CPI confirma fraude em obras na gestão de Maluf

São Paulo  – A diligência especial que a Comissão Parlamentar de Inquérito do Banestado realizou ontem e anteontem, na Assembléia Legislativa de São Paulo, levou o presidente da comissão, senador Antero Paes de Barros (PSDB-MS) à seguinte constatação: “Temos provas testemunhais de que as obras da Avenida Água Espraiada (ocorrida na gestão do ex-prefeito Paulo Maluf, entre 1993 e 1996) foram mesmo superfaturadas. Não temos de esperar o fim dos trabalhos da CPI (previsto para abril) para chegar a essa conclusão.”

 As declarações do senador foram feitas após a acareação, ocorrida no final da manhã de ontem, entre a ex-mulher de Celso Pitta, Nicéa Camargo, e a funcionária do Banco Cidade, Sheila Abad. Durante o confronto, as duas sustentaram suas versões. Nicéa voltou a dizer que Sheila era a doleira de seu ex-marido e responsável pelo envio das remessas de dinheiro para uma conta conjunta deles no exterior. A funcionária do Banco Cidade negou a acusação de Nicéa, mas admitiu que manteve dois encontros com o ex-prefeito, na residência dele, para tratar de um financiamento para a Prefeitura.

Os parlamentares que participaram da acareação realizada entre Nicéa e Sheila estranharam o fato de uma funcionária de um banco ir à residência de um prefeito, na ocasião, Pitta, para tratar de um assunto público, como a contratação de financiamento para a Prefeitura. Por causa desse fato, a CPI solicitou à Câmara dos Vereadores informações se a Prefeitura pretendia mesmo, na época, contratar um financiamento. “Fico muito triste que uma senhora de cabelos brancos tenha coragem de mentir descaradamente”, disse Nicéa durante a acareação.

O senador Antero Paes de Barros lamentou o fato de as provas testemunhais não terem tanta força em casos como este no Brasil. Por conta disso, a CPI está com muita expectativa com relação à viagem que seus integrantes farão aos Estados Unidos atrás de provas concretas. Entre essas provas, estão os extratos bancários da conta conjunta que Nicéa Camargo e Celso Pitta tinham em Nova York. “Nicéa nos deu procuração para recuperar esses extratos bancários e temos certeza de que essa será uma prova muito importante para a comprovação final do superfaturamento”, reiterou o presidente da CPI.

Mais uma

As obras da Avenida Água Espraiada, na região sul da capital paulistana, também estão sendo investigadas pela CPI mista do Banestado por causa da suspeita de que os recursos do provável superfaturamento da obra – que o presidente da comissão afirma ter realmente ocorrido – saíram do Brasil através de operações realizadas pelas contas CC5, em agências bancárias de Foz do Iguaçu, e chegaram à Agência do Banestado de Nova Iorque.

A CPI investiga a evasão de mais de US$ 30 bilhões para paraísos fiscais por meio de contas CC5 e a evidência é de que a maior parte desses recursos, depois de deixar o Brasil, passou pela agência do Banco do Estado do Paraná (Banestado), em Nova York. “A obra foi superfaturada em mais de 64% e custou aos cofres públicos mais de R$ 800 milhões”, disse o senador Barros.

Segundo as apurações realizadas pela CPI, grande parte dos recursos que saíam do Brasil – através de uma exceção à Circular 2677 que permitia remessas através das contas CC5, por cinco agências bancárias situadas em Foz do Iguaçu, em valores acima de R$ 10 mil e sem identificação dos responsáveis -passava pelo Banestado em Nova York e seguiam para paraísos fiscais. A suspeita da CPI, da Polícia Federal e do Ministério Público é de que esses recursos são provenientes do narcotráfico do caixa dois de grandes empresas, de verbas de corrupção política e do contrabando, entre outros.

Além das investigações realizadas pela CPI mista do Banestado, o Ministério Público Estadual de São Paulo também apura o caso da suspeita de superfaturamento nas obras da Avenida Água Espraiada. Em julho deste ano, a 4.ª Vara da Fazenda Pública de São Paulo quebrou o sigilo bancário e fiscal de 21 laranjas, um doleiro e quatro instituições financeiras paraguaias. O prefeito Paulo Maluf, por intermédio de sua assessoria de imprensa, já se manifestou a respeito do assunto e negou que tenha qualquer ligação com os fatos investigados.

Relatório aponta causas da quebra

O Banco Central enviou à CPI do Banestado, por determinação judicial, vasta documentação a respeito das causas que levaram à quebra do banco. Essa documentação, a última encaminhada a comissão, é composta por mais de 80 mil páginas.Entre as causas apontadas está a má aplicação de recursos em treinamento, quando o Banestado já estava falido e com o compromisso de venda assinado.

O banco contratou, sem licitação, o Centro de Educação Avançada S/C Ltda., do Rio de Janeiro, para realizar curso de treinamento para 18 turmas do Seminário de Educação Avançada (7.404 funcionários), no período de março a novembro de 98, a um custo total de R$ 4.825.689,20, sendo pago à empresa R$ 2.070.000,00 a título de honorários profissionais e o restante como custeio da infra-estrutura necessária à realização do evento. O programa, segundo informa o presidente da CPI, deputado Neivo Beraldin (PDT), que já repassou as informações ao relator, deputado Mario Bradock (PMDB), foi autorizado pelo diretor-presidente Manoel Garcia Cid e pelo vice-presidente Aldo de Almeida Junior.

O parecer jurídico concluiu pela possibilidade de contratação com inexigibilidade de licitação, sob o argumento de que o Centro preenchia os requisitos legais, informando que a Copel e a Secretaria de Estado da Educação haviam realizado o curso, qualificando o projeto como inédito e grandioso, que promoveu a reciclagem dos professores da rede estadual de ensino através de 31 seminários de educação avançada, ministrados para 25 mil participantes na chamada Universidade do Professor, localizada em Faxinal do Céu-PR e que tal contratação também se deu sem licitação.

Justificou que se tratava de treinamento intensivo visando a mudança comportamental para capacitar pessoas para os novos tempos e as necessidades de mercado. Entre os instrutores, figuraram os nomes de Afonso de Sant?anna, Antônio Carlos Villaça, Arnaldo Cohen, Marina Colasanti e as estrelas Fernanda Montenegro e Nathália Timberg, além de outros.

Subcomissão começa a agir em São Paulo

 Brasília

– A terceira das oito subcomissões auxiliares da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito do Banestado inicia segunda-feira (dia 20) suas investigações no município de São José do Rio Preto (SP), onde os senadores Demóstenes Torres (PFL-GO) e Serys Slhessarenko (PT-MT) e o deputado José Rocha (PFL-BA) vão ouvir o preso Humberto Sestini, que denunciou o ex-governador e hoje deputado federal Luiz Antônio Fleury (PTB-SP) por remessa ilegal de divisas para o exterior, via Banestado. A subcomissão terá prazo até quarta-feira (dia 22) para concluir esta e outras diligências.

Na segunda semana de atividades das subcomissões, a partir de quinta-feira (dia 23), a quarta subcomissão, formada pelo senador Leonel Pavan (PSDB-SC) e os deputados Dr. Hélio (PDT-SP), Sérgio Miranda (PCdoB-MG) e Paulo Kobayashi (PSDB-SP), irá a Campinas (SP) para rastrear o roteiro de doleiros que movimentaram a chamada “conta tucano”, que envolve a participação de toda uma família do município. O trabalho dessa subcomissão irá até sábado (dia 25). Além dessas, três subcomissões deverão se deslocar para três capitais, concluindo o calendário de investigações externas: Rio de Janeiro (de 26 a 28 deste mês), Curitiba (entre 30 de outubro e 1.º de novembro) e Belo Horizonte (entre 3 e 5 de novembro).

A oitava subcomissão externa, que irá a Montevidéu, ainda não marcou data para a viagem, porque depende ainda de entendimentos dos Ministérios das Relações Exteriores e da Justiça com autoridades judiciárias uruguaias para poder ouvir o depoimento de José Arcanjo Ribeiro, o “Comendador”, que está preso há mais de quatro meses naquele país. Dono de nove empresas de “factory”, usadas na antecipação de pagamento de cheques a juros abaixo do mercado, “Comendador” foi preso em Montevidéu e lá responde a crimes perante a justiça uruguaia e está com processo de extradição para o Brasil solicitado pelas autoridades judiciárias brasileiras ainda sem decisão.

Em Mato Grosso, ele já está condenado a sete anos de prisão pela justiça local, acusado de vários crimes. O interesse da CPMI do Banestado sobre ele é que o “Comendador” também usava contas CC5, pela agência do Banestado em Foz do Iguaçu (PR), na fronteira com Ciudad del Leste, Paraguai, para enviar dinheiro para Montevidéu, de onde o dinheiro retornava na forma de empréstimo para uma de suas empresas, a “Aveyron”.

Perito afirma que fez denúncia “genérica”

Brasília – Em resposta a uma interpelação oficial da CPMI do Banestado, o perito criminal da Polícia Federal Renato Barbosa encaminhou ao presidente da comissão, senador Antero Paes de Barros, informação de que apenas citou “genericamente, portanto não dotado de definitividades”, a realização de operações bancárias internacionais que sugerem a existência de 441 nomes de supostos parlamentares, eleitos nos últimos quatro pleitos, e de 1.219 nomes de supostos servidores públicos federais, envolvidos em remessas ilegais de divisas, mas que não se sentia seguro de informar nada oficialmente, sem que sejam instaurados procedimentos mais cuidadosos para checar a veracidade dessas informações.

Renato Barbosa informou que faz parte da força-tarefa do Ministério Público Federal da qual participam os procuradores da República Luiz Francisco de Souza, Raquel Branquinho e Valquíria Quixadá, coordenados pelo procurador-geral da República, Cláudio Fonteles. O perito disse que, para informar com precisão os nomes, precisaria de pesquisas em bancos de dados de CPFs da Receita Federal para saber a quantidade de possíveis homônimos de cada nome investigado, analisar e comparar declarações de Imposto de Renda com o volume de recursos movimentados e obter dos assentamentos funcionais dos servidores identificados para saber o cargo, a renda, a lotação atual e eventuais punições sofridas pelos envolvidos.

Além disso, segundo o perito, haveria necessidade de formulação de pedidos de cooperação internacional para obtenção de dossiês, extratos e ordens de pagamento das contas identificadas no exterior, seja com o auxílio do MLAT (tratado de cooperação entre Brasil e Estados Unidos), da Promotoria de Nova York, do COAF, Interpol ou por carta rogatória. Por fim, o perito disse que seu trabalho está restrito à análise pericial das operações bancárias internacionais suspeitas, sendo da responsabilidade dos procuradores as informações que chegaram ao conhecimento da comissão.

O nome do perito chegou à CPMI do Banestado citado, em documento, pelo procurador Luiz Francisco de Souza, quando este foi interpelado na justiça para divulgar oficialmente os nomes dos cerca de 400 políticos brasileiros que estariam envolvidos no esquema de envio ilegal de divisas, por meio de contas CC5 para a agência novaiorquina do Banestado, segundo dissera em entrevista. A cúpula da comissão está insatisfeita com as respostas recebidas oficialmente, tanto do procurador, quanto do perito da Polícia Federal, e poderá, inclusive, convidá-los a depor perante a comissão (no caso do procurador, seria o segundo depoimento).

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