Às vésperas da votação do novo zoneamento, um grupo de moradores da capital partiu para o ataque. Organizados em associações de bairro, eles lotam audiências públicas e colhem adesões em abaixo assinados para barrar o que consideram inadequado no projeto de lei. A lista é longa: vai da criação de corredores de comércio em bairros residenciais à liberação de torres sem limite de altura em ruas estreitas ou na várzea de rios, passando ainda pelo temor da instalação de uma nova estação de lixo.

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São ao menos 25 grupos atuantes, que se mobilizam diariamente contra a aprovação da atual proposta que revisa os tipos de uso e ocupação do solo de São Paulo. Em trâmite na Câmara, a proposta foi formulada pela gestão Fernando Haddad (PT), mas precisa do aval de 37 dos 55 vereadores para virar lei – a votação está marcada para amanhã.

Apesar de distintas, as associações têm pedidos semelhantes e dividem uma mesma certeza, a de que é preciso mais tempo para debater o texto. Segundo o presidente da AME Jardins, João Maradei, ampliar o prazo é necessário para que o governo detalhe melhor as propostas. “Não sabemos até agora o que será permitido nas zonas de comércio. Não basta apresentar as exceções”, afirma.

O temor dos moradores é que a não definição dessas atividades leve bares, restaurantes, supermercados e até boates para vias como a Avenida Europa e a Alameda Gabriel Monteiro da Silva, nos Jardins, zona sul. Ambas são lindeiras a ruas residenciais. O mesmo pleito é defendido por associações do Alto de Pinheiros, Morumbi, Brooklin Velho e Planalto Paulista.

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“O ideal seria a retirada dessas Zonas Corredor (ZCOR) criadas nos bairros residenciais. Mas, já que o governo não aceita fazer isso, pedimos ao menos que sejam limitadas as atividades permitidas para reduzir o impacto”, diz a psicóloga Nancy Cardia, do Alto da Boa Vista, na zona sul. Na Rua São Benedito, no bairro, o zoneamento proposto, ZCOR3, é o mais permissivo entre os corredores, podendo incentivar a construção de conjuntos residenciais, faculdades, edifícios-garagem e até confecções.

A publicação de uma relação que defina o que poderá ser explorado é defendida também pela Associação Comercial de São Paulo. “Isso facilitaria a convivência com os moradores. Nossa intenção não é degradar os bairros”, diz o vice-presidente, Antônio Carlos Pela.

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Outros problemas independem de detalhamento. Algumas associações pedem que se mantenha a lei atual. “Temos um documento assinado por 98% dos donos das casas do Parque Previdência (zona oeste), pedindo que não mexam em nosso bairro”, diz Luiz Guilherme Bender, da Associação dos Moradores e Amigos do Parque Previdência. “Não queremos ZCOR.”

Parque

Na região do Morumbi, duas associações reivindicam a oficialização do Parque Paraisópolis, para usufruto dos moradores da segunda maior favela de São Paulo e também do Jardim Vitória Régia. “Ele usaria uma área pública e outra privada. Poderia ser como o Parque do Povo para nossa região”, diz a arquiteta Isabel Affonso.

Na Vila Jaguara, zona oeste, a solicitação é das mais difíceis. Os moradores lutam contra a abertura de uma estação de transbordo de lixo já aprovada. “A gente sabe que com ela virão os ratos, as baratas e os urubus. Isso sem falar no tráfego constante de caminhões”, diz a advogada Catarina Campagne.

Com tantos pedidos ainda sem respostas, algumas associações cogitam apelar à Justiça caso o novo zoneamento seja aprovado como está.

O prefeito Fernando Haddad afirmou que 60% dos pleitos apresentados pela população foram acolhidos pelo relator do projeto na Câmara Municipal, vereador Paulo Frange (PTB). Os outros 40%, segundo o prefeito, não foram aceitos porque não tinham “embasamento técnico”. A Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano, no entanto, afirmou que o texto proposto ainda poderá ser readequado a novos estudos e sugestões antes de ser submetido a votação.

Frange destacou que a discussão sobre os tipos de uso que serão permitidos nas ZCORs será encerrada somente após a primeira votação. O vereador, no entanto, adiantou que a lei não deverá listar, em detalhes, todas as atividades comerciais que serão permitidas nas zonas de corredor comercial, como querem as associações de bairro. Por outro lado, o relator se comprometeu a ampliar as exceções. Poderão ser vetados, por exemplo, bares e boates em áreas lindeiras às Zonas Exclusivamente Residenciais (ZERs).

Sobre a participação popular, assim como Haddad, Frange considera ter atendido o maior número de solicitações, apesar de reconhecer que não é possível contemplar 100% dos pedidos. Ao todo, mais de 40 audiências públicas foram feitas para debater o projeto. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.