Contra a recessão

Na medicina, o procedimento fundamental é o diagnóstico. Quando correto e feito no tempo certo, propicia terapêutica adequada e possibilidades amplas e concretas de cura. A analogia é perfeita quando se trata de identificar as causas reais dos problemas da economia e/ou das empresas de um ou mais segmentos. É o caso do fenômeno verificado de forma genérica na chamada cadeia produtiva da comunicação gráfica, na qual interagem importantes setores de atividades, como jornais e revistas, livros, indústria gráfica, fabricantes de papel, tintas e outros insumos, e publicidade e propaganda.

Para ilustrar a questão, é pertinente, neste momento em que o País comemora o Dia da Imprensa (10 de setembro), analisar uma tendência preocupante: estudo da Associação Nacional de Jornais (ANJ) demonstra que a circulação de diários caiu 9,1% em 2002. É o segundo ano consecutivo de declínio, após os 2,7% negativos registrados em 2001. Os dados são coerentes com os índices de leitura do mercado livreiro (menos de dois exemplares por habitante/ano) e as estatísticas da Associação Brasileira da Indústria Gráfica (Abigraf), que indicam quedas consecutivas dos faturamentos nos dois últimos exercícios (US$ 6,2 bilhões no ano 2000; US$ 5,28 bilhões em 2001, e US$ 4,42 bilhões em 2002).

São numerosas as análises que atribuem a retração desses mercados ao advento e avanço das mídias eletrônicas, em especial a internet. Grave erro de diagnóstico, evidenciando o risco de tornar mais penosos, demorados e complexos o tratamento e cura dos setores incluídos na cadeia produtiva da comunicação gráfica. Este recorte limitado e simplista do cabedal de problemas não se justifica. É como se não vivêssemos um processo prolongado de retração da economia; é como se o Brasil não tivesse apenas cerca de cinco milhões de usuários da web; é como se o desemprego não existisse.

Somam-se aos problemas conjunturais agudos da economia algumas endemias sociais, como o índice conjunto (oficial, é importante frisar) de analfabetismo pleno e funcional, simplesmente assustador: 44,7% dos brasileiros, em termos práticos, não lêem e, portanto, não consomem itens da comunicação impressa. Além disso, o baixo poder aquisitivo de grande parcela da população, inclusive a alfabetizada, torna inviável para numerosas famílias, em momentos de retração, desemprego e queda da renda e dos salários, a compra de livros, jornais, revistas. Considerando-se a economia de escala, entende-se facilmente como a exclusão social, falta de cultura, juros altos, escassez de crédito, baixa liquidez e prolongada política monetária muito rígida interpõem-se como reais obstáculos à expansão do mercado.

Assim, é fundamental deslocar para o eixo correto a análise relativa às causas que conspiram, no Brasil, contra a cadeia produtiva gráfica, hoje ainda responsável por 70% da comunicação em todo o mundo. Somente em 2010 as mídias eletrônicas (numa proporção de 51% contra 49%) a ultrapassarão. Entretanto, a expansão estimada do mercado propiciará expressivo crescimento nominal da demanda da comunicação impressa. É o que demonstra estudo aprofundado do maior fabricante mundial de máquinas e equipamentos gráficos, referente ao mercado mundial.

A tendência positiva incluirá nosso País? A interrogação torna muito clara a necessidade de diagnosticar de forma correta e objetiva os problemas reais do mercado. Isto vale, numa visão ampliada da economia nacional, para todos os setores de atividades. Afinal, o epicentro do sismo que os abala é o mesmo. A desventura em comum suscita engajamento mais firme e persistente – inclusive no sentido de sensibilizar as autoridades econômicas – numa cruzada terapêutica para curar da recessão este paciente gigante chamado Brasil.

Alfried Karl Plöger é presidente da Abigraf regional São Paulo e da Associação Brasileira de Companhias Abertas (Abrasca).

Voltar ao topo