Chega de calote!

O presidente Lula já disse que o ministro da Previdência, Ricardo Berzoini, conta com sua maior estima e consideração. Suas declarações foram interpretadas, desde logo, como um salvo-conduto. O ministro não será defenestrado na primeira e próxima reforma do Ministério, anunciada para as vésperas do Natal, um período aparentemente impróprio e que não deve ser usado para dar desgosto a amigos. Mas Berzoini é amigo do peito. Seu velho companheiro de partido e merecedor de toda consideração, não importam as incômodas impropriedades que tem praticado no cargo, carreando antipatias para o governo. Foi o responsável por aquelas vexatórias e inumanas filas de velhinhos até em cadeiras de roda, nas portas do INSS, obrigados a provar que estavam vivos. A indignação foi tanta que, relutando em pedir desculpas e obrigado a reconhecer seu erro, Berzoini acabou dispensando os velhinhos dessa “via crucis”, para buscar uma maneira menos penosa de provar que a clientela idosa do INSS está viva e continua credora dos seus benefícios.

Não demorou, e Berzoini foi responsabilizado por mais um atentado contra os aposentados. Obrigou-os a fazerem filas diante da Justiça Federal, para nela reclamarem reajustes não pagos em suas quase sempre irrisórias aposentadorias. O que se viu foi uma cena dantesca. Pessoas idosas, muitas doentes, dormindo em filas, ao relento, na esperança de ingressarem na Justiça com uma reclamação que lhes daria, no futuro, um reajuste que os tribunais superiores já reconheceram como um direito. Reajustes inquestionáveis, salvo no quantum que irá variar de aposentado para aposentado. E que ninguém melhor que o INSS para calcular.

Berzoini tinha a desculpa de que estava cumprindo a lei, que estabelecia um prazo para a ação reclamatória. E nenhuma desculpa por não agir aumentando esse prazo, com uma medida provisória, por exemplo, o que finalmente aconteceu. Lula mandou, por esse meio, dar aos aposentados mais cinco anos para reclamar na Justiça Federal os reajustes de aposentadorias não pagos pelo INSS.

Juizes singulares, representantes dos tribunais superiores e do Ministério Público foram, na medida de suas competências, interferindo nesse carnaval de insensatez e desrespeito, ora mandando o INSS calcular e pagar o que sonega sem o requerimento dos credores, ora propondo que para todos seja feita justiça. Que o governo pague o que deve, já que reconhecido pela Justiça, a todos os aposentados que têm direito, sem a necessidade de filas ou de ações judiciais.

Esta certamente seria a solução mais lógica. Se o governo deve e sabe que deve, tendo todos os instrumentos para calcular os débitos, que pague e não sonegue. E leve em consideração que estará pagando a pessoas geralmente idosas, que trabalharam por muitos anos contribuindo para o INSS. E ainda estão sendo exigidas a continuar contribuindo. Mas o governo tem uma absurda desculpa. Se pagar a todos que têm direito à revisão das aposentadorias, terá uma despesa extra de R$ 14 bilhões. É pouco? Claro que não. É muito dinheiro.

Mas aí há um raciocínio inverso e perverso por parte das autoridades. Julgam elas que estarão sacrificando o seu caixa, esquecendo-se que esses R$ 14 bilhões são o que sonegou dos aposentados. E quanto mais sonega, mais terá de pagar. Quando o sonegador é o cidadão, é crucificado e cobrado na marra. Quando é o governo, se sente no direito de indulgências, sacrificando os seus credores, no caso, os aposentados.

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