Batendo cabeça

Não que seja impossível. Nem improvável. Mas é cedo demais para qualquer movimento no sentido de conferir a Luiz Inácio Lula da Silva o status de candidato à reeleição. Não temos por ora nem a mostra – e este é o motivo principal de todas as críticas, inclusive do “fogo amigo” – do que será feito ao longo de quatro anos. “Oito, oito”, gritavam ex-companheiros metalúrgicos, enquanto um Lula entusiasmado percorria as dependências de uma montadora em aniversário de fundação.

O agrado surgiu aparentemente de forma natural entre os operários em dia de festa. Lula reclamava dos que vivem lhe cobrando ação. Em tom carregado, como é de seu costume, disse que tem gente apressada, que passou vinte anos ou mais (“desde que Cabral descobriu o Brasil”) no poder, não fez o que tinha que ser feito e agora quer que em sessenta dias “a gente tenha resolvido o problema”. Não será no tempo deles, disse, mas “será no nosso tempo”, pois o presidente da República “tem noção de que o programa dele é de quatro anos”, durante cujo período sua obsessão será o combate à fome e a geração de empregos.

Abstraindo-se o fato de que já não são mais quatro anos, mas três anos e menos de dez meses contados até o final, o discurso de Lula precisa de qualquer forma entrar no tom. Não pode recorrer à velha imagem de que é cedo para cobrar porque é ainda cedo para realizar. Há, por todos os lados, de norte a sul, sinais de impaciência entre os cidadãos que depositaram na estrela as esperanças por mudanças. E até aqui, a não ser na linguagem, pouco mudou. Nem mesmo o carro-chefe dos programas sociais – o Fome Zero – conseguiu entrar no ritmo desejado.

Talvez quem melhor tenha resumido o que se passa no governo, cujas forças parecem consumidas por um infindável debate interno, foi o presidente da Câmara dos Deputados, o petista João Paulo Cunha. “Estamos batendo cabeça”, declarou ele, ao observar que o governo não acertou ainda o comando no Congresso, assim como – acrescentamos nós – não conseguiu acertar o ritmo de outras áreas, incluindo a das reformas prometidas, cujo debate se perde e se anula nas inúmeras instâncias criadas com o objetivo aparente de facilitar as decisões.

Sem muitas respostas a dar, Lula ainda consegue ganhar tempo ao ironizar como nos velhos tempos de campanha. Quem sabe – conjeturou o presidente – esses críticos estejam esperando alguma trombada para provar que o Lula é nervoso, é precipitado, que não dá certo. Nada, segundo advertiu, haverá de deixá-lo nervoso, pois continua na fase do “Lula paz e amor”. Uma paz que aqui e acolá (veja-se, por exemplo, o Espírito Santo) já não existe, para desespero da magistratura nacional e do ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, ele próprio sob escolta especial.

Discursos à porta de fábricas Lula sabe fazer. E provou uma vez mais que é aquele o seu terreno preferido para defender o bolso do trabalhador – uma vez ameaçado pela corrosão inflacionária, agora também pela sanha tributária do governo. Mas discursos apenas não resolvem, principalmente quando eles partem de quem agora tem o poder – não apenas microfones – nas mãos.

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