Não faz tempo, o presidente Lula espinafrou a usura que campeia no Brasil, perguntando a seus próprios botões os motivos que levam as pessoas dependentes de financiamento ou crédito a pagar tão altas taxas de juros. Depois de algum momento de perplexidade e de silêncio, a resposta (ou parte dela) a seu questionamento pode estar na proposta que a Febraban – Federação Brasileira de Bancos acaba de fazer: se o governo reduzir impostos, os bancos podem pensar em reduzir juros…

Não é bem assim, mas quase. Na verdade, o presidente da entidade que representa os bancos e banqueiros do País, Márcio Cypriano, está propondo um acordo com o governo e empresas para a redução do spread bancário que, segundo explicam os especialistas, é a diferença entre o custo de captação do dinheiro e os juros cobrados do consumidor – o custo do dinheiro. Nosso spread, como se sabe, está entre os maiores do mundo.

Segundo Cypriano, a idéia é reduzir o compulsório e a carga tributária sobre a intermediação financeira, com isso gerando possibilidades de um financiamento com taxas de juros menores. Em troca, as empresas beneficiadas com esse financiamento seriam obrigadas a investir recursos no aumento da produção e na criação de empregos, dando partida assim ao “espetáculo do crescimento” há muito esperado. Os autores da proposta pensaram em tudo: os bancos teriam uma meta de liberação de financiamentos com essa finalidade, enquanto a possível perda de arrecadação do Estado seria compensada com o aumento do volume de crédito.

Segundo se informa, a proposta da Febraban já vem sendo estudada e, por isso, não constituiria nenhuma novidade para o governo. Ambos não têm mais como sustentar o argumento que coloca o nosso spread (uma estranha conta em que entram altos percentuais de lucro, impostos diretos e indiretos, despesas administrativas e uma margem reservada a sempre imprevisível inadimplência) entre os maiores do mundo. Enquanto em países como o Japão o custo do dinheiro não chega a 2%, no Brasil quase atinge os 44%! Até mesmo em Angola (menos de 39%), tomar dinheiro emprestado custa menos que aqui. Nos Estados Unidos, essa taxa não passa de 3% e na vizinha Argentina, com todos os seus problemas, vai pouca coisa além dos 12%.

O grande mérito da proposta da Febraban é colocar o governo, que normalmente é craque na distribuição das culpas, no rol dos também culpados pela usura que campeia de norte a sul. É como se perguntasse se o governo está, de fato, interessado no crescimento da economia ou apenas preocupado com seu próprio caixa. Um caixa que, de resto, usa e abusa da rede bancária para atingir tal objetivo, agora mais do que nunca aprisionado na inexorável CPMF – Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira. Não é por outra que quase mais nada é feito sem a obrigatoriedade de abertura de uma conta bancária.

O resultado dessa negociação em curso passaria a compor o chamado saco de bondades do governo. Aparentemente, este abriria mão de alguns anéis, para ficar com os dedos todos. Aprenderia, no entanto, aquilo que há muito o setor empresarial tupiniquim vem ensinando: uma consistente fase de crescimento de nossa economia não prescindiria de uma honesta revisão da carga tributária imposta pelo governo – o sócio mais exigente e menos produtivo de qualquer iniciativa sob este sol dos trópicos. Sem esta, aquela não subsistirá.

Algumas iniciativas anunciadas podem, de fato, caminhar para esse rumo das facilidades aparentes. Fala-se em Brasília que o governo estaria estudando “imposto zero” para as microempresas. Além de não pagar impostos federais, os empreendedores com faturamento anual de até R$ 36 mil poderiam vir a ser beneficiados com redução significativa da contribuição para a Previdência Social e o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço. Seria um esforço no sentido de “formalizar” patrões e empregados que pululam na economia informal. O problema é que parte dessa anunciada renúncia estaria acontecendo numa área equivalente a vestir um santo com o cobertor de outro.

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