Debandada geral no Ministério da Justiça

Brasília

(AE) – Toda cúpula do Ministério da Justiça debandou ontem em solidariedade ao ex-ministro Miguel Reale Júnior, que pediu demissão por não concordar com a não aprovação de uma intervenção federal no Espírito Santo. Demitiram-se o diretor-geral da Polícia Federal, Itanor Carneiro, o Secretário de Direitos Humanos do Ministério da Justiça, Paulo Sérgio Pinheiro, além do secretário Nacional de Justiça, João Benedito de Azevedo Marques, secretário Nacional de Segurança Pública, Cláudio Tuti, o chefe de gabinete do Ministério da Justiça, José Osvaldo Vieira, e o diretor do Denatran, Benedito Chiaradia. Em Curitiba, o jurista René Ariel Dotti renunciou à presidência da Comissão Especial para análise dos Juizados Especiais.

Uma das razões que tornaram irreversível a renúncia do então ministro da Justiça, Miguel Reale Júnior, foi o fato dele ter discutido, por duas vezes, com o presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, a intervenção federal no Espírito Santo. Segundo Reale Júnior, o presidente concordou com a medida, assim como o procurador-geral da República, Geraldo Brindeiro. Mas o governo recuou e Brindeiro arquivou o pedido de intervenção que, havia sido aprovado pelo Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (CDDPH) do Ministério da Justiça

“O crime organizado deve estar soltando fogos de artifício”, lamentou Reale Júnior. Ele contou que, anteontem à noite em um telefonema, o presidente tentou atribuir a Brindeiro responsabilidade exclusiva pelo arquivamento do processo. Fernando Henrique disse que Brindeiro garantiu a ele que o Supremo Tribunal Federal (STF) não acolheria a intervenção por falta de condições jurídicas. Reale não aceitou a desculpa e respondeu que a questão tinha passado pela “alçada do presidente”, no momento em que Brindeiro o procurou. E, portanto, era uma decisão de governo, política e não meramente jurídica.

O ex-ministro estranhou que, em vez de se manifestar nos autos, Brindeiro tenha decidido arquivar o pedido em reunião com Fernando Henrique. “Foi uma análise de cunho político, sem meu conhecimento, sem um telefonema sequer.” Reale não quis especular os motivos desse recuo. A única explicação que lhe deram foi o de que o momento político não era adequado. Reale também contou que, no mesmo dia em que a seleção pentacampeã de futebol esteve em Brasília, houve um almoço de três horas com conselheiros do CDDPH, da qual Brindeiro participou, em que se referendou a intervenção. Dois dias depois, a proposta foi aprovada por unanimidade, inclusive com o voto de Brindeiro. “Ele estava sentado ao meu lado e aplaudiu a decisão.” Reale não quis comentar a fama do procurador de “engavetador” de ações. “Mas que neste caso ele engavetou, engavetou”. Sua situação ficou insustentável: “Eu seria um ministro meia-boca, sem gás, sem vontade”, disse.

Governo criticado por não intervir

Brasília

(AE) – O candidato a governador do Espírito Santo Paulo Hartung (PSB), líder nas pesquisas de intenção de voto, disse ontem que considera “um absurdo” a atitude do governo federal e da Procuradoria-Geral da República de voltar atrás na decisão de pedir ao STF que decretasse intervenção no Estado. “Se o governo não tinha coragem de intervir numa situação crítica como esta do Espírito Santo, não poderia ter dado o primeiro passo”, afirmou Hartung. Segundo ele, “o recuo fica como uma autorização para o crime organizado atuar no nosso Estado. É um contra-senso”.

Também a candidata a vice na chapa tucana de José Serra e deputada federal pelo Espírito Santo, Rita Camata, disse que o presidente Fernando Henrique se precipitou ao se posicionar contrário à intervenção federal no Estado, antes da análise do pedido pelo STF. A candidata é favorável à intervenção.

O Centro de Justiça Global, que integrou o grupo de trabalho do Ministério da Justiça que discutiu a intervenção no Espírito Santo, divulgou ontem um manifesto de apoio ao ministro demissionário Miguel Reale Júnior. O Centro divulga esta semana um novo relatório sobre violação de direitos humanos no Espírito Santo, com o relato de 14 casos de delegados de polícia, juizes, promotores públicos, jornalistas e defensores de direitos humanos ameaçados de morte pelo crime organizado no Estado. O relatório traz ainda uma dezena de casos de pessoas assassinadas nos últimos anos.

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