A nova tática do MST

Uma nova etapa está nascendo em todo o Brasil na luta pela terra. O grito acaba de ser dado pelo presidente da Comissão Pastoral da Terra – CPT, o bispo dom Tomás Beduíno. Não basta a terra, qualquer terra. Precisa ser terra boa, produtiva e, de preferência, próxima dos grandes centros de consumo, com serviços básicos já estruturados, incluindo estradas, escolas, hospitais e outras coisas do gênero. Algo como a bíblica terra da promissão, onde corre leite e mel. “Não podemos mais aceitar que os sem-terra de todas as regiões do País sejam deportados para as terras devolutas lá do fim do mundo, na Amazônia”, sentencia o prelado que, até prova em contrário, fala em nome da Santa Madre Igreja.

O ensinamento do bispo, como soe acontecer, é prontamente seguido pelas principais lideranças do Movimento dos Sem-Terra – MST. Integrantes da coordenação nacional do movimento, como João Paulo Rodrigues, não só concordam, como emendam para observar que um dos maiores equívocos da política agrária do governo de FHC foi achar que os assentamentos só podiam ser feitos em regiões de fronteira agrícola. Foi-se o tempo de imigrante (de qualquer procedência e raça) ser colocado como bucha de canhão, abridor de picadas ou pasto de nativos. Faz algumas semanas, lideranças nacionais do MST advertiam que as terras improdutivas já não lhes interessam.

Além das questões de ordem econômica (afinal, terra ruim dá muito mais trabalho na hora do preparo para o plantio e o resultado imediato nem sempre é garantido), existem as de ordem social e familiar. E políticas, portanto. Tirar o homem de seu habitat, de seus amigos, familiares e vizinhos (e candidatos), como naturalmente acontecia uma vez, não é politicamente correto. Padre Roque Zimmermann, que integra o governo do Paraná, concorda: “O tempo da imigração forçada acabou”. E reforça o argumento dizendo que grande parte das pessoas que vivem na periferia de nossas cidades é procedente da zona rural.

Mas o que está em jogo nessa luta com novos objetivos pode ser bem mais profundo do quanto aparece. O mesmo padre Roque observa que nossa política equivocada do passado, além do latifúndio rural, produziu o latifúndio urbano. Este, mais lucrativo que aquele, certamente. Jura que muitos municípios paranaenses que já foram caracterizados pela convivência com minifúndios, hoje pertencem a poucos proprietários. Há cidades -diz – com menos de dez escrituras de propriedade. Tanta concentração na mão de poucos é, de fato, motivo de muita preocupação.

O Brasil é um país construído por imigrantes. Portugueses, italianos, alemães, poloneses, árabes, espanhóis, africanos, japoneses… de quase todas as raças e povos do Planeta. Além da imigração externa, temos o fenômeno daquela interna. Gaúchos, por exemplo, subiram pelo Oeste, povoando Santa Catarina, o Paraná, foram bater no Mato Grosso, Rondônia e alhures. Com trabalho e muita luta, fizeram estradas, semearam cidades, fazendas e plantaram o progresso – esse que agora é perseguido também pelos sem-terra. Esses imigrantes traziam e trazem mãos e pés calejados do trabalho que a todos honra e dignifica, assim seja, amém – repetiam párocos, missionários e pastores. Fazendeiros e ruralistas, de forma geral, colocam as barbas de molho e se preparam para o pior, uma vez que, como dizem, o governo não tem pulso (ou vontade política) para a assegurar a manutenção da ordem, em parte pervertida por inspiração da cruz e da água benta. Seria de perguntar aos mesmos padres e pastores se a dignificação do homem hoje vem pela via da invasão da propriedade alheia e não mais do trabalho.

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