Quando estava no 8º ano do ensino fundamental, em 2017, André Moraes começou a pensar no dinheiro de um jeito diferente. Ele lembra que, em uma feira cultural na escola, sua professora fez uma apresentação para mostrar a semelhança entre um reservatório hídrico e a sua conta bancária: água e dinheiro são escassos, e chegam ao fim em caso de uso irresponsável. Ele diz que a metáfora o ajudou a mudar seu comportamento. Depois disso, tem evitado a crise hídrica e a financeira.

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“Foi uma experiência bem legal, ajudou até a construir parâmetros para o que eu posso gastar, como eu tenho de guardar o dinheiro, poupar, como funciona um banco, como funcionam os gastos”, conta André, que também teve aulas de uma disciplina extracurricular que trata do assunto, chamada Prevenção e Cidadania Como Consequência. Ele tem se planejado mais para fazer compras e a gestão dos gastos virou assunto mais frequente nas conversa com seu pai. “A aula me ajudou bastante a criar argumentos para conversar sobre isso, e fez com que o assunto fosse mais tratado nessas conversas.”

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Uma das novidades da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), a educação financeira será um dos temas transversais do novo ensino fundamental. Antes associado só às aulas de Matemática, o assunto agora será cada vez mais abordado em diferentes disciplinas e usado em projetos fora da sala de aula.

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Alguns colégios têm se adiantado à reforma curricular e incluído o conceito tanto em disciplinas obrigatórias quanto em projetos extracurriculares. No Colégio Pio XII, na zona oeste da capital paulista, André e mais 400 alunos do 6º ao 9º ano aprendem desde o planejamento de um orçamento familiar até dicas de empreendedorismo. A escola já oferecia o tema em aulas no 2º ano do médio, restritas à Matemática.

No ano passado, coordenadores do Fundamental 2 resolveram introduzir o tema, de maneira interdisciplinar, como sugere a BNCC. “A gente queria desenvolver essa habilidade de administrar a vida financeira do aluno dentro da inteligência emocional”, diz a professora Patrícia Prado, responsável por Prevenção e Cidadania.

No Colégio Stance Dual, a educação financeira virou tema das aulas de Geografia. O eixo temático é a globalização da economia, mas a partir disso os alunos estudam microeconomia, a entrada da mulher no mercado de trabalho e finanças da família. Em uma das aulas, os estudantes testam um ambiente de realidade virtual que simula compras em um supermercado, para avaliar hábitos de consumo. “Um trabalho como esse não deve acompanhar apenas uma única disciplina, mas transitar por várias e ter um aprofundamento com a maturidade (do estudante)”, diz o professor Thiago Pereira.

Rede pública

A implementação da educação financeira nas redes estaduais de ensino deve ocorrer até 2020, com os novos projetos pedagógicos com base na BNCC. Uma das instituições preocupadas com o processo é a Associação de Educação Financeira (AEF-Brasil), que defendeu a inclusão do tema de maneira transversal, e não em disciplinas específicas. Segundo a superintendente da entidade, Cláudia Forte, as secretarias devem inspirar-se nos casos de sucesso. “As temáticas transversais são as grandes molas propulsoras dessa transformação no jeito de ensinar, de aproximar a realidade do aluno.”

Interdisciplinaridade

Escolas já têm experimentado como incluir a educação financeira em aulas que vão além da Matemática. Para educadores ouvidos pela reportagem, a interdisciplinaridade contribui para que os alunos reconheçam o conceito em seu dia a dia.

História – Na área de Humanas, aulas sobre o surgimento da moeda, a função do dinheiro na sociedade e hábitos de consumo em diferentes momentos da civilização, por exemplo, podem servir para introduzir o assunto.

Geografia – O tema pode ser apresentado com explicação de assuntos de atualidades, como a globalização de mercados, fluxo de mercadorias, balanças comerciais, e até novidades como a economia compartilhada.

Projetos – A BNCC também estimula a criação de projetos extraclasse que sirvam para desenvolver habilidades socioemocionais e reforçar a conexão entre o ensino e a realidade do aluno. Nesses projetos, que não são necessariamente vinculados a nenhuma disciplina, é possível desenvolver atividades como a simulação de compra e venda, feiras de troca e oficinas de empreendedorismo. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.