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Testemunha de PM trabalhou para condenado pela chacina de Osasco

A defesa do policial militar Victor Cristilder, acusado de participar da maior chacina da história do Estado de São Paulo, em 2015, chamou para depor como testemunha no júri um advogado que atuou na bancada de defesa de outro réu, o soldado das Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar (Rota) Fabrício Eleutério. Com o processo desmembrado, Eleutério foi julgado antes, em setembro, e condenado a 255 anos, 10 meses e sete dias de prisão em regime fechado.

Desta vez arrolado como testemunha, Charles dos Santos Cabral Rocha confirmou em plenário que trabalha para o escritório da advogada Flávia Artilheiro, representante legal de Eleutério, e que esteve presente no julgamento anterior. Ele chegou a guardar o resultado do Conselho de Sentença dentro do tribunal.

Na ocasião, além de Eleutério, o PM Thiago Heinklein e o guarda civil de Barueri Sérgio Manhanhã foram considerados culpados e receberam pena de 247 anos, 10 meses e 7 dias e 100 anos e 10 meses, respectivamente. Todas as defesas recorreram da sentença e o resultado do júri de Cristilder pode impactar na apelação dos réus já condenados.

Na tarde desta quarta-feira, 28, a juíza Élia Kinosita Bulma, que preside o júri, preferiu não fazer perguntas a Rocha. “Vou passar para o defensor porque nem sei o que você tem para falar”, disse.

Aos jurados, ele se apresentou apenas como o primeiro advogado de Cristilder, responsável por acompanhar o reconhecimento do réu por uma testemunha protegida, a “Beta”, no Departamento de Homicídios e de Proteção à Pessoa (DHPP) e na Corregedoria da Polícia Militar.

Rocha só abdicou formalmente da função de advogado de Cristilder nesta quarta, quando já estava no plenário. Aos jurados, ele narrou supostas irregularidades no processo de reconhecimento de Cristilder na fase policial. Segundo relatou, a testemunha “Beta” estaria “tranquila” quando disse não reconhecer o PM como o autor dos disparos que matou Michael do Amaral Ribeiro, de 27 anos, em Carapicuíba, uma semana antes dos ataques. Após confronto de balística, as investigações apontaram que a mesma munição desse homicídio foi usada em parte dos ataques da chacina.

Em plenário, o delegado José Mário de Lara, do DHPP, afirmou que a testemunha teria se sentido intimidada pela presença do advogado e que, mais tarde, afirmou para ele que tinha reconhecido Cristilder. Rocha, no entanto, afirmou não ter sido avisado dessa mudança quando o delegado formalizou o reconhecimento.

Por sua vez, o promotor Marcelo Alexandre de Oliveira, responsável pela acusação, mostrou ao advogado o documento, assinado por ele próprio, em que “Beta” reconhece Cristilder e narra que a testemunha estava “nervosa” e “suou frio”. “Sim, reconheço minha assinatura”, disse Rocha.

“É algo meio inédito para mim, principalmente quando esse mesmo advogado atuou no escritório do advogado do Cristilder e, neste processo, ele atua em favor do Fabrício, já condenado pelo Tribunal do Júri de Osasco”, afirmou o promotor. “É evidente que tem interesse na absolvição do Cristilder para que interfira de alguma maneira no convencimento do Tribunal de Justiça na análise dos recursos.”

Questionado, o advogado João Carlos Campanini, que defende Cristilder, negou que tenha havido conflito de interesse em arrolar Rocha no processo. “Você pode valorar sua prova, até que ponto essa testemunha está falando a verdade ou não. O promotor vai dizer que ela está mentindo porque tem interesse. A defesa vai dizer que ela está falando a verdade”, disse. “Quem vai poder valorar isso aí e acreditar ou não na testemunha são os jurados.”

Álibi

Também houve o depoimento de quatro policiais militares que trabalharam com Cristilder na Força Tática do 20.º Batalhão do Metropolitano (BPM/M), entre eles o comandante do pelotão. As testemunhas reforçaram que o réu estava na sede no momento da chacina, estudando para o concurso de sargento da PM. “Ele estava nessa rotina havia dois, três meses”, disse o tenente Luís Alberto Balsa, superior direto.

Os policiais confirmaram que não havia registro de entrada e saída no local, mas que seria “impossível’ Cristilder deixar a sede sem ser visto. “Não tem como ele ter saído e matado gente”, afirmou o soldado Marcos César Dias.

O capitão reformado do Exército Brasileiro Sérgio Rodrigues afirmou que foi chefe do PM entre os anos 2003 e 2008, quando Cristilder servia às Forças Armadas, no batalhão logístico. “Era meu braço direito”, disse a testemunha.

Para a defesa, o testemunho de Rodrigues interessa porque as munições usadas em Carapicuíba e na chacina de Osasco foram extraviadas do Exército – o que reforça a suspeita sobre o réu. Em plenário, entretanto, o capitão afirmou nunca ter sumido nenhuma munição no período em que ele esteve lá. Foram ouvidos ainda o gerente de supermercado da região (onde supostamente Cristilder fazia “bico”, segundo uma testemunha”), a mãe de uma vítima de homicídio (que não é julgado neste processo) e um vizinho do PM.

Mais três testemunhas estão previstas para depor no Fórum Criminal de Osasco, na Grande São Paulo, nesta quinta-feira, 1.º. Neste dia, o réu também deve passar por interrogatório. A expectativa é que a fase de debates, a Sala Secreta e a leitura da sentença saiam na sexta-feira, 2.

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