Crise política brasileira e solução eleitoral (I)

Os liberais, neoliberais, PSDB, PFL et coetera, impuseram ao Brasil um Estado mínimo, vendendo empresas estratégicas, fundamentais para quem planejasse uma política nacional independente e uma economia política auto-sustentada; e loteando espaços e funções públicos, enquanto articulavam o País com as aventuras de monopólios e cartéis internacionais.

O estrago foi enorme e seus remendos legais deletérios recortaram o tecido do poder público, pondo-o ao dispor e talante do poder privado e das contas CC5.

Esse Estado mínimo enquanto poder público, e que ficou maior enquanto ação privada e privatizante, continua a ser defendido por liberais, neoliberais, cardosobobos e, agora também, por neobobos (como os caracterizava o mandarinete Fernando Henrique Cardoso (o sábio neo-Planglos).

Nos rescaldos das eleições que levaram o PT ao governo brasileiro e à direção administrativa e burocrática governamental, o fato é que o governo compartilha o poder com o sistema financeiro nacional e mundial; com os novos agentes de serviços públicos irregulados em agências reguladoras modeladas com neoliberalismo; com a UDR; com os exportadores (e também sem controle nem mando sobre estoques especulativos de alimentos e insumos essenciais para livre comércio); com os importadores; com a burocracia douta e funcionalista do sistema de governo. Compartilha a direção administrativa do Estado, mas não detém o poder político, econômico, cultural e de comunicação social! Em tal emaranhado de interesses e pressões, socialistas de diferente extração doutrinária, ideológica, emoção e simpatia decidiram manter esse Estado agravado pelo “serviço das dívidas” e repleto de servidores fiéis às funções públicas atuais e futuras.

Em vez de “O Estado sou Eu” (como o Rei Sol e o sátrapa FHC diziam) gritam: “O Estado somos Nós”. Aí algum humorista poderia satirizar essa conjunção da má-fé com a ignorância letrada, chamando-a de “Pororoca Nacional”.

Espremidinho

Com seriedade e rigor, podemos dizer que a política brasileira vive hoje um espremidinho, ou uma entaladela, pois as reformas postas pelo governo do PT são pré-condição necessária à reorganização do Estado. Todavia, com ela, a direção e os caminhos – políticos, econômicos, sociais – deverão ser encontrados, apontados e concretizados em programas e ações. Nada, entretanto, está e estará perfeitamente configurado, e durante a operação pode dar um “bug”!

Como se afirma, “a luta é… a luta continua”!

A sociedade do espetáculo está apresentando em televisão, rádio, jornais e revistas o cotidiano político das pretendidas reformas para regenerar e recapacitar o Estado brasileiro. As reformas previdenciária, tributária e especialmente a agrária são hoje o objeto visível das mudanças de que nos alertava a campanha eleitoral, em que o povo brasileiro acabou decidindo substituir o mandarim do liberalismo “social” Fernando Henrique Cardoso, pelo operário-sindicalista Luiz Inácio Lula da Silva.

Ah! Brasil! Como se não nos bastassem os exóticos nomes dados a partidos, que na maioria dos casos não se identificam com seus nominativos conceitos, os setores políticos e culturais que se apresentam vinculados à classe trabalhadora, e dela se creditam representativos com a designação de “esquerda”, querem um “Estado forte”, porém na condição de formar e/ou aperfeiçoar na burocracia de Estado o seu consórcio com o governo: condições especiais de trabalho e vida para os funcionários do Executivo, Judiciário e Legislativo.

Essa demanda política que até se explicava e, mesmo, justificava ante a ameaça – escondida sob a propaganda de um “nacionalismo” golpista em 1964 – de privatização do Estado, asfixiado e dilacerado desde a ditadura militar, hoje apenas revela equívocos keynesianos e intenções “meritocráticas” ou simplesmente nomenklaturistas entre os agentes sociais.

A Nomenklatura

E de repente as funções públicas passam a ser colocadas na cena política como se fossem direitos das pessoas que as ocupam na sua pessoalidade e transitoriedade; e assim se vai exigindo que a sociedade inteira se dispa para vestir uma nomenklatura (1). Tudo com o pretexto eloqüente de que algumas categorias profissionais e em dedicação exclusiva à função pública devem ser gratificadas com prebendas e estipêndios em um Estado em inanição.

A meia-verdade salta evidente: o agente de segurança pública, o juiz, o promotor e o defensor públicos, o diplomata, os funcionários estatais submetidos a exaustão, risco e periculosidade em ação, etc. devem ter “retribuição adequada” (2), mas não na condição de agentes do primeiro mundo a orientar, educar e modelar os excluídos (que são do terceiro mundo), para lograr a sua ascendência social e confraternização civilizatória com aqueles que estão chegando ao segundo mundo (dentro das funções sociais públicas e/ou público-privadas).

1 Nomenklatura = funcionário estatal russo; depois, burocrata soviético.

2 O tema “salário justo” apresenta três dificuldades: numa economia capitalista, é um simples preço de mercado; numa economia socialista, seria salário básico de bem-estar adicionado de parcelas proporcionais pelo valor social da produção realizada, ou o seu “correspondente direito” arbitrado por consenso sindical-estatal; na economia comunista, salário comum a todos, de bem-estar de vida, e avanços de vantagens através e pela participação nas interações econômicas, sociais e culturais.

* Walmor Marcelino é jornalista.

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