Cala-te, boca!

O poeta gaúcho Mário Quintana escreveu uma vez que às vezes a gente pensa que está dizendo bobagens, mas na verdade está fazendo poesia. O contrário também pode ser verdade. Exemplo: as declarações do novo ministro do Trabalho, Jaques Wagner, sobre direitos dos trabalhadores. Ele certamente pensava estar levantando assuntos da maior importância e que o alçariam às manchetes, pela grandiloqüência do discurso. De fato, estava senão dizendo bobagens, pelo menos perdendo uma boa oportunidade de ficar calado, deixando para depois de melhores estudos o seu versejar sobre o ganha-pão de milhões de trabalhadores brasileiros. O sábio chinês sustentava sua fama com o silêncio. Wagner mostra imagem bem menos inteligente, falando pelos cotovelos, mal começa a administração Lula.

Ele é contra a ampliação de cinco para até seis meses do seguro-desemprego e acredita que é preciso acabar com a multa de 40% sobre o FGTS nos casos de demissão sem justa causa. Para ele, “seria melhor não ter esse ônus sobre a demissão”. Preocupa-se com as fraudes que a multa pode provocar, apontando aqueles casos em que patrão e empregado, de comum acordo, promovem a demissão, a multa e o levantamento do FGTS. E a posterior readmissão. Como se para isso não houvesse acordo e não ocorresse um “expediente” para socorrer o trabalhador desesperadamente necessitado. Isso quando a lei em geral não oferece outras opções de socorro.

No que se refere ao aumento, em um mês, do pagamento do seguro-desemprego, esquece-se que cresce o tempo em que o trabalhador desempregado fica à procura de um novo posto. E que muitos procuram tanto e por tanto tempo, que até desistem, voltando-se para a economia informal. O ideal seria que o seguro-desemprego fosse pago enquanto durasse o desemprego, evitando-se fraudes e obrigando o beneficiário a se reciclar e também prestar serviços à comunidade, em paga do que recebe. É evidente que tais declarações do ministro do Trabalho repercutiram muito mal entre os trabalhadores e as cúpulas das centrais sindicais. E percebendo a “mancada”, Osvaldo Bargas, futuro secretário de Relações do Trabalho, ensaiou um desmentido, sem conseguir ser convincente. Isso porque há coerência no que disse o ministro Jaques Wagner. Ele, a pretexto de ser defensor de uma política de emprego mais ativa e menos assistencial, é um reacionário que se distancia anos-luz da mentalidade que se espera de um governo encimado por Lula.

Sob o ponto de vista político, deveria permanecer calado, mesmo que acredite nas bobagens que disse. Esta é hora de pensar o que se fala, mais do que falar o que se pensa. Os problemas do Brasil e os que Lula terá de enfrentar são dificílimos e complexos. Em especial no atendimento das classes mais humildes e dos trabalhadores em geral. Isso porque o PT e Lula pregaram durante mais de duas décadas garantias e benefícios que a realidade encontrada no poder mostram de dificílimo atendimento. Leve-se em conta, ainda, que o governo luta por sustentação no Congresso, buscando o apoio do PMDB e, em especial, da sua ala mais progressista. Sandices como as recém-ditas pelo ministro podem obstaculizar os necessários acordos. O silêncio teria colaborado para uma melhor imagem do ministro, do governo e, quem sabe?, para a busca de mais adequadas soluções nas relações do trabalho.

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