PT avalia que críticas a FHC foram necessárias

O presidente eleito que criticou duramente o atual governo diante de seu ministério na tarde de sexta-feira é o mesmo Luiz Inácio Lula da Silva que horas mais tarde encerrou a transição com uma visita ao presidente Fernando Henrique Cardoso no Palácio da Alvorada. “São duas fases distintas: o sol e lua. De dia trata-se da economia, que vai mal, e à noite da democracia, que vai muito bem”, resume, bem humorado, o líder do PPS na Câmara, João Herrmann (SP).

Ele acompanhou o novo ministro da Previdência, Ciro Gomes (PPS), à primeira reunião do ministério e, assim como o PT aprova sem reservas o comportamento do presidente Lula. “Temos de mostrar a realidade de como estamos pegando o governo”, reforçava ontem o deputado Paulo Rocha (PT-PA).

Na avaliação da cúpula do PT, o tom agressivo das críticas ao governo FHC, adotado por Lula e seu futuro ministro da Fazenda, Antonio Palocci, foi oportuno e necessário, diante da constatação de que a civilidade da transição governamental ganhara mais repercussão do que as dificuldades econômicas do País. Tanto que Lula fez questão de dizer ao presidente, em seu discurso, que ele é vitorioso na consolidação da democracia, mas que é só isto o que tem a comemorar.

Ele e Palocci alertaram o País para a gravidade da situação econômica e para o fato de que novidades piores podem aparecer. Há dados que só se conhece estando dentro do governo. O tom das falas do presidente eleito e seu ministro da Fazenda foi objeto de várias discussões na cúpula petista. “A luta interna foi grande”, atesta um importante interlocutor político do novo governo.

Resistência

Lula resistiu muito, até que começaram a mostrar que havia dois presidentes no Brasil: um que havia vencido o processo político, que era Fernando Henrique, e outro que assumiria o comando do País. Superou-se aí a disposição inicial de não verbalizar nada que atingisse diretamente o presidente atual, para não comprometer a já frágil situação econômica do País. A conclusão geral foi uma só: ou se transmitia a situação real do trono à sociedade, ou corria-se risco de desmoralizar a própria transição.

E tudo tinha que ser feito na sexta-feira, que na prática foi considerada o último dia útil antes da posse, na quarta-feira. Lula e Palocci optaram por fazer um discurso público, transmitido ao vivo pela televisão. Tornar público o diagnóstico que deveria ser dirigido apenas ao ministério foi considerado estratégico para evitar versões.

“Fez-se a fala do trono ao povo e não à Câmara de Lordes.” Diante da apreensão em torno da “herança negativa” da economia, o presidente eleito fez uma recomendação a todos os ministros: tudo o que descobrirem depois de empossados terá que passar por ele antes de ser divulgado. O próprio Lula tratará de revelar as novidades à sociedade. Dizem os petistas que o cuidado se justifica por conta da avaliação de que os instrumentos de sustentação da nossa credibilidade são hoje muito fracos, agravados pela crise internacional.

Crescem pressões para 2.º escalão

Brasília

(AE) – Após a apresentação do primeiro time do novo governo na reunião ministerial de sexta-feira intensificaram-se as negociações e pressões para a escolha dos integrantes do segundo escalão da administração federal. Pelo menos quatro futuros ministros, entre eles o da Fazenda, Antônio Palocci, passaram a manhã de ontem no escritório de transição analisando nomes indicados pelo PT e partidos aliados para os cargos federais mais cobiçados.

Foram analisadas ontem pelos ministros e mais tarde apresentadas ao presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva, que estava na Granja do Torto, as indicações para presidências e diretorias das principais empresas e agências da Região Norte Eletronorte, Banco da Amazônia S.A (Basa), Agência de Desenvolvimento da Amazônia (Ada) e Superintendência da Zona Franca de Manaus (Suframa). O único nome praticamente certo é o do senador Ademir Andrade (PSB-PA) para a presidência da Eletronorte. Ademir, que está em fim de mandato, foi candidato a governador do Pará e no segundo turno aliou-se à candidata petista Maria do Carmo, que perdeu para o tucano Simão Jatene.

Cargos

A divisão dos cargos, segundo deputado Paulo Rocha (PT-PA), atenderá aos partidos aliados e governadores da região. Para negociar e discutir o preenchimentos dessas vagas, foi criado o Fórum de Estados da Região Norte, com cinco integrantes do PT, inclusive Rocha e o governador Jorge Viana (AC), que encaminham os pleitos dos aliados e dos próprios petistas. “Trata-se de uma composição política que envolve todos os governadores e lideranças políticas da região”, explicou Paulo Rocha.

Ajuste deverá ser forte, avalia BBV

São Paulo

(AE) – O ajuste fiscal do governo Lula terá que ser mais forte do que o verificado no governo de Fernando Henrique Cardoso, avaliam o corpo de economistas do BBV Banco Brasil. Diante desta constatação, afirmam os especialistas em um estudo, que o tema mais relevante a se discutir é o de saber qual será a postura do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva diante de um inevitável choque entre as demandas sociais através de seus inúmeros ministérios voltados para a área.

Dos 24 ministérios do presidente Lula, lembram os economistas do BBV Banco, 14 têm uma atuação diretamente social. “Se o presidente Lula não conceder aos ministros Antônio Palocci e Guido Mantega legitimidade interna e sinais claros de que terão amplo suporte político para jogar duro na consolidação do ajuste fiscal, será difícil evitar que a área econômica do governo Lula, sobretudo personificada pelo ministro Palocci, não seja rapidamente estigmatizada como financista ou insensível socialmente”, dizem os analista do BBV em seu boletim econômico diário enviado anteontem a seus principais clientes.

Para eles, a não compreensão de que a área econômica do governo tem a responsabilidade de ajustar as contas de forma implacável, administrando a penúria de recursos fiscais levaria a um profundo desgaste da pasta da Fazenda.

Churrasco encerra transição

Brasília

(AE) – Um churrasco hoje na Granja do Torto vai coroar a transição de governo. Como bons amigos, o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva e o presidente Fernando Henrique Cardoso vão almoçar juntos no último domingo antes da transmissão do cargo. O churrasco não estava previsto na agenda de nenhum dos dois, assim como o encontro que tiveram na sexta-feira à noite no Palácio da Alvorada. Acompanhados das respectivas mulheres -Ruth Cardoso e Marisa Letícia -, Fernando Henrique e Lula apenas tomaram vinho anteontem, sem jantar. A filha do presidente, Beatriz, e seus netos também estavam presentes.

Assuntos políticos ficaram de fora, segundo Fernando Henrique, que classificou o diálogo como uma conversa de amigos. Durante o dia, ele e Lula haviam trocado farpas, com o petista condenando a herança que vai receber e o atual ocupante do Alvorada chamando de “retórica de palanque” as críticas dirigidas a seu governo por futuros ministros.

Conversa

A conversa informal deve dominar o churrasco amanhã, deixando mais uma vez de lado as intrigas e bate-bocas públicos do dia-a-dia da política. Desde a derrota nas urnas do candidato governista José Serra (PSDB), Fernando Henrique tem buscado constantemente realizar uma transição em alto nível, com total transparência.

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