Curitiba não sabe quantos cachorros e gatos de rua existem na cidade. Além de atrapalhar na criação de políticas públicas para os animais, a ausência desse dado prejudica também o planejamento de ações em prol da saúde humana. Isso porque, só nos últimos 30 anos, cerca de 75% das novas doenças humanas infecciosas são zoonoses, ou seja, transmitidas através dos animais. Por isso, veterinários e protetores da capital defendem a criação de um censo fiel dos animais domésticos da cidade.

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Os dados são de um estudo desenvolvido por pesquisadores da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG) e da Universidade Federal do Paraná (UFPR). Entre eles, o médico veterinário Alexander Biondo, professor da UFPR e especialista em zoonoses, que defende a inclusão de animais domésticos no censo 2020 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

“Sabendo quantos animais domiciliados existem, é possível determinar a quantidade de animais de rua. Sem esse número, não tem como saber se qualquer uma das medidas de proteção animal está funcionando”, explica Biondo.

Foto: Arquivo.

A castração e microchipagem, duas das políticas públicas mais conhecidas da cidade, são feitas com base em estimativas imprecisas, de acordo com o veterinário. “O número usado hoje é praticamente um chute, não foi feito com nenhuma metodologia concreta”, esclarece. Isso significa que as ações não conseguem ser mensuradas e, consequentemente, planejadas com exatidão.

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Uma prévia do que poderia vir a ser o censo integral foi feita pelo IBGE em 2013, quando o questionário em saúde incluiu três perguntas sobre animais de companhia. Ainda assim, não foi suficiente. “Precisamos de um censo integral e nacional, o que podemos conseguir apenas incluindo a pergunta sobre quantidade de animais as pessoas têm em casa”, defende Biondo.

Outra defensora da quantificação de animais domésticos é a também médica veterinária Vivien Midori Morikawa, chefe da Rede de Proteção Animal da prefeitura de Curitiba. “Essa ideia é muito boa, com certeza nós conseguiríamos melhorar a eficácia das políticas públicas para animais de rua”, conta.

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De acordo com Vivien, o problema maior dos métodos atuais de mensuração é que não representam as particularidades de cada estado, cidade e bairro. Ao invés disso, são feitos a partir de uma proporção indicada pela Organização Mundial da Saúde (OMS), que estima que existem sete pessoas para cada cão em países em desenvolvimento, como o Brasil.

“Em Curitiba, cada área tem uma quantidade diferente de cachorros de rua”, analisa a coordenadora. Além de incluir os animais no censo do IBGE, outra alternativa seria criar um censo próprio da cidade. “Precisamos definir uma estratégia para isso, quem sabe com a ajuda da universidade e dos agentes comunitários de saúde, se eles concordassem”, sugere Vivien.

Foto: Átila Alberti

Questão de saúde

Apesar de muitos cães serem vistos nas ruas da cidade, Biondo explica que a maioria deles não é considerado cachorro de rua. “Cachorro de rua é aquele animal sarnento, que rasga saco de lixo procurando comida e anda com o rabo entre as pernas”, descreve. Conforme o professor, muitos dos animais que se encontram nas vias públicas são os chamados “semi-domiciliados”, ou seja, recebem comida e cuidados mas não são abrigados nas residências.

Justamente tirar esses animais das ruas é um dos principais passos para melhorar a saúde e diminuir a reprodução excessiva, segundo a coordenadora da Rede de Proteção Animal. “Fazemos um trabalho de conscientização para a guarda responsável, que mostra a importância de não abandonar animais e manter eles em casa”, explica. Além disso, Vivien destaca que a saúde pública deve ser pensada de maneira integrada: “É o conceito chamado de saúde única, que leva em conta que todos os elementos da sociedade devem estar saudáveis”. Para continuar esse trabalho, a veterinária explica que um censo de animais que moram na rua seria fundamental.