A Política Nacional sobre Drogas do governo Jair Bolsonaro altera de forma expressiva a lógica do tratamento de dependentes. A prioridade é buscar a abstinência, em vez da redução de danos, o que geralmente ocorre em atendimentos nos serviços públicos especializados, como Centros de Atenção Psicossocial.

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A professora da Universidade de Brasília (UNB) Andrea Gallassi, em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, observa que “na redução de danos a abstinência é a consequência esperada, mas cada pequeno ganho na diminuição do uso durante o processo de tratamento é bastante valorizada”. Para o secretário nacional de Cuidado e Prevenção às Drogas do Ministério da Cidadania, Quirino Cordeiro Júnior, no entanto, tal forma de tratamento não oferece os resultados esperados. “Veja os números de pessoas dependentes.”

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Na nova lógica do governo, ganha espaço a oferta das terapias em comunidades terapêuticas. Ligadas principalmente a entidades religiosas, essas instituições pregam a abstinência para pessoas que ali se internam. O ministro da Cidadania, Osmar Terra, anunciou, na Marcha dos Prefeitos, a expansão dos convênios com esses estabelecimentos. De acordo com o secretário, uma vez publicada a nova política será preciso fazer uma adaptação nos serviços de atendimento, com capacitação de profissionais. Além disso, serão revistos projetos e iniciativas.

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O Ministério da Saúde afirmou que apoiaria todas as medidas com base em resultados cientificamente comprovados. Integrantes da pasta dizem não haver estudos que comprovem a superioridade da redução de danos em relação a terapias que pregam a abstinência. Para especialistas, no entanto, a medida é considerada um retrocesso.

Cordeiro Júnior afirmou que não se alteram as possibilidades de internação. Elas podem ser de forma voluntária, involuntária (feita a pedido de uma terceira pessoa) ou compulsória (por determinação da Justiça). “Quanto melhor for a assistência aos pacientes, menos internações compulsórias devem ocorrer.”

Sem critério

Preparado com a participação dos Ministérios da Saúde, da Justiça e Segurança Pública, Cidadania e o da Mulher, Família e Direitos Humanos, o documento silencia em um ponto considerado essencial por organizações não governamentais e pela Comissão de Juristas formada pela Câmara dos Deputados: a criação de critérios objetivos para distinguir o usuário do traficante de drogas. A Lei de Drogas deixa a cargo da autoridade policial, do promotor e do juiz definir cada caso. Como o jornal adiantou, o texto do governo não vai alterar tal regra.

“Se fosse estabelecida uma quantia máxima para porte, haveria o risco de traficantes driblarem a fiscalização, portando apenas o mínimo necessário”, avaliou Cordeiro Júnior. Para o secretário, a regra atual é usada de forma adequada por autoridades policiais e pelo Judiciário. “Eles têm autoridade, a experiência para fazer a avaliação”, disse.

O novo texto destaca a necessidade de se fazer a prevenção do uso de drogas nas escolas e deixa clara a sua discordância com a liberação do uso ou a comercialização de entorpecentes. À primeira vista dispensável, as duas manifestações no texto têm endereço certo: o Supremo Tribunal Federal, que deverá em junho voltar a discutir a descriminalização do porte de maconha para uso pessoal.

A Agência Nacional de Vigilância Sanitária, por sua vez, tem entre as propostas de resolução a que permite o plantio de maconha para uso medicinal. O plano menciona ainda a intenção de estrangular o narcotráfico por meio do combate à lavagem de dinheiro e à corrupção. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.