Babá por Geddel

Em busca da maioria no Congresso Nacional que lhe dê apoio e sustentação, o governo Lula está repetindo – também aqui – o estilo de seu antecessor. E o faz basicamente com os mesmos interlocutores, à frente o PMDB. Isso está claro ao longo do namoro que vem praticando com a agremiação, e que envolve uma complicada arquitetura onde não apenas tudo é válido como também tudo é permitido. O último lance de bom significado foi o jantar promovido pelo presidente do Senado, o ex-presidente José Sarney, para anunciar o que já se sabia: a cúpula do partido cedeu e, civicamente repetindo que apoiará as reformas que o povo exige, anuncia que meteu um pé no estribo da embarcação do governo. Meterá em breve os dois, como fazia antes.

Não são tudo flores, porém, nas hostes peemedebistas. Como no PT, ali existem também os que resistem à mera adesão ou – como virou moda – à mudança provocada pelo tufão da onda lulista. No mesmo jantar que deveria selar a união incondicional, com tapinhas nas costas, sorrisos e promessas de muito trabalho pelo bem dos brasileiros, houve surpresas: ao conquistar o apoio formal do PMDB, Lula ganha de graça também um pequeno coro a engrossar as vozes radicais da casa.

A dar o alarme foi o deputado Geddel Vieira Lima que, pedindo a palavra, anunciou respeito ao presidente Lula e à sua biografia, para concluir: “Sou um combatente. Não adiro”. “E não venham me chamar de viúva de FHC” – emendou depois de explicar que tem em mira o PMDB do futuro, que não pretende abrir mão de um projeto político e eleitoral desde já, ou seja, uma eventual candidatura própria nas ainda distantes eleições de 2006. Conta a crônica brasiliense que, depois de a tudo ouvir, Lula arriscou uma barganha à base da ironia: “Quem sabe podemos trocar os nossos radicais? Eu troco um Babá por um Geddel”. Ao que Geddel reparou serem necessários pelo menos três radicais do PT para a barganha, perdão, a metalinguagem ficar mais elegante.

As ironias do linguajar palaciano demonstram o tom e o apreço com que são tratados os apoios e dissidências dos que detêm mandato para representar o povo brasileiro. Já não se defendem idéias, projetos ou propostas, mas trocam-se pessoas, como se tudo fosse apenas uma questão de número. Acontece isso no PT, está acontecendo no PMDB e perpassa também as falanges do PSDB – até ontem o partido que administrava o espetaculoso balcão de negócios do Planalto.

Dizem (ou querem que assim acreditemos) que tudo é feito em nome do nobre objetivo de fazer passar reformas e dar corpo ao projeto do governo Lula. Mas por detrás dessa reordenação de forças o que menos conta são as idéias defendidas no palanque. É pura luta pelo poder. Geddel resumiu isso ao exclamar: “Não sejamos hipócritas. Ou teremos candidato próprio, ou se levantem todos agora e digam que o partido não terá projeto em 2006, porque estamos todos juntos e nosso destino está irremediavelmente atrelado ao destino do PT, apoiando Vossa Excelência”.

A questão, pois, se resume no que ninguém tem coragem de dizer publicamente. Pelo menos por enquanto: já está sendo pavimentada a estrada por onde mais dia menos dia, inevitavelmente, passará a campanha pela reeleição do presidente Lula. Aliás, nem ele esconde isso, ao repetir amiúde a impressão de que quatro anos é muito pouco tempo para a materialização do paraíso prometido. Se a esperança superou o medo, que mal há em ousar um pouco mais?

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