Concubinato e união estável, diferenças entre amantes e companheiros

Muitos têm uma noção errônea sobre o que vem a ser o concubinato, o que faz ser muito comum a confusão entre ele e a união estável. A etimologia da palavra concubinato é ?comunhão de leito?, vinda do latim, onde cum significa ?com? e cubare, dormir.

Outras definições, algumas até mesmo curiosas, esclarecem o que vem a ser o concubinato. Para um renomado autor, concubinato é ?a união ilegítima do homem e da mulher. E, segundo o sentido de concubinatus, é o estado de mancebia, ou seja, a companhia da cama sem aprovação legal.? (ver Silva, De Plácido e. Vocabulário jurídico. Concubinato. Rio de Janeiro: Forense, 1978).

Diz um outro jurista que ?concúbito, do latim concubitus, significa cópula, coito? (Ver Cunha, Antônio Geraldo da. Dicionário etimológico Nova Fronteira da língua portuguesa. Concubinato. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1982).

Na realidade, uma única regra já é capaz de esclarecer a diferença entre ambos. No concubinato os envolvidos são aqueles que chamamos de amantes e na união estável são os parceiros, companheiros ou conviventes. No concubinato, os envolvidos têm impedimentos para o casamento. Não podem se casar por um ou ambos serem casados. É uma relação ?extra-oficial?, paralela ao casamento ou à união estável.

A união estável é uma relação vivida por pessoas que podem se casar, se assim o desejarem. São pessoas que vivem juntas, como se casados fossem. São os envolvidos em uma relação pública, estável, duradoura e com intenção de constituir família. Sabe-se, pela freqüência com que ocorre, que a união estável gera o direito de divisão do patrimônio do casal adquirido durante o tempo em que perdurou a relação. Os bens adquiridos antes do relacionamento, por um dos companheiros, a ele pertencerão no caso de separação do casal, mas o inverso aplica-se àqueles bens adquiridos durante a união estável.

Já os amantes ou concubinos nenhum direito teriam, pois têm uma relação paralela a um casamento. Porém, os riscos que envolvem o patrimônio dos amantes vieram à tona em recentes decisões dos tribunais de São Paulo e outros Estados, que passaram a determinar em suas sentenças a indenização de um amante ao outro, pelo prazo em que durou a relação de concubinato.

Esclarecendo. Em alguns casos, o amante foi condenado a indenizar ou pagar pensão alimentícia para a amante pelos serviços que lhe foram prestados, apesar de estar casado durante o mesmo período. A indenização ou pagamento de pensão é aplicada quando, durante o relacionamento concubinário, houve a colaboração da amante para a formação do patrimônio do concubino. Nem é necessário que tal colaboração tenha sido dada através de investimento financeiro. Basta que a concubina tenha prestado serviços domésticos ao amante (mesmo que não tenha com ele qualquer vínculo empregatício), dando-lhe condições de exercer suas atividades profissionais.

Caso recentemente julgado no Estado de Minas Gerais nos dá conta de uma viúva que foi obrigada a pagar pensão à amante de seu falecido marido. Com a morte do amante, a concubina ingressou em seu inventário postulando uma pensão por serviços prestados ao falecido durante uma relação que existiu entre eles enquanto o finado era casado com a viúva. Alegou a ex-amante que, além do relacionamento íntimo com o adúltero, exercia serviços domésticos como diarista. Assim, a viúva foi obrigada a pagar a ex-amante de seu falecido marido a quantia de três salários mínimos mensais, pelo prazo em que durou a relação de concubinato, ou seja, 27 anos. O valor devido chegou a R$ 291.600.

Em outro caso, o Superior Tribunal de Justiça determinou que o amante pagasse à concubina uma pensão mensal por ela ter-lhe prestado serviços domésticos por mais de 30 anos, apesar de o amante ser casado. Na decisão, ficou claro que a prestação de serviços domésticos não se deu porque a amante era empregada doméstica do amante. Mas, o simples fato de ter colaborado com o amante, no sentido de que tais serviços beneficiassem o concubino, dando-lhe condições de exercer suas atividades profissionais, gerou, obviamente, o seu sustento e acumulação de patrimônio.

Podemos dizer, diante de tais decisões, que a pessoa que tem um ?caso? com um homem casado pode ser indenizada ou receber uma pensão mensal de seu amante. Desde, é claro, que demonstre sua cooperação, direta (financeiramente) ou indireta (prestação de serviços domésticos) para o crescimento do patrimônio do concubino. É evidente que a obrigação e o direito aplicam-se aos casos onde a amante também deve indenização ao concubino, quando da inversão dos papéis desempenhados na relação. A mulher também pode ver-se obrigada a pagar indenização ao amante se era ele quem lhe prestava os serviços domésticos, o que é, nos dias atuais, absolutamente plausível.

No Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, um homem que mantinha um relacionamento extraconjugal foi condenado a indenizar sua ex-amante por investimentos em dinheiro que ela teria feito enquanto mantinha o relacionamento de concubinato, colaborando com o aumento patrimonial do amante. Ressaltamos, novamente, o fato de o amante ser oficialmente casado com outra mulher.

Vemos, então, que nem só o casamento oficial e a união estável geram o dever de indenizar e partilhar patrimônio. Os relacionamentos concubinários vêm sendo encarados como algo que pode ir além de uma aventura amorosa. Apesar de tais decisões serem esparsas, apontam na direção de que as relações concubinárias, mesmo com inúmeras diferenças da união estável, geram também obrigações para aqueles que as mantêm.

Sylvia Mendonça do Amaral é advogada, membro do IBDFam (Instituto Brasileiro de Direito de Família) e autora do livro Manual Prático dos Direitos Homossexuais e Transexuais.

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