Confiteor de Lula

A sociedade brasileira está aceitando melhor o Lula destas eleições do que aquele dos pleitos passados, quando por três vezes foi derrotado. Embora sua posição nas pesquisas seja ascendente e em muito se distancie dos demais candidatos, ainda é cedo para prognosticar uma vitória. Mas tempo suficiente para acreditar que ela é possível, até provável. Vários são os fatores do atual sucesso do presidente de honra do Partido dos Trabalhadores. Um deles, o principal, é sua nova imagem de político mais ponderado do que o Lula das eleições perdidas. Além de apresentar uma imagem bem trabalhada pelos marqueteiros, Lula vem fazendo um confiteor em que procura se redimir de erros e equívocos passados.

Sobre o Plano Real, por exemplo, que apresentou como um engodo visando eleger Fernando Henrique Cardoso, confessa que errou, dizendo que nesses doze últimos anos muito aprendeu. E agora apóia o plano que levou a moeda brasileira à estabilidade.

Sobre o Fundo Monetário Internacional, que ele e seu partido sempre combateram como se fosse uma maléfica instituição norte-americana a estrangular economias como a brasileira, em benefício do imperialismo, agora reconhece que se trata, de fato, de uma instituição multinacional, da qual o Brasil é um dos muitos sócios. Os Estados Unidos são país-sede e não donos do FMI. E, como sócio, o nosso país tem direito de solicitar empréstimos. Os acordos com aquela instituição, o Lula de hoje, que não é o mesmo que há não muito tempo apoiou um plebiscito sobre a sua almejada moratória, promete cumpri-los, embora considere que nos países democratas, “lamentavelmente”, os compromissos assumidos têm de ser honrados. Adiantou que, se governante, ele e seu partido não vão admitir garrotes e ordens do FMI, o que é uma posição de independência, aliás melhor afirmável não fazendo acordos com o fundo do que firmando-os e depois questionando suas condições. E, para que não tenha que questionar as condições da renovação do acordo com o FMI que o Brasil fará no final deste ano e do governo FHC, pede que o futuro governante possa participar das negociações, em nome da transição.

Sobre a reforma agrária com invasões de terras, prática do MST que sempre teve apoio ou pelo menos beneplácito do PT, disse ser contra. Contra as invasões e decididamente a favor da reforma agrária, que considera mais viável num governo seu, sempre disposto ao diálogo. Debatendo a reeleição e o voto obrigatório, se disse contra uma e outro. Embora confessando que ainda não tem um plano de reforma política, que está em elaboração, sua justificativa para a posição pessoal anunciada é digna de aplausos. Lula entende que o povo deve votar antes nos partidos que nos candidatos, ou seja, antes nas idéias e programas que nas pessoas. Por isso, a reeleição ideal seria a eleição de um nome do mesmo partido do governante em fim de mandato, e não do próprio governante. Pelo mesmo motivo, mostrou-se favorável ao voto facultativo, pois o eleitor seria movido por preferências partidárias, indo espontaneamente às urnas para eleger os preferidos e não porque uma lei o obriga.

Este é, sem dúvida, um novo Lula, que, se eleito e se tiver apoio também conseqüente do seu próprio partido e sustentação parlamentar, será palatável até pelas forças que hoje tremem ao imaginar sua vitória em outubro. Se não for jogada de campanha, com esse confiteor Lula será absolvido pelos que antes o rejeitavam.

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