A reforma das Súmulas pelo TST

1. Introdução

Até o mês de outubro de 2003 o C. Tribunal Superior do Trabalho havia editado 363 súmulas. A Subseção de Dissídios Individuais I alcançava 321 Orientações Jurisprudenciais, a SDI II 123 OJs e a SDC 38 OJs e 119 Precedentes Normativos.

A mais alta corte trabalhista iniciou um processo de revisão das súmulas, através do qual: cancelou, além da Súmula 310, mais 110 súmulas; reviu 38 e restaurou a de n.º 17.

Abaixo, em caráter sintético, apresentamos ponderações sobre algumas súmulas objeto dessa revolução silenciosa, consubstanciada em importante ferramenta de trabalho dos operadores do direito, porque, inclusive, tem a ver com o cabimento ou não de recurso de revista.

2. Substituição processual

Cancelada a Súmula 310 do C. TST, a princípio, o sindicato pode atuar como substituto processual na defesa de quaisquer direitos dos trabalhadores da categoria que represente, desde que estes direitos tenham projeção coletiva. Para o Ministro Ronaldo Lopes Leal são apenas “os direitos e interesses individuais categoriais, pois a regra constitucional é restritiva aos interesses e direitos individuais da categoria, o que, obviamente, não abrange os interesses meramente pessoais de cada integrante da categoria”(1). Assim, tem legitimidade o sindicato, para atuar como substituto processual, em defesa de direitos e interesses individuais homogêneos da categoria por ele representada.

Já há reflexos desse cancelamento na jurisprudência. Recentemente, decidiu, o próprio C. TST, que o sindicato da categoria profissional possui legitimidade para propor demanda trabalhista com o objetivo de cobrar o pagamento de horas extras decorrentes do sistema de turnos ininterruptos de revezamento.

No site do C. TST (www.tst.gov.br/noticias) consta que a decisão trouxe os seguintes fundamentos: “Removido o obstáculo da súmula que restringia a legitimação extraordinária do sindicato, pode ele substituir processualmente os trabalhadores na reivindicação de horas extras decorrentes de turnos ininterruptos de revezamento, como direitos individuais homogêneos e indisponíveis relacionados com a saúde (…)” (acesso em 18.11.03 às 11h30min).

3. Adicional de insalubridade

Restabelecida a Súmula n.º 17, para os empregados que trabalham em condições de periculosidade e que tenham pisos salariais fixados convencionalmente ou por meio de sentença normativa, o adicional respectivo terá por base de cálculo estes valores; permanecendo, pois, a polêmica para os demais, no que se refere à possibilidade de se calcular a parcela considerando-se o salário mínimo, ante a contrariedade ao art. 7.º, IV, da CF/88.

Isto porque continua em vigor a Súmula n.º 228 e, sobretudo, a Orientação Jurisprudencial n.º 2 da SDI I, que afirma, enfaticamente, que a base de cálculo, mesmo após a CF/88, deve ser o salário mínimo, em contraposição ao entendimento do próprio Excelso STF (RE 236.396-5-MG, Acórdão da 1.ª Turma, de 2.11.98. Rel. Min. Sepúlveda Pertence)(2), que não admite essa incidência por violação ao art. 7.º, IV, da CF/88.

4. Cargo de confiança bancário

Conferida nova redação à Súmula n.º 204, no sentido de que a configuração, ou não, do exercício de cargo de confiança, depende de prova das reais atribuições do empregado, restaram, conseqüentemente, canceladas as Súmulas 233, 234, 237 e 238.

Este é um ponto de suma importância. Não resta dúvida, agora, conforme registrou o Ministro Vantuil Abdala (www.tst.gov.br/noticias – 2810.03, às 15h) de que esta será uma matéria a ser decidida pelas instâncias inferiores, ou seja, a princípio, não cabendo mais recurso de revista a respeito.

5. Gerente geral de agência bancária

A nova redação da Súmula 287 diz que o gerente geral de agência bancária não tem controle de horário e, portanto, que se enquadra na regra insculpida no art. 62 da CLT, não tendo direito a hora extra.

6. Prova das horas extras

Com a reformulação da Súmula 338, o empregador está sujeito a apresentar os controles horários, se alega fato extintivo do direito, independentemente de determinação judicial. Se não o faz, presume-se que pretende ocultar a verdade, devendo, assim, arcar com o ônus de ver admitida a jornada descrita na inicial.

7. Horas extras do comissionista

O novo teor da Súmula 340 veio a esclarecer a forma de cálculo das horas extras do empregado comissionista puro e misto. O primeiro tem direito apenas ao adicional de horas extras, calculado sobre as comissões percebidas; e, o segundo, tem direito a horas extras cheias (hora normal + adicional), sobre a parte fixa do salário, e só ao adicional sobre as comissões.

8. Férias proporcionais do obreiro demissionário

Em face da Convenção 132 da OIT, foi revogada a Súmula 261, garantindo-se, agora, o direito a férias proporcionais também aos trabalhadores demissionários com menos de um ano de serviço.

9. Gestante: estabilidade e reintegração

A mudança imprimida à Súmula 244 deixa certo, agora, que deverá haver a reintegração, se reconhecida estabilidade à gestante dispensada injustamente durante o seu curso, repudiando-se o interesse apenas à indenização.

Não vemos solução mais justa do que a de determinar a reintegração da empregada (porque a estabilidade lhe assegura isto).

Um dos objetivos dessa estabilidade também é o de, assegurando o direito à permanência no emprego, não permitir que a mulher seja discriminada.

10. Adicional de periculosidade

A nova redação da Súmula 191 corrobora a garantia legal insculpida no art. 1.º da Lei n.º 7.369/85, no sentido de que a periculosidade pelo trabalho em setor de energia elétrica confere direito à remuneração do adicional de 30% sobre o salário que perceber o empregado, incluindo todas as verbas de natureza salarial. Já quem trabalha em ambiente perigoso decorrente de outras situações (inflamáveis, explosivos) continua tendo direito apenas à incidência do adicional de 30% sobre o salário base, sem agregamento de gratificações, prêmios e participações nos lucros da empresa, em face da aplicação restritiva do art. 193, § 1.º, da CLT.

11. Princípio da identidade física do juiz

Até manifestação em contrário, deve-se continuar entendendo que a Emenda Constitucional n.º 24, de 09.12.99, publicada no DOU de 10.12.99 – que extinguiu a representação classista no Brasil, e substituiu as Juntas de Conciliação e Julgamento por Varas Trabalhistas – não alterou o entendimento anterior, que era o de não se considerar aplicável o princípio da identidade física no primeiro grau da Justiça do Trabalho (Súmula 136).

Notas

(1) LTr 62-12/1621.

(2) LEAL, Ronaldo Lopes Leal. A substituição processual do artigo 8.º, da Constituição Federal – Aplicação ao processo do trabalho das normas de procedimento das Leis n.ºs 7.347/85 e 8.078/90 (código de defesa do consumidor. Revista do Tribunal Superior do Trabalho. v. 66. n.º 1. Brasília: Síntese, jan/mar/2000.p.15.

Luiz Eduardo Gunther

é juiz, e Cristina Maria Navarro Zornig é assessora, no TRT da 9.ª Região

Voltar ao topo