potestativo, o qual é um estado de sujeição de uma pessoa a outra e sobre o qual influi a decadência, quando expressamente declarada por lei.

O novo código civil ainda diferenciou ambos institutos em algumas disposições legais. Por exemplo, a decadência resultante de um prazo legal não pode ser renunciada pelas partes (art. 209), enquanto que prescrição, após a sua consumação, pode ser pelo prescribente (art. 191). Na prescrição, não há a permissão legal de o juiz aplicá-la ex officio (art. 194), já na decadência, o juiz deve de ofício (art. 210). Ademais, a decadência corre contra todos sem suspensão ou interrupção, salvo disposição em contrário (art. 207), mas a prescrição pode ser interrompida ou suspensa em várias hipóteses. Dito isso, percebe-se que há um interesse social maior no instituto da decadência do que no da prescrição.

Por conseguinte, devido à dificuldade de diversificá-los, o novo código civil distinguiu operacionalmente os institutos da prescrição e da decadência, porquanto a tese da pretensão foi adotada e agrupou os prazos daquele em uma só seção da Parte Geral, sendo que o restante são deste.

Notas

(1) Rodrigues, Silvio. Direito Civil, Parte Geral. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 330.

(2) Gonçalves, Carlos Roberto. Direito Civil, Parte Geral. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 180.

(3) Gonçalves, Carlos Roberto. Direito Civil, Parte Geral. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 197.

(4) Diniz, Maria Helena. Direito Civil: Teoria Geral do Direito Civil. São Paulo: Saraiva 2002, p. 337.l

Paulo Campos dos Santos

é acadêmico em Ciências Jurídicas pela Universidade Estadual do Paraná, Campus Jacarezinho-PR.
paulo-campos@bol.com.br

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