Cansados de prosa

O governo do presidente Lula quer e defende a paz. Mas, a se julgar pelas mais recentes ações e declarações dos comandantes nacionais do Movimento dos Sem-Terra, tem que estar preparado para a guerra. “Cansados de prosa”, eles anunciam para o dia 17 de abril a realização de uma série de ações para demonstrar insatisfação e exigir – sim, esse é o termo – do governo a reforma agrária com que sonham. Advertem que as últimas invasões, incluindo as de Cascavel, no Paraná, e a depredação do prédio do Incra em Mato Grosso, constituem apenas o “aperitivo” das jornadas programadas para abril.

A ordem, segundo João Paulo Rodrigues, um dos dirigentes nacionais do MST, é “tolerância zero com o latifúndio”. Anunciam que o incremento da guerra no campo coincidirá com os primeiros 120 do governo de Lula, prazo que esgota a paciência pela espera de promessas não realizadas. Chegam ao cúmulo de dizer que, assim, vão ajudar o governo, ao mostrar, através das invasões, onde estão os latifúndios e quais terras devem ser desapropriadas para os assentamentos.

A “ajuda” ao governo será tanta que, segundo cinicamente diz um dos dirigentes no Rio Grande do Sul, as ações do MST têm também a intenção de denunciar que, ao contrário do que se dizia no governo de Fernando Henrique Cardoso, não houve reforma agrária no Brasil. Em Mato Grosso, entretanto, o líder Altamiro Stochero desafia: Lula vai ter que mostrar se pretende mesmo aprofundar a reforma agrária. Até aqui, os técnicos do Incra querem continuar conversando, para explicar por que os processos de desapropriação não andam…

De seu lado, o governo responde: manterá a mesa de negociações sempre aberta, mas não haverá de tolerar ação violenta nem a depredação de prédios públicos, como aconteceu em Mato Grosso. A Polícia Federal será, sempre, acionada nesses casos. Em nota divulgada logo após o Carnaval, o ministro do Desenvolvimento Agrário, Miguel Rossetto, reitera a disposição do governo de trabalhar por “um processo de reforma agrária pacífico e ágil, centrado no diálogo e capaz de resgatar o enorme passivo fundiário herdado de governos anteriores”. Diz o ministro que, desde janeiro, há um “novo tempo nas relações com todos os movimentos e entidades ligadas ao campo” e que essa relação franca está sendo mantida em todas as regiões do País. Convoca, ao final, para a somatória de esforços, para o diálogo e para o respeito à Constituição Nacional.

A prosa do governo, como se vê, é mais ou menos semelhante ao que dizia com muita paciência o governo anterior: quer reformar a estrutura fundiária, mas com ordem e de forma pacífica. A prosa do MST, entretanto, também é mais ou menos a mesma, para justificar ações idem, e isso acentua o argumento do Movimento Nacional dos Produtores – MNP, segundo o qual o único interesse entre as lideranças do MST é radicalizar, alheio mesmo a um modelo que se tem demonstrado criador de favelas rurais.

Como convém a um período de escaramuças que precede à guerra anunciada, que fique bem claro o que pretendem as partes, lado a lado. Do lado do governo, mais que palavras, aguarda-se a incisiva ação em nome da ordem e do respeito às normas vigentes. Para que tudo não vire numa baderna só.

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