Foto: Antônio Cruz/ABR
O presidente sancionou o Estatuto do
Idoso e não perdeu a chance de discursar.

Brasília – O presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou, em solenidade no Palácio do Planalto, o Estatuto do Idoso. Não houve vetos ao artigo 15 do capítulo 4, que proíbe a discriminação de preços aos idosos nos planos de saúde. Com isso, os planos de saúde não podem mais adotar políticas de aumento de preços para pessoas com mais de 60 anos.

O presidente, porém, não se livrou de uma polêmica com o ministro da Saúde, Humberto Costa, que voltou a defender o veto do artigo. Costa não sabia da existência desse item. “Quando vi pela primeira vez entendi que era simplesmente a transcrição da lei de 1998. Eu não sabia que a redação (do Estatuto) continha essas imprecisões e, ao mesmo tempo, que ela poderia dar margem a uma elevação dos custos dos planos para as pessoas mais jovens”, afirmou. “O que queremos é garantir o direito de não ter reajuste e que não haja nenhum prejuízo para quem paga (plano) há muito tempo.”

Além de reclamar da mudança na regra dos planos de saúde, Humberto Costa criticou também um artigo que garante o fornecimento gratuito aos idosos de medicamentos controlados de uso contínuo. “Isso abre a possibilidade de que qualquer tipo de medicamento possa ser fornecido gratuitamente”, disse.

Diálogo

Segundo Lula, uma das coisas mais difíceis na política é a unanimidade. Os comentários foram feitos a propósito da reunião de ontem com os governadores para discutir a unificação dos programas sociais.

Ele lembrou que são raras as iniciativas que recebem a concordância de todos os segmentos da sociedade e afirmou que o Estatuto do Idoso é um desses casos. Para o presidente, a defesa da dignidade do idoso passa a ser um compromisso de toda a sociedade. Ele lembrou que é necessária a adesão de todos para que o estatuto seja cumprido e os direitos das pessoas da terceira idade, respeitados. “A partir deste Dia Internacional do Idoso de 2003, envelhecer neste país é mais do que sobreviver, é mais do que resistir, é mais do que ficar olhando a porta à espera da visita que não vem. A partir de hoje (ontem), a dignidade do idoso passa a ser um compromisso civilizatório do povo brasileiro”, afirmou o presidente.

O presidente lembrou que o Estatuto do Idoso passa a proteger os direitos dos 20 milhões de cidadãos da terceira idade no Brasil. “Seus 119 artigos formam um guarda-chuva de garantias legais que a sociedade devia aos seus idosos”, disse Lula.

O presidente aconselhou às pessoas idosas que, quando se aposentarem, não fiquem em casa, “atrapalhando” a família, procurem alguma coisa para fazer, alguma coisa para tornar seu dia prazeroso. O estatuto prevê também penas que chegam a 12 anos de reclusão para quem for processado por expor a pessoa idosa a perigo de vida, submetendo-a a condições desumanas ou degradantes ou privando-a de alimentos e cuidados indispensáveis. As famílias que abandonarem cidadãos de terceira idade em hospitais e casas de saúde poderão ser condenadas por períodos de 6 meses a 3 anos de detenção.

Planos de saúde ameaçam com reajuste

O Estatuto do Idoso vai gerar o aumento de mensalidades dos planos de saúde, segundo a Abramge (Associação Brasileira de Medicina de Grupo), entidade que representa 40% do mercado de planos e seguros saúde ?16,5 milhões de pessoas. Na avaliação da entidade, o artigo 15 do capítulo 4, que impede as empresas de saúde de realizar reajustes para pessoas com mais de 60 anos, vai provocar o repasse desse custo nas mensalidades das outras faixas etárias.

“Haverá necessidade de redistribuição de valores nas outras faixas etárias”, disse o presidente da Abramge, Arlindo de Almeida. Ele disse que as empresas precisarão “reequilibrar as contas”. E completou: “Temos que conversar com o governo porque qualquer aumento só pode ser realizado pela ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar). Dessa maneira, para fazer qualquer mudança temos que rediscutir tudo”.

Segundo Almeida, há uma dúvida se o artigo do estatuto prevalece sobre a lei 9656/98, que regulamenta os planos de saúde e permite o reajuste por idade em sete faixas. A lei contém um dispositivo que impede que a última faixa não supere em mais de seis vezes o valor da primeira. “Daqui para a frente a lei geral (estatuto) sobrepõe sobre a lei específica de planos?”, questionou o presidente da Abramge. Ele disse que vai aproveitar o fato de ter um compromisso em Brasília nesta sexta-feira para discutir o assunto com representantes do governo. A ANS informou, por meio de sua assessoria de imprensa, que ainda não possui uma posição oficial sobre o assunto.

Paim reage a críticas de ministro

O senador Paulo Paim (PT-RS) reagiu com rigor às críticas do ministro da Saúde, Humberto Costa, sobre as mudanças nas regras de cobranças dos planos de saúde. Contrariando as queixas do ministro, que reclamou não ter sido chamado pelos congressistas para discutir o assunto, Paim afirmou que o estatuto foi debatido no Congresso durante sete anos.

“Isso é problema dele (do ministro), tem que falar com ele, o governo deu sinal verde, o presidente Lula, inclusive, solicitou para que eu trabalhasse junto com líderes para aprovar antes do dia 27 (de setembro). Com todo respeito que eu tenho ao ministro, esse projeto está no Congresso há sete anos e só foi aprovado por unanimidade depois de consultado o governo. Você acha que alguém aprova um projeto por unanimidade sem apoio do governo?”, completou.

O senador defendeu que os mais jovens sejam penalizados com mensalidades maiores para beneficiar os mais idosos. “O que existe hoje é uma discriminação hedionda contra os idosos. Se tiver que penalizar, vamos penalizar os mais novos. Eu me proponho a pagar mais pelo plano de saúde enquanto eu tiver 50 anos. Quando eu tiver 60, 70 eu deveria é ter um desconto”, disse.

Afirmou também que consultou diversos empresários do setor e que alguns deles já deram garantias de que manterão as mensalidades dos planos no mesmo patamar atual. “Esses terão mais clientes. Aqueles que quiserem exagerar nos preços, vão estar fadados ao fracasso. Isso é livre concorrência, é iniciativa privada.” Paim revelou que esteve conversando com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva por cerca de uma hora antes da sanção do estatuto.

Caminhada

Cerca de duas mil pessoas participaram ontem de manhã, no Parque da Cidade, de uma caminhada em comemoração ao Dia Internacional do Idoso. Os ministros da Saúde, Humberto Costa, e da Assistência e Promoção Social, Benedita da Silva, participaram da solenidade de abertura

Principais pontos do projeto:

– assegura desconto de pelo menos 50% nas atividades culturais, de lazer e esportivas;

– gratuidade nos transportes coletivos públicos para os maiores de 65 anos. A legislação local poderá dispor sobre gratuidade também para as pessoas na faixa etária de 60 a 65 anos;

– no caso do transporte coletivo intermunicipal e interestadual, ficam reservadas duas vagas gratuitas por veículo para idosos com renda igual ou inferior a dois salários mínimos e desconto de 50% para os idosos de mesma renda que excedam essa reserva;

– nas aposentadorias, o relator acolheu redação de emenda do governo que determina o reajuste dos benefícios na mesma data do reajuste do salário mínimo, porém com percentual definido em regulamento. O substitutivo aprovado na comissão especial tinha redação que vinculava o reajuste ao do mínimo;

– a idade para requerer o benefício de um salário mínimo estipulado pela Lei Orgânica da Assistência Social (Loas) passa de 67 para 65 anos;

– prioridade na tramitação dos processos e procedimentos dos atos e diligências judiciais nos quais pessoas acima de 60 anos figurem como intervenientes;

– os meios de comunicação também deverão manter espaços ou horários especiais voltados para o público idoso, com finalidade educativa, informativa, artística e cultural sobre o processo de envelhecimento;

– na área da educação, os currículos mínimos dos diversos níveis de ensino formal deverão prever conteúdos voltados ao processo de envelhecimento, a fim de contribuir para a eliminação do preconceito. O poder público apoiará a criação de universidade aberta para as pessoas idosas e incentivará a publicação de livros e periódicos em padrão editorial que facilite a leitura;

– quanto aos planos de saúde, o projeto veda a discriminação do idoso com a cobrança de valores diferenciados em razão da idade, determinando ainda ao poder público o fornecimento gratuito aos idosos de medicamentos, especialmente os de uso continuado, assim como próteses e outros recursos relativos ao tratamento, habilitação ou reabilitação;

– o idoso terá prioridade para a aquisição de moradia própria nos programas habitacionais, mediante reserva de 3% das unidades. Está prevista ainda a implantação de equipamentos urbanos e comunitários voltados para essa faixa etária, além de critérios de financiamento da casa própria compatíveis com os rendimentos de aposentadoria ou pensão.

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