Coisa de branco

Falar em doença mental não deve ser difícil para ninguém… Sabemos que o problema não atinge apenas os que já foram identificados como pessoas com algum problema de deficiência, porque a dura realidade é que todos nós temos um pouco de louco dentro de nós. Todos nós.

Velha sabedoria popular ensina que “de poeta e de louco todo mundo tem um pouco”. O presidente Lula chegara à mesma conclusão em 28 de maio, Dia Mundial do Idoso – os mesmos velhos que semana passada estavam sendo impedidos de receber aposentadorias e pensões sob a suspeita generalizada de estarem tão loucos a ponto de receber benefícios depois de mortos. Por essa e por outras, como aquela da “caixa-preta” do Poder Judiciário, aconselharam-no a evitar o improviso. Besteira. É no improviso que o presidente se sente bem.

Mas agora, quando chegava ao fim seu périplo pela África, já depois de ter causado estupefação com suas declarações sobre o acordo com o Fundo Monetário Internacional – FMI, Lula ultrapassou seus próprios recordes. Na Namíbia, ele jogou – segundo o líder do PFL no Senado, José Agripino – a viagem fora: “Quem chega a Windhoek – disse e repetiu – não parece que está num país africano… Acho que poucas cidades do mundo são tão limpas e bonitas…”

Do tradutor aos assessores, tinha gente que não sabia onde esconder a cara. Sam Nojuma, o presidente anfitrião, 14 anos no cargo, ficou sério e nada considerou. Mas que pensou, pensou. No Brasil, as infelizes palavras ditas lá no continente africano ecoaram de norte a sul como uma bomba. Como assim? Então sujeira e feiúra é coisa de africano? De africano pobre? E era esse o líder que se insinua como estrela-guia no alavancar do desenvolvimento dos países do terceiro mundo? E se respondessem a Lula, como seria de esperar, que o que ele está a dizer é coisa de branco? De branco bem remunerado e pança cheia?

Ao confessar seus preconceitos de forma transparente (e quase ingênua, afinal, não deve ter falado com maldade, como de resto aconteceu em Cuba, no México, na Inglaterra, Espanha e alhures…), Lula deveria receber troféus. No dia-a-dia, há quem diga e faça pior, sabemos disso. Tem muito europeu que pensa exatamente como ele a respeito do Brasil, aliás, da América do Sul inteira (terra de “índios pobres”, segundo o próprio Lula). Mundo afora, cunhou-se a imagem de que a África é “um continente só de pobres” e que essa pobreza, segundo o presidente repete porque assim aprendeu, é feia, porque bonitos são os homens brancos que habitam países ricos… O problema é que Lula é o presidente de uma nação e, assim, em seus discursos, representa a cada um de nós, brasileiros, sejamos brancos, negros, cafuzos, mulatos, pálidos ou amarelos, moços ou velhos. Nordestinos (ai do ministro Graziano!) ou sulistas. E fica feio para um representante nosso sair por aí dizendo essas coisas que lhe escapam da boca sem aviso prévio.

Deveria Lula, para pegar carona no aprendizado doloroso de seu ministro da Previdência, Ricardo Berzoini, pedir desculpas formais pelo que pensou e pelo que disse alto. E nunca mais ceder à tentação de falar de improviso diante dos microfones e câmeras. Assim, se sua decantada capacidade de improvisação (outro mito que se esboroa) ficar empanada pelo brilho da produção que vem da assessoria que o acompanha, pelo menos evitaremos vexames outros. Ou, como já querem alguns, para evitar tragédias dessa natureza, que se reduza (para não dizer proíba, coisa impossível) o número de viagens de Lula ao exterior. Em demasia, elas “acabam ficando vulgares”, como observa o matreiro senador Antônio Carlos Magalhães. Vulgares e, como sabemos, custosas para os cofres públicos, que têm objetivos mais nobres a financiar em benefício de nossa pobreza doméstica que vagueia nas filas do emprego, do INSS, dos hospitais, etc., sem se dar conta de que a cada dia fica um pouco mais ensandecida.

Voltar ao topo