Pará julga seita acusada de bruxaria no Paraná

Belém – Começou ontem o julgamento dos cinco acusados de seqüestrar, torturar, castrar e matar cinco crianças em Altamira (PA), entre 1989 e 1993. Um dos pontos altos da primeira sessão do Tribunal do Júri foi a leitura de trechos do livro “Deus, a Grande Farsa”, escrito pela vidente Valentina de Andrade, uma das principais acusadas.

No livro, que mistura ufologia com ataques a todas as religiões, Valentina, fundadora da seita Lineamento Universal Superior (LUS), se autoproclama Maria Madalena, que acompanhou os passos de Jesus até o calvário. No trecho que mais interessa à acusação, a vidente afirma: “Acautelem-se com as crianças, elas são instrumentos inconscientes da grande farsa chamada Deus e seus nefastos colaboradores”. Ela recomenda cuidado com as crianças nascidas após 1981.

O advogado das famílias das vítimas, Clodomir Araújo, não tem dúvida de que o livro é um aliado na luta pela condenação da vidente e dos outros quatro envolvidos. Valentina, de 75 anos, pode ser condenada a cem anos se os jurados aceitarem a tese de homicídio triplamente qualificado levantada pela promotoria.

O advogado Jânio Siqueira tentou impedir a leitura do livro, alegando que a publicação não fazia parte do processo, mas o juiz Ronaldo Valle indeferiu o pedido. A advogada Marilda Cantal, defensora de Carlos Alberto dos Santos Lima, concordou com a leitura.

Estão sendo julgados o comerciante Amailton Madeira Gomes e o ex-soldado da Polícia Militar Carlos Alberto dos Santos Lima, que trabalhou como vigilante na casa de Gomes na época dos crimes. Os dois negaram em juízo qualquer participação. Chegaram a dizer que nem sequer conhecem os outros acusados. “Fui acusado porque minha família tem elevado poder econômico”, disse Gomes.

O juiz desmembrou as sessões. O julgamento de Gomes e Lima deve terminar hoje. No dia 2 serão julgados Valentina e os médicos Césio Flávio Caldas Brandão e Anísio Ferreira de Souza.

No Paraná

A seita Lineamento Universal Superior, criada pela brasileira Valentina de Andrade, foi investigada pela polícia paranaense em 1992, acusada de envolvimento no sumiço de crianças em Guaratuba, no litoral do Estado. Valentina e seu marido argentino José Teruggi eram suspeitos de participar de rituais satânicos, com sacrifício de crianças. Teruggi chegou a ter a prisão decretada pela Justiça, mas nada ficou provado. Valentina e Teruggi teriam também uma residência em Londrina, que chegou a ser investigada pela Polícia. Ele despertava suspeitas porque exibia sinais de riqueza sem entretanto apresentar uma ocupação que as justificasse. Mas o caso ganhou conotação de escândalo com o surgimento do caso Evandro.

No dia 6 de abril de 1992, em Guaratuba, no litoral do Paraná, Evandro Ramos Caetano, de 7 anos, desapareceu no trajeto entre sua casa e a escola. Dias depois, seu corpo foi encontrado num matagal, sem cabelos, mãos, dedos dos pés e órgãos internos. Segundo a denúncia, o garoto foi morto num ritual de magia negra, um dia depois do seqüestro, na serraria do então prefeito da cidade, Aldo Abagge.

Sete pessoas foram detidas, acusadas de participar do crime. Entre elas, a mulher do prefeito, Celina, e a filha Beatriz. Elas confessaram ter encomendado o ritual para trazer “fortuna e justiça” para a família. Depois, a defesa argumentou que a confissão foi obtida sob tortura policial.

Os acusados confessaram o seqüestro de outro menino, Leonardo Bossi, de 6 anos, desaparecido em fevereiro do mesmo ano. O garoto teria sido vendido para uma estrangeira. A polícia passou a investigar a seita Lineamento Universal Superior, liderada por Teruggi e Valentina. O envolvimento deles não se confirmou. Depois disso, tanto Valentina quanto Teruggi não foram mais vistos no Paraná apesar de os acusados em Guaratuba terem cumprido pena e submetidos a novos julgamentos.

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