Ajuste asfixiante

Nos seis primeiros meses do governo Lula, o superávit primário (receitas menos despesas, exceto gastos com juros) foi de R$ 40 bilhões. Esse foi o maior superávit já registrado no primeiro semestre, desde que o Banco Central passou a calculá-lo com a atual metodologia, em 1991. União, estados, municípios e empresas estatais fizeram uma economia que superou em R$ 5,5 bilhões a meta fixada no acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI). O orçamento do programa Fome Zero para este ano é de R$ 1,8 bilhão. Portanto, a economia feita permitiria ao governo gastar naquele programa prioritário três vezes os recursos previstos e, ainda assim, estaria cumprindo com as exigências do FMI.

Para Altamir Lopes, chefe do Departamento Econômico do Banco Central, essa economia era previsível, pois não dá para acertar sempre o alvo. Mas já no governo FHC vinham sendo perseguidos superávits primários, e o acumulado no primeiro trimestre do ano 2000, por exemplo, superou em R$ 7,5 bilhões a meta fixada pelo Fundo. Para o governo, é normal trabalhar com uma certa folga no primeiro semestre, para poder arcar com as despesas maiores do segundo, quando, por exemplo, tem-se de pagar o 13.º salário do funcionalismo.

O ajuste fiscal é necessário, de fato. Necessário, tenhamos ou não acordo com o FMI, pois é preciso que o Brasil economize para pagar os juros do dinheiro que deve e, se possível – o que ainda não aconteceu – ir reduzindo o principal da dívida. Não tem sentido pensar que um dia seremos um país absolutamente sem dívidas, pois tal fato não existe no mundo. Todos os países devem, mas o que importa é ser capaz de rolar as dívidas com tranqüilidade, para se manter cliente do mercado, merecedor de juros adequados. E de forma a sobrarem recursos para aplicação no próprio desenvolvimento. A política de ajuste, a exigir que tudo o que se economize se destine ao pagamento de juros, é asfixiante. E mais sufocante ainda quando se pratica uma política de economizar muito mais até do que exige o FMI, enquanto os nossos projetos de desenvolvimento são postergados. E os em execução, paralisados; a economia em marcha à ré e o desemprego crescente assustadoramente.

Altamir Lopes ensina que o crescimento da economia depende de quatro fatores: gastos do governo, investimentos das empresas, consumo das famílias e exportações. Os gastos do governo têm sido quase nulos. Os investimentos das empresas encolheram ou tem havido até desinvestimento, em razão dos juros altos e diminuição do consumo. O consumo das famílias reduziu-se pelo encolhimento do seu poder de compra e medo do desemprego. As exportações, que vinham mantendo um ritmo animador, começam a perder o fôlego, que pode ser retomado agora que o dólar parece voltar a subir, num efeito paradoxal com as expectativas dos demais agentes econômicos.

É de se notar (e é para preocupar), entretanto, que em junho e também em julho o superávit foi menor do que nos meses anteriores. Isso demonstra um aumento de despesas do governo. Se a esse aumento correspondesse uma retomada do desenvolvimento, tudo bem. Mas isso não vem acontecendo.

É preciso que as autoridades econômicas do governo usem, na formação do superávit, uma dosimetria adequada, fazendo uma sintonia fina para que não se frustrem o mercado nem a população, que precisa, com urgência, que alguma coisa sobre para que o Brasil volte a crescer.

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